domingo, 31 de março de 2013

Can India become a great power?

Na sua última edição a revista The Economist dedica alguns artigos à Índia, um país do chamado grupo dos BRICS – Brasil, Rússia, Índia, China e South Africa  – interrogando-se sobre se o segundo país mais populoso do mundo se pode tornar numa grande potência.
O tema é muito oportuno, porque a Índia será brevemente a quarta potência militar mundial, aspira ao domínio da Ásia do Sul e é um mercado económico de elevado potencial. Tendo-se tornado independente em 1947, já sustentou guerras com os seus vizinhos - Paquistão e China – disputando com eles as fronteiras e alguns territórios fronteiriços, além de os considerar perigosas ameaças à sua integridade territorial. No entanto, enquanto ninguém duvida da ascensão da China ao estatuto de grande potência, havendo até quem fale de um G2, isto é, uma cúpula mundial polarizada pelos Estados Unidos e pela China, a Índia ainda não viu reconhecido esse estatuto, apesar da sua dimensão demográfica, potencial económico, mercado interno e crescente capacidade militar. De resto, a Índia nem sequer tem assento no Conselho de Segurança das Nações Unidas, embora todos os seus membros permanentes apoiem a sua entrada nesse restrito clube.
Segundo o The Economist a Índia tem falta de “cultura estratégica” e “precisa de desistir da sua ultrapassada filosofia de não-alinhamento” para se tornar uma grande potência. A revista recorda a sua herança da potência colonial, designadamente as instituições democráticas, o sentido do Estado de Direito, o respeito pelos direitos humanos e muitos outros valores ocidentais, que não são integralmente partilhados pelos seus vizinhos. Ao invocar esssa herança, o The Economist presta-se a fazer lobbying a favor de um alinhamento com o ocidente (e com a sua indústria de armamento), ao querer desviar a Índia do seu tradicional aliado e principal fornecedor de equipamento militar que é a Rússia.
Porém, o país tem uma enorme diversidade étnica e linguística, enormes assimetrias de desenvolvimento, elevados níveis de pobreza e é muito vulnerável em termos energéticos, pois possui apenas 0,8% das reservas de petróleo e gás conhecidas. Por isso, a gestão do primeiro-ministro Manmohan Singh tem sido baseada numa combinação acertada entre “canhões e manteiga”, isto é, entre desenvolvimento económico, combate à pobreza, abertura ao exterior, coesão nacional, orçamentos militares e diversificação de alianças.  Para quem se interessa pela Índia e pelos seus problemas, é muito recomendável esta edição do The Economist.


sábado, 30 de março de 2013

Como é lenta a justiça portuguesa!


A recente notícia de que ao fim de vinte e três anos foi conhecida a sentença e a absolvição do caso que envolvia o cidadão José Manuel Beleza, vem mostrar a lentidão da justiça portuguesa e recordar que essa lentidão constitui uma ofensa  à dignidade dos cidadãos e um oneroso entrave para a economia nacional.
Por isso, tem relevância a apresentação agora feita pela Comissão Europeia, que o Jornal de Notícias divulgou, de um Painel Europeu de Avaliação da Justiça que virá a fornecer dados objectivos e comparáveis sobre o funcionamento dos sistemas de justiça nos 27 Estados-Membros da União Europeia. Os primeiros indicadores referentes a 2010 já foram divulgados e mostram que Portugal está longe da média europeia em relação ao tempo que demora um processo civil a ser julgado, pois um caso de justiça não criminal demora 1096 dias até ser resolvido num tribunal de primeira instância, isto é, quase oito vezes mais do que os 147 dias da média europeia. É escandaloso! Como é possível esta improdutividade do nosso sistema judicial? E o que fazem os nossos tão prendados meritíssimos? Será que ninguém responde por isto? Assim, é natural que os cidadãos não confiem na justiça e dela tenham uma percepção negativa quanto à sua independência, o que é evidenciado nos rankings que colocam o nosso país no 18º lugar dentro da UE27 e no 67º lugar entre 114 países. Com esta lentidão da justiça, tudo é mais difícil em Portugal. A justiça tem que ser célere e tem que sentenciada em prazo razoável.

sexta-feira, 29 de março de 2013

O Luxemburgo e a dupla nacionalidade

Vivem no Grão-Ducado do Luxemburgo cerca de 115 mil portugueses, o que corresponde a mais de 20% da população luxemburguesa, pelo que a problemática da integração socio-cultural desta enorme minoria é um assunto relevante, sobretudo em relação às gerações mais jovens. Certamente por isso, o Luxemburguer Wort, que é o diário mais antigo e de maior audiência que se publica no Luxemburgo, destacou em primeira página a apresentação de um novo projecto de lei relativo à dupla nacionalidade que, por muitas razões, interessa à comunidade portuguesa. A nova lei para a obtenção da nacionalidade luxemburguesa é genericamente facilitadora, exigindo cinco anos de residência no país, a aprovação num teste de língua luxemburguesa, a frequência de um curso de educação cívica e o preenchimento das chamadas condições de honorabilidade, isto é, um registo criminal sem penas de prisão superiores a 6 meses. A lei luxemburguesa aparenta ter muita razoabilidade e contrasta com a lei portuguesa que, com base nos direitos históricos deixados nos antigos territórios ultramarinos, garante a obtenção da nacionalidade portuguesa a muitos cidadãos que não sabem onde é Portugal, nem falam português, nem passaram por testes de educação cívica ou de honorabilidade. É por isso que, de vez em quando, encontramos pessoas que apesar de terem passaporte português, não têm de facto a nossa nacionalidade. No Luxemburgo isso não acontece.

