segunda-feira, 31 de outubro de 2016

A quebra no turismo inquieta a França

A França foi o primeiro destino turístico mundial em 2015 com 84,5 milhões de visitantes mas, depois dos atentados de Novembro de 2015 em Paris e de Julho de 2016 em Nice, o movimento turístico entrou num processo de regressão sem precedentes, com uma quebra global de visitantes estimada em 7%. O diário Libération analisa hoje com muito detalhe o sector turístico francês, que é habitualmente considerado um valor muito seguro da economia francesa com os seus dois milhões de empregos e um volume de negócios anual da ordem dos 170 mil milhões de euros – praticamente igual ao PIB português. O jornal classifica a situação do sector turístico como inquietante e em “estado de urgência”, a necessitar de ser reinventado para resistir aos tempos difíceis que atravessa.
Geograficamente o choque tem sido mais severo nas regiões da Île-de-France e da Côte d’Azur, que são os dois pilares do turismo francês e que concentram metade da actividade do sector, sendo exactamente os locais onde o terrorismo actuou.
Qualquer estatística de turismo que se analise é inquietante. No primeiro semestre de 2016 o número de turistas japoneses diminuiu 46% na região de Paris (Île-de-France), mas também o número de visitantes chineses e russos endinheirados diminuiu na mesma proporção. O Museu do Louvre que é o museu mais visitado do mundo com cerca de 9 milhões de visitantes por ano, dos quais cerca de 75% são estrangeiros, perdeu 20% de visitas no 1º semestre de 2016. No inquérito promovido pelo Libération junto de hotéis, restaurantes, galerias de arte, boutiques, bares, grandes armazéns e casas da moda, entre outras actividades de referência parisiense, verifica-se que a quebra dos seus chiffres d’affaires se situa por vezes na ordem dos 50%.
Como consequência desta situação economicamente muito inquietante para os franceses, estão os portugueses a tirar partido do turismo como nunca se vira e, quem sabe se, como diz o povo, não estão a dar um passo maior que a perna.

sábado, 29 de outubro de 2016

Um abraço português para o povo de Cuba

No dia 26 de Outubro a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou uma Resolução que pede o fim do embargo económico a Cuba, com 191 votos a favor, nenhum voto contra e duas abstenções (Estados Unidos e Israel). Foi um grande acontecimento político para Cuba e para o mundo, pois foi a 25ª vez consecutiva que foi analisada uma Resolução com igual conteúdo, o que significa que a questão do fim do embargo a Cuba já era assunto velho e que a teimosia americana anti-castrista já não se justificava.
Curiosamente ou não, no mesmo dia chegava a Cuba o Presidente da República Portuguesa para uma visita oficial e, embora com destaques bem diferentes, esses dois acontecimentos são destacados pelo Granma, o “órgano oficial del Comité Central del Partido Comunista de Cuba”.
Granma é o nome do pequeno iate que em 1956 transportou Fidel de Castro e os seus companheiros desde o México até às praias do sopé da Sierra Maestra, de onde foi iniciada a caminhada revolucionária até Havana, que veio a ser ocupada no dia 2 de Janeiro de 1959 pelas forças de Che Guevara e de Camilo Cienfuegos. É, por isso, um nome cheio de simbolismo para a revolução cubana, que durante muitos anos desafiou a América Latina e, em certa medida, os próprios Estados Unidos. Porém, as mudanças acontecidas no mundo também influenciaram o regime cubano e, aos poucos, o país caminha para a Democracia.
Com esta visita a Cuba o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa voltou a mostrar a sua sensibilidade cultural e o sua compreensão do processo histórico cubano, em absoluto contraste com o seu antecessor. Esteve em Cuba sem receio de apanhar caspa ou contrair qualquer constipação, esteve com Fidel de Castro mais de uma hora, teve conversações com Raúl de Castro, proferiu uma conferência na Universidade de Havana, recebeu a comunidade lusófona na Embaixada de Portugal, inaugurou exposições e participou em fóruns empresariais. Levou Cultura e Economia na bagagem, mas também levou consigo a Política de apaziguamento, o não seguidismo em relação aos interesses americanos e, quem sabe, se não levou também algum sentimento emocional por se encontrar face a face com alguns dos símbolos das lutas que tanto entusiasmaram a sua geração por todo o mundo e que se traduziram na utopia guevarista. Mais uma chapelada a Marcelo Rebelo de Sousa!

