sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Um discurso insólito que é para esquecer

A cerimónia da tomada de posse do XXI Governo Constitucional foi um acontecimento histórico, não só porque acabou com aquela estupidez que era o “arco da governabilidade”, mas também porque nos permitiu assistir a um dos mais insólitos discursos que um Presidente da República podia pronunciar naquelas circunstâncias. Nesse discurso falou muito em política económica, em disciplina orçamental e na confiança dos mercados financeiros e dos investidores externos, esquecendo-se que essa área governamental está entregue a gente que sabe e que veio das prestigiadas universidades de Harvard e de Nottingham.
Depois, com um ar desapropriado para aquela cerimónia, o Presidente ameaçou e disse: “Não abdicando de nenhum dos poderes que a Constituição atribui ao Presidente da República – e recordo que desses poderes só o de dissolução parlamentar se encontra cerceado – e com a legitimidade própria que advém de ter sido eleito por sufrágio universal e direto dos Portugueses, tudo farei para que o País não se afaste da atual trajetória de crescimento económico e criação de emprego e preserve a credibilidade externa”. Significa que seguiu a linha da propaganda do seu partido e se colou, uma vez mais ao anterior governo, ao dizer ser necessário “preservar a trajetória de crescimento e de criação de emprego”, quando essa trajectória realmente ainda não existe de forma sustentada e clara, pelo que não é intelectualmente sério mencioná-la naquelas circunstâncias.
O insólito discurso presidencial não teve uma palavra de incentivo ao governo para além da área económica, como se governar fosse a simples gestão da economia, sem que houvesse pessoas que vivem na pobreza e que carecem de emprego, de saúde, de justiça, de educação e da satisfação dos seus direitos básicos. O insólito discurso não teve uma palavra no sentido da mobilização dos portugueses para os desafios que têm pela frente ou para dar confiança à Europa e aos mercados, a que tanto se curva. O insólito discurso não teve uma palavra em defesa dos desempregados, nem dos reformados, nem do regresso dos milhares de concidadãos que sairam do país. Nem sobre a Ciência, o Ambiente, a Cultura ou a Educação. O insólito discurso é para esquecer.

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