quinta-feira, 28 de março de 2013

O regresso e a denúncia de uma narrativa

Ontem foi o dia do regresso televisivo do ex-primeiro ministro Pinto de Sousa e a RTP chamou-lhe “O fim do silêncio”, pois tinham decorrido cerca de dois anos desde que se ausentara do panorama político nacional. Nesse período, houve inúmeros valentões que tudo disseram contra ele, incluindo o nosso corajoso primeiro magistrado da nação. Sem contraditório. Até que foi convidado pela RTP para ser entrevistado. Aceitou, mas logo se levantaram algumas vozes fundamentalistas a condenar a iniciativa da RTP. Também apareceram petições públicas, umas a recusar a sua presença em qualquer programa da RTP (134.023 signatários) e outras a favor da sua presença (7.492 signatários). Era o início de uma estéril polémica. Depois, sucederam-se declarações de diferentes tons, por vezes na fronteira do fanatismo. No dia da entrevista, juntaram-se nas instalações da RTP duas manifestações, uma contra a presença do ex-primeiro-ministro que contou com menos de duas dezenas de pessoas e, uma outra, a favor dessa presença, com um número de manifestantes ligeiramente maior. A primeira levou uma simbólica factura de 78 mil milhões de euros, enquanto a segunda levou ramos de flores.
E veio a entrevista que permitiu a denúncia de uma narrativa que, até agora, circulava sem contraditório. O ex-primeiro ministro, que tem sido o bode expiatório de tudo o que de mal nos está a acontecer, teve a oportunidade de se defender e de esclarecer muita coisa. E esclareceu quase tudo. Com factos e com números. Com muita habilidade. Segundo o Diário de Notícias a entrevista foi um ajuste de contas com Cavaco Silva. Não sei se esta entrevista contribuiu ou não para alterar os pontos de vista dos 1.721.300 espectadores que a ela assistiram, pois "a cada um, a sua verdade". Porém, seguramente que a entrevista incomodou muita gente. Era um desafio difícil, mas Sócrates ultrapassou-o.

Os outros que aguentem!

O governo tem imposto um duro programa de austeridade aos portugueses, de que tem resultado uma sucessão de desgraças, tais como a recessão económica, o aumento da dívida pública e do défice orçamental, o empobrecimento, a deterioração do tecido empresarial, e, ainda, a incerteza e a falta de confiança quanto ao futuro. Mais do que aquilo que mostram as estatísticas, somos confrontados com a recessiva realidade que se depara aos nossos olhos. A austeridade tem implicado um brutal aumento do desemprego e uma substancial perda de rendimentos dos trabalhadores e dos pensionistas. Porém, a austeridade não é para todos. Perante o programa de privatizações inscrito no Memorando de Entendimento assinado com a troika e de outras anunciadas privatizações de iniciativa governamental como a RTP e os CTT, o governo decidiu contratar o economista António Borges como consultor para esta área. Porém, o professor e antigo vice-presidente do PSD decidiu “esconder-se” atrás da sua empresa de consultoria e “sacar” ao Estado a quantia de 300 mil euros anuais mais IVA, acrescidos do reembolso de despesas “indispensáveis para a concretização do trabalho e previamente autorizadas, designadamente no caso de viagens ao estrangeiro, as quais deverão ser documentadas e respeitar as normas aplicáveis ao sector público”. É sempre a mesma coisa: “rapar o tacho” todo e escapar ao fisco. São estes os amigos da nação. Eles. Os outros que aguentem! Como não lhe basta a exorbitância que o Estado lhe paga e a isenção de impostos de que beneficia por ser funcionário do FMI, no ano passado o economista Borges recebeu 50 mil euros pelo seu cargo de administrador não executivo do grupo Jerónimo Martins. Os outros que aguentem! Há gente cuja arrogância e ambição não tem limites. São muito pequeninos. Vulgares.

terça-feira, 26 de março de 2013

O confisco da poupança já nos ameaça

O caso de Chipre já fez correr muita tinta e deu origem a todo o tipo de comentários, embora os contornos da realidade sejam muito confusos. Houve ultimatos e muitas incertezas mas, ontem, o Chipre chegou a um acordo com os representantes dos credores internacionais, a nossa conhecida troika - UE, BCE e FMI.  O acordo evita, para já, o colapso cipriota com um resgate de dez mil milhões de euros e passa pela reestruturação da banca cipriota, mas também pela criação de uma taxa especial de 30% sobre os depósitos de valor superior a cem mil euros. Com esta medida, a troika encontrou um novo modelo para resgatar os bancos em dificuldades, ao impor as suas perdas não só aos seus accionistas, mas também aos seus depositantes. O senhor Jeroen Dijsselbloem, o líder do Eurogrupo, avançou de imediato com a ideia de que a “receita cipriota” poderia ser aplicada a outros países, como destacou o diário catalão La Vanguardia. Era uma opinião ou uma ameaça, que logo levantou dúvidas sobre se as poupanças dos pequenos aforradores estão seguras nos bancos ou se é melhor colocá-las debaixo do colchão, porque as garantias legais dos depósitos e as garantias políticas repetidamente afirmadas parecem não valer nada. A confiança – base da actividade bancária – desapareceu para sempre ou ficou seriamente abalada. Estamos perante o confisco das poupanças e, com menos poupança, temos menos investimento, menos emprego, mais impostos e menos crescimento económico. Tal como sucedeu nos Estados Unidos em 1929, não só no Chipre mas também noutros países, podem acontecer corridas aos bancos, fuga de depósitos, subidas de juros, falências e perturbações sociais. O grande capital vai agora mover-se para outras paragens, os bancos vão perder liquidez para financiar a economia e tudo isto pode agravar a recessão por que passa a Europa. Há quem diga que é o princípio do fim do euro e da credibilidade da zona euro, mas também que é a confirmação da decadência da velha Europa e de todos os seus sonhos. 