Na linha da frente contra o Daesh

A revista mensal francesa L’Histoire dedica o seu último número aos curdos – mil anos sem Estado - e centra a sua análise num povo que tem uma identidade, uma língua, uma literatura e uma história, que ocupa um território muito extenso mas pouco definido, mas que não tem o seu próprio Estado. O Curdistão é a maior nação do mundo sem Estado e os cerca de 30 milhões de curdos distribuem-se pela Síria, Iraque, Irão e Turquia. Depois da 1ª Guerra Mundial e da derrota do Império Otomano os territórios do Médio Oriente dominados pelo sultão turco foram divididos, surgindo novos países como a Síria, o Líbano e a Palestina, mas os vencedores da guerra terão hesitado na criação de mais um país soberano e não criaram um Estado curdo.
Porém, a ambição de serem independentes nunca abandonou os curdos e ao longo de muitos anos têm desenvolvido grandes lutas para atingir esse objectivo, apesar da repressão de que têm sido vítimas, sobretudo pelo regime iraquiano de Sadam Hussein e, mais recentemente, pelo regime turco de Recep Tayyip Erdoğan. Nos tempos conturbados que afectam a região,  os curdos têm sido os principais adversários do Daesh no terreno, através da acção do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) e das Unidades de Defesa do Povo (YPG) constituídas pelos peshmerga – os combatentes curdos que enfrentam a morte. Os peshmerga constituem as forças armadas do Curdistão, existem desde a queda do Império Otomano, incluem mulheres nas suas fileiras e são a expressão militar dos sentimentos independentistas curdos. Têm estado na linha da frente na luta contra o Daesh, como se verificou na defesa da cidade fronteiriça de Kobani, defendida sobretudo pelas Unidades de Defesa das Mulheres (YPJ) e como se verifica hoje no assalto a Mossul. A revista L’Histoire reconhece a importância e o valor dos peshmerga ao referir que “la bataille de Mossoul a commencé lundi 17 octobre quand les forces kurdes ont attaqué la ville irakienne fief de l’état islamique.
Certamente que, quando a chamada guerra da Síria terminar, a comunidade internacional não deixará de reconhecer o povo curdo como soberano e o Curdistão como um Estado.

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Reformados europeus escolhem Portugal

La Voix du Nord, o diário de Lille que foi fundado em 1941 pela clandestina Resistência francesa e que na actualidade tem grande difusão nacional, destaca hoje uma reportagem com um sugestivo título em português:
Bem-vindo a Portugal”.
Segundo o jornal, Portugal é o novo destino favorito dos reformados franceses devido a factores diversos como a proximidade geográfica, a amenidade do clima, as facilidades fiscais, a segurança no espaço público, o atraente custo de vida, a cultura e a gastronomia, o preço do imobiliário e, até, a cordialidade e simpatia dos portugueses, bem como a sua facilidade de integração nas comunidades locais. Atraidos por estas condições e pela possibilidade de terem uma reforma tranquila ao sol, mas estimulados também pela promessa de um regime fiscal vantajoso, depois de 2013 mais de 25 mil franceses instalaram-se em Portugal.
Portugal tornou-se o destino privilegiado dos reformados franceses e um estudo recentementre revelado sobre os seus destinos preferidos, colocam Portugal à frente da Tailândia, Marrocos, Maurícias, Espanha, Bali, República Dominicana, Tunísia, Senegal e Brasil. Nesse estudo, Portugal e especialmente o Algarve, são classificados como a “Califórnia europeia”.
Porém, as facilidades fiscais para estes franceses “não residentes habituais” implicam uma permanência mínima de 183 dias no país, ou seja, que Portugal se torne a sua “residência principal”. Quando hoje, em muitas regiões do país, designadamente no Oeste ou nos Açores, se entra num restaurante ou num supermercado, é cada vez mais frequente encontrar reformados franceses, mas também de outros países europeus a consumir produtos e serviços portugueses e, por essa via, a ajudar o crescimento e o emprego no nosso país. Como diz hoje o jornal de Lille, que sejam bem-vindos!