segunda-feira, 25 de março de 2013

Maus exemplos da lusa (des)governação

Os ventos que circulam pela Europa são muito preocupantes, mas os que por aqui sopram neste canto mais ocidental começam a ser insuportáveis. Estamos a passar por uma situação política muito confusa e muito sombria, com uma gravíssima situação económica e social, com resultados muito negativos no programa de ajustamento e com claras divergências entre os partidos da coligação. Não se vê um rumo na gestão da coisa pública. O descrédito em quem nos governa generalizou-se. Os nossos dirigentes revelam-se incompetentes, insensíveis e insensatos. Insistem nos erros e na destruição do nosso país. Ferem a dignidade das pessoas. Humilham os cidadãos. Retiram a confiança e a esperança. Alimentam a pobreza e o sofrimento de muita gente. Empurram muitos jovens para a emigração e não têm soluções para combater o desemprego. Apenas têm o apoio de uma meia dúzia de deputados e já ninguém levanta a voz para defender o relvas e os seus colegas, que deixaram de vir à rua para não ouvirem o protesto. Como de costume e a lutar pela sua vida, o ministro portas aproveita para passear. Porém, neste quadro de desespero, em que seria necessário termos o bom exemplo dos nossos dirigentes, ainda há quem continue com práticas infelizes e irresponsáveis, como se verifica nos dois casos seguintes.
A última edição do semanário Expresso denuncia na sua primeira página que a jovem ministra cristas decidiu adiar dois concursos públicos e, depois, nomear sem concurso dois seus ex-colegas de faculdade, para dois altos cargos do seu ministério. Outro caso exemplar do desnorte e desonestidade de quem nos governa foi a nomeação de técnicos especialistas com 21 e 22 anos de idade, por despacho do arrogante secretário moedas, conforme é revelado no Diário da República, 2ª Série, de 20 de Março.
Com exemplos deste tipo não temos governo. Temos (des)governo.


domingo, 24 de março de 2013

Um museu e três exposições

O museu da Fundação Arpad Szénes–Vieira da Silva (FASVS) com o apoio dos seus mecenas, está a oferecer ao público lisboeta três exposições temporárias que são uma excelente oportunidade para, de uma só vez, revisitar uma parte da obra de três artistas de elevada cotação internacional – Vieira da Silva, Arpad Szénes e Graça Morais.
A exposição Vieira da Silva, Agora esteve recentemente no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro no âmbito do projecto cultural Ano de Portugal no Brasil, para homenagear a pintora portuguesa que, com o marido, viveu naquele país na década de 1940. Depois de ter sido visitada durante dois meses por 42.315 visitantes, a exposição é agora apresentada em Lisboa, mostrando obras de pintura e desenho que cobrem um vasto período da produção da pintora e que é complementada pela sua fotobiografia. Revisitar a obra de Vieira da Silva é um exercício muito estimulante e confirma a sua excepcional dimensão no panorama internacional da arte contemporânea.
Porém, o FASVS tem por vocação a divulgação e estudo das obras de Maria Helena Vieira da Silva e do seu marido de origem húngara Arpad Szénes, mas também de outros artistas seus contemporâneos. Nesse sentido, o museu apresenta também uma pequena exposição da obra de Arpad Szénes e a exposição Os Desastres da Guerra, que reúne pintura e desenho de Graça Morais em que denuncia a guerra e a sua violência. Esta exposição pode ser vista até 14 de Abril, enquanto a exposição Vieira da Silva, Agora pode ser vista até 16 de Junho.


Lisboa valorizada com a Ribeira das Naus

A zona ribeirinha do rio Tejo situada entre o Terreiro do Paço e o Cais do Sodré, constitui um dos mais simbólicos locais da cidade de Lisboa. Aí existiram, pelo menos desde o século XIV, as carreiras de construção de navios ou Ribeira das Naus, onde nasceram muitos dos navios da expansão marítima portuguesa e que serviu de modelo aos estaleiros que se construíram nas ribeiras de Goa, de Cochim, do Rio de Janeiro e do Recife. Depois da destruição provocada pelo terramoto de 1755 os estaleiros foram reconstruídos e a Ribeira das Naus passou a ser designada por Arsenal Real da Marinha que, até ao fim do século XIX, foi o mais importante pólo de construção naval português. Em 1910 os estaleiros passaram a ser designados por Arsenal da Marinha, mas em 1938 foram extintos quando foi inaugurado o novo Arsenal do Alfeite.
O acesso da carreira de construção ao rio Tejo foi então cortado e foi construída a Avenida Ribeira das Naus. Porém, o recente e justificado interesse pela frente ribeirinha da cidade levou à decisão de requalificar a Avenida Ribeira das Naus e o seu espaço adjacente. A primeira fase desse projecto ficou agora concluída por iniciativa da CML: um largo passeio pedonal, um novo jardim público e uma larga escadaria em suave plano descendente até ao rio, como recriação de uma praia existente antes do terramoto. A cidade de Lisboa “que deve tudo ao rio”, foi enriquecida com a recuperação da sua memória histórica e ganhou mais um espaço de lazer. Bem precisamos destas coisas positivas para nos animarmos!

sábado, 23 de março de 2013

Precisam-se soluções para vencer a crise

A crise que atravessamos é grave e, sobre as suas origens e características, está quase tudo dito. A sua resolução não está a ser bem sucedida e a tentativa de reduzir o défice orçamental e de travar o crescimento da dívida pública, apenas tem conduzido ao brutal aumento do desemprego, à recessão económica, a um forte desânimo popular e à descrença no futuro. Apesar de haver cada vez mais comentadores, há cada vez menos comentários para fazer e o que tem faltado são as soluções. Não se vê rumo na governação e, quanto à terapêutica para vencer a crise, é cada vez mais do mesmo. As nossas dificuldades estão a tornar-se inultrapassáveis. A nossa economia está doente. A procura caiu. Há muitas empresas a encerrar. Os nossos jovens desesperam e emigram, Temos poucos recursos naturais. Temos uma estrutura produtiva deficiente. Produzimos pouco. Gastamos para além do razoável. Poupamos e investimos muito pouco. É um problema muito antigo.
Com o actual nível de juros não é possível pagar a dívida e vencer a crise. Basta um elementar exercício de matemática para tirar essa conclusão. É preciso encontrar um novo rumo e novas soluções. É preciso mais imaginação. É preciso mais investimento, mais emprego e mais crescimento económico. Há dias, Silva Peneda afirmou que a experiência neoliberal fracassou. Antes, Miguel Cadilhe tinha defendido uma renegociação honrada da dívida pública portuguesa, com redução da taxa de juro e do prazo de pagamento do empréstimo da troika. Porém, os nossos jovens e incompetentes governantes continuam cegos e surdos, não ouvindo sequer os seus companheiros de partido mais velhos e mais experientes.
Um graffiti que aparece nas ruas de Lisboa é sugestivo e faz todo o sentido:
No dia em que o povo acordar, o governo não conseguirá dormir

quinta-feira, 21 de março de 2013

Há uma ameaça a pairar sobre Chipre

Os graves problemas financeiros do Chipre continuam sem solução e a preocupar a Europa. As necessidades imediatas estão avaliadas em 17 mil milhões de euros e as instituições da troika prometem emprestar 10 mil milhões de euros, se o Chipre conseguir mobilizar recursos próprios da ordem dos 6 mil milhões de euros, de modo a evitar um crescimento exponencial da sua dívida pública. A primeira solução proposta e aceite pela troika foi a aplicação de uma taxa extraordinária sobre os depósitos bancários, o que levou os cipriotas ao desespero e à revolta. Essa intenção constituía também um perigoso precedente para os outros países da Zona Euro e foi reprovada por unanimidade no Parlamento cipriota. Então, o BCE fez um ultimato ao governo cipriota no sentido de encontrar uma outra solução a curtíssimo prazo, que poderá passar pela criação de impostos sobre pensões e imobiliário, pela venda de património e privatizações, por um fundo de solidariedade ou, até, pela emissão de direitos antecipados sobre as importantes reservas de gás natural descobertas nas águas territoriais cipriotas.
Uma sondagem agora divulgada, revela que 91% dos cipriotas apoia a rejeição da taxa extraordinária sobre os depósitos feita pelo Parlamento e 67.3% defendem a saída do euro e o reforço das relações com a Rússia. Dão que pensar estes resultados. No Chipre não há apenas o sufoco financeiro e a quase falência dos dois maiores bancos, mas há a ameaça da saída do euro, o interesse russo pelo gás natural e um panorama geopolítico em mudança, onde a República Turca do Norte de Chipre se quer fazer ouvir. O modelo cipriota ruiu. A feliz ilustração da primeira página do diário alemão Frankfurter Rundschau vale mais do que mil palavras.

Grandes Naufrágios Portugueses

Na história das navegações marítimas não são as rotineiras viagens que ficam registadas nas suas páginas e que despertam a curiosidade de muitas gerações mas, pelo contrário, o que fica registado na memória das pessoas ou no imaginário colectivo das comunidades é o dramatismo dos acidentes marítimos, das peripécias das batalhas navais e dos grandes naufrágios, onde se perdem pessoas e bens.
Por isso, o Comandante Rodrigues Pereira decidiu reunir algumas das mais dolorosas perdas acontecidas à navegação portuguesa ao longo dos séculos, com especial destaque para os relatos da História-Trágico Marítima, mas onde inclui também os desastres marítimos ocorridos mais recentemente, como é o caso do navio-motor Save, da traineira Praia da Atalaia e do pesqueiro Bolama. É um trabalho que faltava e que preenche uma lacuna na historiografia marítima, mas que também abre perspectivas para outras apreciações deste tema.
Na análise que é feita, verifica-se que a generalidade dos naufrágios resultou de falhas humanas, quer no planeamento quer na condução das viagens, mas também de condições meteorológicas severas ou de batalhas navais. Grandes Naufrágios Portugueses (1194-1991) é um livro muito interessante e de boa leitura, com um bem elaborado glossário para ajudar os leitores menos habituados à terminologia náutica. Ao ler as seis dezenas de relatos e o capítulo dedicado aos “cemitérios de navios”, somos levados directamente ao Mar Português, um dos mais citados poemas da Mensagem de Fernando Pessoa:

         Ó mar salgado, quanto do teu sal são lágrimas de Portugal!

terça-feira, 19 de março de 2013

As Festas do Concelho de Constância

A Festa de Nossa Senhora da Boa Viagem/Festas do Concelho de Constância vão realizar-se nos próximos dias 30 e 31 de Março e 1 de Abril. A origem destas Festas encontra-se na devoção a Nossa Senhora da Boa Viagem, a padroeira dos marítimos, estando associada ao tráfego fluvial de mercadorias que durante séculos foi muito intenso no curso do rio Tejo, a partir de Constância para jusante. Passado o tempo dos marítimos e do transporte fluvial, as Festas entraram em declínio, até que a Câmara Municipal decidiu intervir com o objetivo de as revitalizar e revalorizar, associando-lhe um vasto conjunto de actividades culturais, recreativas e de lazer que constituem as Festas do Concelho de Constância.  As Festas incluem música, artesanato, exposições, desporto, ruas floridas, tasquinhas, gastronomia, doçaria e muita animação, mas o seu ponto alto são as cerimónias religiosas que se realizam na tarde da segunda-feira da Páscoa (1 de Abril), em que se destaca a procissão que sai da Igreja Matriz e vai até junto do rio Tejo, onde já se encontram as embarcações que integraram a procissão fluvial para receberem a bênção, prosseguindo depois pelas ruas da vila. Esta procissão ou cortejo fluvial é, provavelmente, a mais simbólico evento do programa e recorda o tempo "em que os rios eram estradas e deles vinha o ganha pão de grande parte da população". Realiza-se na manhã do mesmo dia 1 de Abril, com algumas dezenas de embarcações engalanadas com bandeiras e com coloridas flores de papel. Sai de Tancos rio acima e passa junto ao castelo de Almourol e ao largo da Praia do Ribatejo, até Constância. Já tive o privilégio de assistir a esse cortejo e posso assegurar que é um grande espectáculo!

segunda-feira, 18 de março de 2013

Chipre e a crise de confiança europeia

A decisão de confiscar parte dos depósitos bancários no Chipre como forma de obrigar os cipriotas a custear uma parte do resgate internacional de que carecem, está a levantar sérios problemas, muitas interrogações e grandes preocupações. Os bancos cipriotas encerraram as suas agências até nova ordem. A reacção dos depositantes foi racional pelo que iniciaram de imediato uma corrida aos bancos, que as televisões mostraram ao mundo e que logo contagiou os países europeus que estão a passar por dificuldades semelhantes, cujas autoridades se apressaram a negar qualquer relação.
Os bancos eram até há pouco tempo o símbolo da estabilidade e da solidez financeira, mas aos olhos das pessoas tornaram-se a imagem da ganância e da especulação. A confiança na banca está muito debilitada e o que está para ser feito no Chipre, significa que a garantia dos depósitos bancários deixou de existir. E se os depósitos bancários no Chipre não estão garantidos, não há qualquer razão para que os cidadãos dos outros países da Zona Euro acreditem que os seus depósitos serão tratados de forma diferente. É a confiança perdida e a crise da confiança. E sem confiança a economia não funciona. E sem a economia a funcionar não há emprego. E sem emprego pode surgir a revolta social. É uma situação inquietante e, neste quadro de crise da confiança, o jornal i pergunta mesmo se “o colchão passou a ser o banco mais seguro”.