domingo, 23 de outubro de 2016

O regresso da política da canhoneira

Nos tempos em que vivemos há grande interdependência entre os países, daí resultando a boa cooperação mas também algumas rivalidades e choques de interesses políticos, económicos e religiosos, que se traduzem em frequentes tensões no plano internacional. A política externa dos países está, portanto, com um nível alto de atenção e sucedem-se cimeiras e reuniões para resolver os inúmeros contenciosos que hoje atormentam o mundo.
A política externa de um país visa a defesa dos chamados interesses nacionais, sejam da paz ou da guerra, do comércio externo, da promoção cultural ou da defesa dos seus nacionais residindo fora do país. Os seus instrumentos de actuação passam pela diplomacia e incluem embaixadas, consulados e centros culturais, mas também outras formas de representação, onde até se incluem visitas de Estado, delegações desportivas, missões militares e visitas de navios, entre outras.
No século XIX muitos países adoptaram a política ou a diplomacia da canhoneira, em que se procuravam resultados políticos e submissões de povos através da exibição de poder militar e, sobretudo, pela apresentação das canhoneiras nas costas ou nos rios do território a dominar. A ocupação dos territórios africanos pelos europeus ao longo da segunda metade do século XIX, com as canhoneiras a disparar sobre as margens dos rios, tornou-se a imagem de marca da política ou diplomacia da canhoneira.
Passou mais de um século e a edição de hoje do The Scotsman veio relembrar a gunboat diplomacy, agora com os porta-aviões em vez de canhoneiras. Agora já não se dispara para as margens a impor respeito às populações, mas exibem-se os porta-aviões e os seus aviões para impressionar e mostrar o poder de cada um aos outros poderes. De facto, há notícias de porta-aviões americanos, russos e franceses no Mediterrâneo Oriental e no Golfo Pérsico, mas também de outros países, o que provavelmente não facilita a chegada da paz àquelas regiões.

O caos líbio está às portas da Europa

O mundo está a passar por situações que estão a gerar muita angústia e muita incerteza. O aumento da tensão internacional é uma realidade de que já ninguém tem dúvidas e o clima dos tempos da guerra fria começa a estar expresso nos jornais e nas declarações de alguns dirigentes mundiais. Há demasiados conflitos onde as grandes potências estão envolvidas e, na Europa ou na periferia da Europa, os próprios europeus parece terem deixado de ser uma voz activa. As batalhas de Allepo ou de Mossul fazem parte desse cenário de confrontação e dessa enorme incerteza. Todos os dias há acusações de crimes de guerra vindas de todos os lados.
Na Líbia a situação não é menos dramática e centenas de grupos armados vagueiam pelo país, enquanto na última semana a aviação americana executou mais de três dezenas de ataques contra a cidade de Sirte, dominada pelos jihadistas do Daech. O jornal católico francês La Croix veio alertar para essa crítica situação, que é pouco falada, talvez para não lembrar as graves culpas ocidentais neste drama aqui às portas da Europa.
Tudo isto acontece cinco anos depois da morte de Muammar Kadafi e da intervenção militar da NATO na Líbia que teve o aval das Nações Unidas e que, supostamente, pretendeu travar (por razões humanitárias) a ofensiva das tropas governamentais contra a revoltada cidade de Bengasi. Essa intervenção foi apenas uma das várias intervenções americanas ou aliadas para apoiar as Primaveras Árabes de que, quase sempre, resultaram resultados catastróficos.
Porém, as esperanças ocidentais associadas à queda de Kadafi, para construir uma sociedade livre e democrática na Líbia, não resultaram, sobretudo por ignorância dos falcões ocidentais que desconheciam a realidade sociológica do país. Tudo tem corrido exactamente ao contrário e a Líbia está afundada no caos. Não há um governo funcional e, em vez disso, há vários governos paralelos que lutam pelo comando do país. Centenas de grupos armados rivais deambulam pelo país e confrontam-se. As condições de vida dos líbios deterioraram-se depois da queda de Kadafi e os seus antigos arsenais abastecem agora os terroristas nigerianos do Boko Haram.
O caos na Líbia tem responsáveis e, entre eles, estão certamente Nicolas Sarkozy, David Cameron e Barack Obama.