As reflexões de Jean-Claude Juncker

Nos tempos que correm é cada vez menor a confiança dos cidadãos na generalidade dos políticos europeus e é, também, cada vez mais evidente a falta de líderes que inspirem e mobilizem as populações. Os líderes europeus são reféns dos seus eleitorados e dos seus interesses e, muitos deles, não passam de funcionários impreparados mas bem pagos, rendidos aos seus nacionalismos e sem uma visão estratégica que assegure a esperança, o emprego, a prosperidade e a paz para essa complexa comunidade de nações que é a União Europeia.
Por vezes há algumas excepções e, nos últimos dias, destacou-se Jean-Claude Juncker, que é desde 1995 o Primeiro-ministro do Luxemburgo e que, durante oito anos, foi o Presidente do Eurogrupo. É seguramente um dos mais experientes políticos europeus. E o que disse ele? Numa entrevista ao semanário alemão Der Spiegel disse que os velhos demónios que no passado levaram países europeus a entrar em guerra “não desapareceram” e que “estão apenas adormecidos, como as guerras na Bósnia e no Kosovo mostraram”, confessando que o assusta ver as semelhanças entre as circunstâncias da Europa de há 100 anos e o contexto actual europeu. Dias depois, comentando as políticas de austeridade, a recessão e os seus efeitos sociais e económicos devastadores, sublinhou a necessidade de um maior equilíbrio entre austeridade e crescimento, dizendo acreditar que há um risco de “revolta social” na Europa. São palavras muito sensatas, num tempo de emergência social na Europa, onde mais de 26 milhões de pessoas estão desempregadas e outros 120 milhões vivem em situação de precariedade. As palavras de Jean-Claude Juncker merecem reflexão, até porque já há quem veja no horizonte alguns sinais de uma “primavera europeia”.

domingo, 17 de março de 2013

A crise e os tempos difíceis na Galiza

O diário galego La Voz de Galicia que se publica na Corunha, anunciou hoje em primeira página a notícia que “Galiza põe à venda as suas aldeias abandonadas” e acrescenta que, segundo o censo de 2011, existem na Comunidade Autónoma da Galiza um total de 1.408 núcleos populacionais abandonados, que vão desde as pequenas aldeias com igreja e escola, até aos mosteiros isolados e aos pequenos núcleos com casas destruídas e abandonadas. Esta realidade reflecte o histórico problema da emigração galega, mas também é um sinal da crise contemporânea, da desertificação rural, do envelhecimento da população, do isolamento e da ausência de actividade económica. Nesta altura haverá três dezenas de núcleos populacionais que esperam por comprador, havendo ingleses, noruegueses, árabes e americanos que têm mostrado interesse em fixar-se na Galiza.
Esta notícia recorda-nos Rosalia de Castro, a poetisa galega da segunda metade do século XIX que na sua poesia denunciou a pobreza que obrigava os galegos a emigrar, sobretudo para a América de língua castelhana e, em especial, o seu famoso Cantar da Emigração”, o poema que Adriano Correia de Oliveira cantou.

Este parte, aquele parte 
e todos, todos se vão.
Galiza, ficas sem homens
que possam cortar teu pão

Os versos de Rosalia de Castro e a notícia de La Voz de Galicia, têm cerca de 150 anos de intervalo e são uma consequência do fenómeno da emigração. Em Portugal, que tantas afinidades culturais e naturais tem com a Galiza, também temos os mesmos problemas da emigração e das aldeias abandonadas. São tempos difíceis de um mundo em mudança.

Os especuladores atacam em Chipre

No passado mês de Junho o Chipre pediu ajuda à União Europeia, depois de terem sido detectados graves problemas nos dois principais bancos cipriotas que foram afectados e contagiados pela crise grega. Depois de muitos meses de negociações, foi decidido conceder uma ajuda ao Chipre que, a partir de agora, passa a ser o quinto país da Zona Euro a beneficiar de um programa de ajuda internacional.
Inicialmente, o Chipre pedira um resgate de 17 mil milhões de euros, que é um montante equivalente ao seu PIB, mas nem o FMI nem o BCE concordaram com esse valor, alegadamente porque isso significaria um brutal aumento da dívida cipriota. A solução encontrada inclui duríssimas exigências que não têm precedentes. A troika avança apenas com 10 mil milhões de euros para “aliviar a carga dos contribuintes europeus”, sendo recolhidos 5,8 mil milhões de euros através de um singular imposto: os depósitos bancários com mais de 100.000 euros irão pagar um imposto extraordinário de 9.9 % e os depósitos abaixo deste valor pagarão 6,7 %.
Acontece que cerca de 30% dos depósitos bancários pertencem a cidadãos russos e resultam de lavagem de dinheiro. Esta medida irá custar aos russos quase 2 mil milhões de euros e a sua confiança na banca cipriota vai vacilar, o que vai afectar a economia e aprofundar a crise no país. 
Os cipriotas são assim os primeiros cidadãos europeus a quem é retirada uma parte das suas poupanças, que não será devolvida. É um imposto que incide sobre um milhão de cipriotas e é um verdadeiro assalto às suas poupanças. Os jornais espanhóis destacaram esta notícia e o La Vanguardia chama-lhe um confisco, mas os jornais portugueses ignoraram-na.
Os especuladores financeiros continuam a beneficiar da cumplicidade e da fraqueza dos dirigentes europeus que tudo fazem para destruir a ideia de uma Europa solidária, próspera e pacífica.