terça-feira, 18 de outubro de 2016

Mossul: a batalha como nunca aconteceu

No passado domingo o Primeiro-ministro iraquiano Haider al-Abadi anunciou o início de importantes operações militares visando a recaptura da cidade de Mossul, a segunda maior cidade do Iraque, que tinha sido ocupada pelo Daesh no início de 2014. Foi exactamente em Mossul que Abu Bakr al-Baghdadi, o líder do Daesh, declarou em Junho de 2014 o estabelecimento de um califado.
Mossul tem, por isso, um valor simbólico e estratégico para o Daesh, pois transformou a cidade num santuário experimental do seu radicalismo, onde impõe a sua brutalidade e a sua tirania através de inúmeras e bárbaras execuções públicas de elementos da população ou até dos seus combatentes, uns acusados de colaboracionismo com os “infiéis” e outros de falta de combatividade ou de tentativa de deserção. Mossul tornou-se um centro de terror e, por isso, é um desafio para o Iraque e para os seus aliados. Daí esta grande ofensiva que também foi anunciada e é patrocinada por Barack Obama.
Segundo refere a imprensa internacional, designadamente o diário inglês The Independent, as forças iraquianas têm avançado pelo sul com o apoio aéreo americano e de forças especiais americanas, inglesas e francesas, enquanto as forças curdas, conhecidas por peshmerga, avançam por leste em direcção à cidade, que se supõe dispor de cerca de cinco mil combatentes jihadistas. Embora estejam anunciados progressos das forças que convergem para Mossul, teme-se que a cidade esteja minada, que estejam montadas muitas armadilhas e que a população possa ser utilizada como escudo humano, o que irá dificultar e demorar a recaptura da cidade. Por isso, há grandes preocupações humanitárias em relação ao milhão e meio de habitantes da cidade. O que parece não haver dúvidas é que a batalha por Mossul vai ser uma operação ou uma batalha como nunca aconteceu.

A estabilidade democrática açoriana

As eleições para escolher os 57 deputados que vão integrar a Assembleia Regional dos Açores realizaram no domingo e tudo decorreu com total normalidade democrática, embora tivesse havido uma abstenção de quase 60%, isto é, houve 134.971 eleitores inscritos que se abstiveram.
Embora a abstenção açoriana seja habitualmente superior a 50%, nestas eleições subiu consideravelmente. Há muitas explicações para esta abstenção: cadernos eleitorais desactualizados, falta de incentivo depois de quatro vitórias consecutivas do Partido Socialista e da sua boa governação e o elevado número de eleitores inscritos que não são residentes na região e que não se deslocaram dos Estados Unidos, do Canadá ou do Continente para votar. O facto é que numa região de grande estabilidade e maturidade políticas, o nível de participação se situa muito aquém do desejável.
O Partido Socialista renovou a sua maioria absoluta como destacou o Açoriano Oriental, o jornal que se publica em Ponta Delgada e que é mais antigo jornal português, ao conseguiu eleger 30 deputados, enquanto o PSD se ficou pelos 19, seguindo-se o CDS-PP com quatro, o BE com dois, o PCP com um deputado e o PPM também com um deputado. Em relação às anteriores eleições de 2012, o PS e o PSD perderam um deputado cada um, enquanto o CDS-PP e o BE ganharam um deputado cada. O PCP e o PPM mantêm um deputado cada.
Como sempre acontece, nenhum partido se declarou derrotado e cada qual veio afirmar-se mais fortalecido com os resultados alcançados e mais confiante no futuro. Neste tipo de eleições há sempre quem queira extrapolar os resultados para o plano nacional, mas isso não tem qualquer sentido, pois os resultados estão mais associados à notoriedade local dos candidatos do que aos programas partidários. Foi exactamente por isso que na ilha do Corvo, a mais pequena da região, foi reeleito um deputado do “inexistente” PPM com 82 dos 248 votos expressos, isto é, com 32,03% dos votos.