sábado, 16 de março de 2013

O futuro bem negro que nos anunciam

Ontem o nosso contabilista deu mais uma lição de insensibilidade social, de ignorância económica e de servilismo aos interesses dos especuladores (ou dos mercados) e o Diário de Notícias sumariou-a: “Gaspar anuncia futuro negro”. Então um ministro anuncia um futuro negro e não se demite? E ninguém o demite por ele nos andar a enganar há tanto tempo? Depois de cerca de 21 meses de governo e de todas as declarações e promessas feitas, antes e depois das eleições legislativas de 5 de Junho de 2011, os resultados são verdadeiramente catastróficos. Estamos perante a pior recessão de que há memória em Portugal, com uma quebra do produto nacional de 3,2%, uma brutal quebra no consumo e nas exportações, um desemprego que já atinge cerca de um milhão de pessoas e um ambiente social depressivo e sem esperança. Não é preciso ser economista nem ler estatísticas para ver a triste realidade que nos cerca. Os nossos jovens governantes revelam inexperiência, ignorância, atrevimento e insensibilidade social. Um dos que se destaca nessa intolerável atitude é exactamente o nosso contabilista, que tem falhado sempre e que já nem tem o apoio do seu próprio partido. É a nossa desgraça!
Entretanto, o homem que chamou piegas aos portugueses, movimenta-se emparedado entre o seu contabilista e um relvas sem escrúpulos, insistindo teimosamente nas mesmas receitas que nos levaram a esta delicada situação. Ele não sabe, nem quer aprender outras soluções. Submisso e vaidoso, deslumbra-se com os elogios que lhe fazem em Bruxelas e Frankfurt. Não arrepia caminho e continua a afirmar “nem mais tempo, nem mais dinheiro”. O Titanic afunda, mas ele e a sua banda continuam a tocar no salão, embora alguns músicos já estejam a preparar-se para embarcar nos botes de salvação. A situação é muito complexa e as dificuldades são enormes. A recessão é europeia e a crise também é europeia. Ninguém tem dúvidas disso. Anunciam-nos um futuro negro. E o que faz o homem do leme? Visita moagens e fábricas de cogumelos.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Habemus Papam!

Ontem à noite em Roma, de uma varanda da Basílica de São Pedro, o cardeal francês Jean-Louis Tauran anunciou ao mundo que o conclave tinha escolhido o novo Papa, o homem que vai dirigir uma comunidade de 1200 milhões de católicos em todo o mundo. O eleito tinha sido o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio, arcebispo de Buenos Aires de 76 anos de idade, que decidiu adoptar o nome de Francisco.
O novo Papa nasceu em Buenos Aires em 1936, filho de um ferroviário de origem italiana. Foi engenheiro químico antes de se tornar padre em 1969 e era arcebispo de Buenos Aires. É o primeiro latino-americano e o primeiro jesuíta a dirigir a Igreja Católica. Dirigindo-se à multidão que o aclamou disse que “os meus irmãos cardeais foram buscar-me quase até ao fim do mundo”.
Hoje sabe-se que o cardeal Bergoglio terá sido o principal adversário de Joseph Ratzinger na eleição de 2005, tendo chegado a reunir 40 votos dos cardeais eleitores. Dizem os registos que é um homem tímido, modesto, conservador e preocupado com os mais pobres. O seu estilo de vida é sóbrio e austero. Vive num pequeno apartamento em Buenos Aires e recusou viver no Palácio Apostólico. Viaja de metropolitano e de autocarro e, quando vai a Roma, voa em classe económica. Cozinha as suas próprias refeições, gosta de tango e de literatura, mas também é um apaixonado pelo futebol. É adepto e sócio do San Lorenzo de Almagro e gosta de ir ver os jogos da sua equipa. Com este exemplo de vida podemos dizer: Habemus Papam!
O diario argentino El Dia diz que é “um dia histórico” e salienta o “orgulho e a emoção” argentinas. O país de Jorge Luis Borges e Juan Manuel Fangio, de Maradona e Messi, de Che Guevara e Eva Peron, de Carlos Gardel e Piazzola, rejubila.

terça-feira, 12 de março de 2013

115 cardeais para escolher o novo Papa

Esta tarde na Capela Sistina do Vaticano, os 115 cardeais da Igreja Católica com menos de 80 anos de idade iniciaram o conclave para escolher o novo Papa que irá suceder a Bento XVI. Os cardeais eleitores, entre os quais há dois portugueses, são originários da Europa (60), América Latina (19), América do Norte (14), África (11), Ásia (10) e Oceânia (1), ficando fechados e isolados do mundo até que o novo Papa seja escolhido. As votações decorrem até que um nome obtenha uma maioria de dois terços dos 115 votos e, uma vez escolhido, o eleito declara se aceita a eleição como soberano pontífice e escolhe o nome que adopta. Então, o fumo branco anuncia que já há um novo Papa que, a partir da varanda da basílica de São Pedro, profere a bênção apostólica Urbi et Orbi. O Papa é o líder espiritual de 1200 milhões de católicos, é o Chefe do Estado do Vaticano e o Bispo de Roma. O Papa terá de mobilizar as energias da Igreja Católica em todos os continentes e proteger a diplomacia da Santa Sé, proceder à reforma da Cúria Romana e do governo da Igreja, tornando-a moderna, global e plural. Terá que ter respostas para as questões da ordenação das mulheres, do celibato dos padres, da sexualidade e da pedofilia, mas também para os problemas e suspeitas que pairam sobre o Banco do Vaticano.
O Papa é uma figura de influência mundial e, uma vez que, por razões que a História explica, a Santa Sé e o Vaticano existem, exige-se que estejam, através das suas redes diplomáticas e religiosas, ao serviço da paz, dos direitos humanos, dos pobres, dos oprimidos e do diálogo entre as nações. É isso que se espera do novo Papa.

segunda-feira, 11 de março de 2013

Resistência Galega

Numa altura de grandes dificuldades económicas e sociais, a Espanha defronta-se também com sérias intenções independentistas no País Basco e na Catalunha, mas também na Galiza, embora neste caso se trate de uma reivindicação quase simbólica, mas que não deixa de se mostrar activa. Assim, a imprensa galega noticiava hoje que a Resistência Galega realizou mais um atentado bombista e o diário Atlántico, que se publica em Vigo, destacava na sua primeira página o “nuevo atentado de Resistência Galega a un banco en O Rosal”.
A Resistência Galega agrega diferentes grupos organizados no quadro da luta pela independência da Galiza e, em 2005, publicou um “Manifesto pola resistência galega”, passando a levar a efeito acções bombistas contra entidades bancárias e partidos políticos espanhóis. A primeira dessas acções aconteceu no dia 23 de Julho de 2005 e foi dirigida contra uma agência bancária em Santiago de Compostela, na véspera do Dia Nacional da Galiza. Desde então, a Resistência Galega efectuou cerca de três dezenas de acções armadas, das quais só resultaram danos materiais. As forças de segurança espanholas consideram que os independentistas actuam a partir de três células activas, baseadas em Santiago de Compostela e Vigo, mas também de uma terceira célula localizada, eventualmente, no norte de Portugal.
Em Outubro de 2010, o Tribunal Supremo espanhol designou a "Resistência Galega" como um "grupo terrorista", comparando-o com outras organizações armadas que actuam em Espanha, como por exemplo a ETA. Não são fáceis os tempos nem os ventos que sopram em Espanha.

domingo, 10 de março de 2013

Que mais nos irá acontecer?

O nosso primeiro afirmou em campanha eleitoral que fez as contas e que estava em condições de garantir que não seria preciso cortar salários nem fazer despedimentos para consolidar as nossas finanças públicas. Era a voz da arrogância. Disse, então, que tudo foi vasculhado para haver contas bem feitas e que a sua gente procurou estimar, preferindo fazê-lo mais por excesso do que por defeito. Anunciou que iria mais longe do que a troika. Era a teoria do corte das gorduras que o amigo catroga todos os dias anunciava por megafone televisivo e que uma legião de relvas, moedas, borges e nogueiras aplaudia. Porém, os homens da bandeirinha na lapela não tinham estudado a lição, não conheciam o país, deslumbraram-se com o poder e nem perceberam que as coisas eram bem mais complexas do que pensavam. Depressa esqueceram programas e promessas e passaram a fazer o contrário do que anunciaram e prometeram. Os resultados são desastrosos. Afundaram a nossa economia. Levaram o desemprego para níveis insuportáveis. Aumentaram a dívida pública. Não reduziram o défice. Aumentaram impostos. Cortaram salários e pensões. Empobreceram o país. Estimularam a emigração. Roubaram-nos a confiança. Humilham-nos todos os dias.
Agora, cegos e surdos, insistem na mesma receita, querem ainda mais austeridade e preparam-se para cortar nas despesas sociais e nas funções de soberania. E querem mais cortes nas pensões de quem descontou toda a vida e confiou no sistema. São uns fundamentalistas obcecados e nem sequer obedecem aos seus colegas da troika porque, em boa verdade, eles são a troika. Estão a levar-nos para um desastre e a destruir a identidade e o orgulho nacionais. Que mais nos irá acontecer?

quinta-feira, 7 de março de 2013

Vodafone Red

Hoje, estranhamente, os principais jornais portugueses – generalistas, económicos e desportivos – apareceram nas bancas totalmente coloridos de vermelho. A dúvida assaltou-me. Seria uma forma de solidariedade para com a Venezuela e uma homenagem ao Presidente Hugo Chavez? Seria um apoio ao Benfica para o seu jogo desta noite com o Bordéus para a Liga Europa? Não podia ser nenhuma destas coisas. Só poderia ser uma qualquer mensagem publicitária induzida. Lembrei-me, então, que desde há dois dias, havia alguns outdoors a anunciar um novo pacote de serviços da Vodafone – o Vodafone Red.
O vermelho dos jornais cumpriu os dois primeiros passos do processo de comunicação publicitária - chamar a atenção e despertar o interesse. Depois, suscitou-me o desejo de conhecer o conteúdo da mensagem induzida no vermelho da capa dos jornais. Verifiquei, então, que a Vodafone decidiu responder à ofensiva recentemente lançada pela PT através da marca Meo, juntando  no mesmo pacote os serviços de internet, telemóvel, telefone fixo e televisão, com um tarifário atraente e competitivo, que pode levar à experimentação/aquisição do novo serviço. O vermelho serviu, portanto, os quatro pilares essenciais da comunicação publicitária: atenção, interesse, desejo e aquisição. 
Não sei se o Vodafone Red é melhor ou pior que a PT, mas ambas estão a lutar por um lugar no mercado das telecomunicações e a antecipar-se à anunciada fusão entre a Zon e a Optimus, que deverá estar concluída no Verão. A concorrência é assim e os consumidores é que ganham. É pena que este tipo de guerra não chegue à banca e aos combustíveis onde,  por vezes, a cartelização parece evidente.

Hugo Chávez, um amigo de Portugal

A morte de Hugo Chávez, o Presidente da República Bolivariana da Venezuela, era esperada mas nem por isso deixou de ser notícia na imprensa mundial.
Chavez foi eleito em 1998 e foi sucessivamente reeleito para a Presidência da República em todas as votações, a última das quais sucedeu em Outubro de 2012, tendo-se destacado internamente pelas suas políticas de inclusão social, de combate à pobreza e de cooperação no quadro latino-americano e, internacionalmente, pelo seu anti-americanismo e anti-capitalismo.
A Venezuela é um país em que vivem cerca de meio milhão de portugueses e em que se estima haver um milhão e meio de luso-descendentes (cerca de 5% da população), pelo que as relações bilaterais luso-venezuelanas são muito importantes. Hugo Chávez sempre expressou simpatia pela comunidade portuguesa e empenhou-se pessoalmente no desenvolvimento das relações económicas entre os dois países, tendo visitado Portugal por quatro vezes durante os seus doze anos de mandato. Daí resultou um enorme incremento das relações económicas entre os dois países e uma balança comercial muito favorável a Portugal. Hoje a Venezuela é o 19º mercado português e é o quinto mercado mais importante fora da União Europeia, tendo as exportações de bens e serviços aumentado 65,8% em 2012 e atingido mais de 500 milhões de euros.
Em Portugal todos os dirigentes políticos reconhecem Hugo Chávez como um grande amigo de Portugal e, numa altura em que no seio da própria Europa se está a perder a ideia de solidariedade, a evocação de um país e de um líder que mostrou essa mesma solidariedade para com os portugueses merece ser posta em evidência.  

quarta-feira, 6 de março de 2013

Uma exposição imperdível na Gulbenkian

Na Galeria de Exposições Temporárias do edifício-sede da Fundação Calouste Gulbenkian está patente a exposição 360º Ciência Descoberta, que aborda uma página pouco conhecida da história da ciência que se desenvolveu durante o período das grandes navegações marítimas dos séculos XV e XVI, na qual os povos ibéricos foram os grandes protagonistas e se tornaram de facto os verdadeiros precursores da moderna ciência europeia do século XVII.
A exposição está didacticamente organizada por núcleos temáticos, revelando o confronto com os saberes antigos e descrevendo as novas realidades observadas no encontro com um novo mundo. Apresenta-nos alguns dos mais simbólicos testemunhos materiais desse período dourado da ciência ibérica, como mapas e manuscritos raros, produtos exóticos e especiarias, instrumentos de navegação e livros, alguns dos quais são mostrados pela primeira vez em Portugal. Trata-se, portanto, de uma narrativa sobre as origens da ciência em Portugal e Espanha, que demonstra claramente o espírito inovador daquele tempo e a sua importância pioneira no contexto da ciência europeia que, muitas vezes, ainda é erradamente atribuída apenas a ingleses, franceses e italianos.
A exposição é acompanhada por um ciclo de conferências e é apoiada por um programa educativo muito inovador que está orientado para escolas e grupos organizados. A exposição é absolutamente imperdível e pode ser visitada até ao dia 2 de Junho.

terça-feira, 5 de março de 2013

A abrir portas ou a promover o portas?

O Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros foi de viagem à Índia para abrir portas e levou consigo uma alargada comitiva, onde se incluem 36 empresários mas também a televisão, para nos mostrar o sorridente ministro a inaugurar um ginásio e a informar-nos que a nossa economia precisa de músculo. A comitiva não viajou em classe económica, nem se instalou em hotéis de três estrelas, nem circulou localmente num riquexó barato. Evidentemente que não podia ser assim. São as exigências da dignidade do Estado. Por isso, estas coisas saem caras e se o ministro fizesse uma análise custo-benefício destas iniciativas a que chama “diplomacia económica”, mas que pouco mais são do que propaganda pessoal, ficaria muito surpreendido. Mas ele não resiste à sua paixão por viagens, nem à sua atracção por feiras e mercados. Depois das visitas à Ribeira e ao Bolhão, agora visita os mercados da Índia.
Porém, ele deveria conhecer um estudo realizado na Faculdade de Economia do Porto que o “Jornal de Notícias” divulgou em 24 de Agosto de 2009. O autor desse estudo analisou 12 visitas oficiais efectuadas entre 2005 e 2008, tendo concluído que os empresários portugueses que viajam em comitivas oficiais não as aproveitam para desenvolver negócios com empresários locais, preferindo desenvolver negócios com os outros empresários da comitiva. O estudo defendia que tanto os empresários como o Estado deviam repensar o modelo de funcionamento das visitas oficiais e salientava que não existia qualquer tipo de avaliação quanto à utilidade dessas visitas, que são financiadas por fundos públicos. Além disso, é evidente que os empresários não precisam que lhes abram as portas e, para inaugurar ginásios e promover encontros, já lá temos os nossos diplomatas.

segunda-feira, 4 de março de 2013

Clientes BPN: quem são e quanto devem?

A imprensa noticia hoje e o Diário de Notícias destaca essa notícia em primeira página, que o governo tem um plano de recuperação do crédito malparado no BPN, o qual atingirá 17 mil devedores e se estima ter um valor de 4,2 mil milhões de euros. Segundo foi divulgado, até ao próximo mês de Julho, o governo irá contratar uma empresa especializada na recuperação de créditos, enquanto já haverá actualmente 13 mil processos em contencioso. Aparentemente, trata-se de boas notícias para os contribuintes portugueses, pois têm sido eles que têm sido chamados a “tapar o buraco” do BPN. Porém, perante a irresponsabilidade e a impunidade com que, desde há muitos meses, tem sido tratado este caso, teremos que ser descrentes e desconfiados. Tem havido uma incompreensível condescendência para com os assaltantes do BPN, muitos dos quais se passeiam por aí e, depois da venda do banco ao BIC, muitas empresas e muitos particulares em dívida deixaram de cumprir as suas obrigações que tinham para com o BPN. A morosidade da Justiça também não nos dá garantias de uma intervenção rápida, justa e eficaz, que assegure o pagamento dos créditos ou o confisco de bens que, sabemos agora, resultaram de um processo de acumulação de riqueza assente em práticas e favorecimentos ilícitos. No passado mês de Janeiro, todos os grupos parlamentares se uniram para exigir que os poderes judiciais actuassem rapidamente para julgar e punir os responsáveis pelos milhões roubados no BPN.
No entanto, o tempo corre e continuamos sem saber quem são e quanto devem aqueles que se aproveitaram do BPN. E todos temos o direito a saber isso.

domingo, 3 de março de 2013

Vozes de protesto para serem ouvidas

As manifestações que ontem se realizaram, um pouco por todo o país, em protesto contra a troika, o governo e as políticas de austeridade, tiveram a sua expressão mais evidente em Lisboa e no Porto e nem é importante saber quantos foram aqueles que nelas participaram.
Em Lisboa desfilaram muitos, muitos milhares de descontentes, de indignados, de desempregados, de reformados, de jovens sem futuro e de gente como eu, que cantou a “Grândola vila morena” e gritou palavras de ordem como “O povo unido jamais será vencido”, a evocar os tempos da conquista da liberdade e da luta contra a tirania. Os manifestantes reclamavam a demissão do governo e reagiam contra as políticas de austeridade e de ataque ao Estado social, de destruição da economia, de empobrecimento generalizado e de insensibilidade social, que estão a ser prosseguidas pelo governo e que ameaçam a coesão social e o futuro.
Embora as manifestações sejam uma prova de força popular e uma forma de expressão democrática e legítima, pouco mais conseguem do que desgastar politicamente o governo e de, eventualmente, levar a algumas alterações na sua orientação política. Porém, enquanto expressões da vontade popular, as manifestações não podem deixar indiferente o homem que elegemos em Janeiro de 2011 para ocupar o Palácio de Belém e que até tem um orçamento de 15 248 380 euros para pensar e para actuar. Por isso, o título do Jornal de Notícias é significativo e é dirigido ao governo, mas também ao homem do leme: oiçam-nos!