domingo, 16 de outubro de 2016

Cimeira coloca Goa no centro do mundo

O Estado de Goa recebeu este fim de semana a 8ª Cimeira dos BRICS (Brasil, Rússia, India, China e África do Sul), a que se juntaram como convidados os sete países membros do BIMSTEC (Bay of Bengal Initiative for Multi-Sectorial Technical and Economic Cooperation), isto é, Bangladesh, Butão, India, Myanmar, Nepal, Sri Lanka e Tailândia.
Significa que, durante dois dias, Goa recebeu doze Chefes de Estado ou Primeiros-Ministros mundiais e que, portanto, esteve no centro do mundo. O primeiro-Ministro indiano Narendra Modi escolheu Goa para receber Vladimir Putin e Xi Jinping, mas também Michel Temer e Jacob Zuma e, de entre as várias hipóteses  para instalar tão importante reunião internacional, decidiu-se pelo Hotel Taj Exotica, em Benaulim, no sul de Goa, um hotel de cinco estrelas cuja entrada é decorada com azulejos de inspiração portuguesa, produzidos localmente pela firma "Azulejos de Goa".
Numa altura de grande tensão internacional, provavelmente este encontro não tratou apenas de questões de cooperação económica, dos efeitos da globalização ou das alterações climáticas. De resto, os jornais goeses anunciaram que Modi e Putin decidiram lutar juntos contra o terrorismo e que a China e a Índia também trataram do mesmo tema.
O mais antigo jornal de Goa – oHeraldo – dedicou a sua edição de ontem a esta Cimeira que, de facto, colocou o antigo território português de Goa no centro do mundo, com a curiosidade deste encontro se ter realizado na região de Margão que é, provavelmente, a zona de Goa onde a herança cultural portuguesa permanece mais viva. Não deixa de ser curioso, também, que entre tantas regiões da Índia seja escolhido o Estado de Goa para receber esta Cimeira, a mostrar que 451 anos de presença na costa do Concão deixaram uma marca identitária de cosmopolitismo, de progresso e de harmonia social. Viva Goa!

sábado, 15 de outubro de 2016

António Guterres, maior do que Portugal

Na passada quinta-feira assistimos pela televisão, em directo de Nova Iorque, à designação de António Guterres como o novo Secretário-Geral das Nações Unidas, por unanimidade dos seus 193 membros e por aclamação. Para os portugueses foi uma transmissão histórica. É uma distinção rara ou mesmo única para um cidadão português que o próprio fez por merecer, mas que também resultou de um esforço colectivo nacional que envolveu o Presidente da República, o governo e a oposição, a diplomacia e, certamente, muitos outros intervenientes. Não é comum haver tanta unanimidade nacional em torno de uma causa e desde 1999, quando os portugueses aderiram à causa da independência de Timor-Leste (curiosamente quando António Guterres era primeiro-ministro de Portugal), que nada disto acontecia. Isso enche-nos de orgulho e resgata-nos de muitas humilhações que nos têm feito a Comissão Europeia de Barroso e de Juncker, bem como as senhoras Merkel e Lagarde, mais o Dijsselbloem e o Schauble, entre outros.
O processo de selecção foi longo, duro e transparente. António Guterres foi o melhor ao vencer todas as seis votações, revelando uma superior preparação para o cargo e tendo, entre outras credenciais a seu favor, o seu desempenho como alto-comissário das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR). Num período de grande tensão internacional, António Guterres teve o apoio unânime do Conselho de Segurança e conseguiu colocar do mesmo lado os Estados Unidos e a Rússia, mas também a China, o Reino Unido e a França.
O cargo que vai ocupar a partir de Janeiro é mais exigente do que qualquer outro que antes tenha desempenhado, com muitas guerras para resolver e com milhões de refugiados para apoiar, num contexto em que a própria ONU acumulou erros e omissões, mas também muitas críticas. Porém, as suas declarações no sentido da gratidão, da humildade e do sentido da responsabilidade são muito animadoras para o mundo.
A revista do semanário Expresso dedica hoje a sua capa ao novo Secretário-Geral da ONU e escolheu o título “maior do que Portugal”, dizendo que “é muito mais do que o rosto das duas grandes vitórias da diplomacia portuguesa nas últimas décadas”. Sem dúvida que os olhos do mundo estarão focados na acção deste nosso compatriota, a quem desejamos felicidades e bons resultados.

sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Bob Dylan e os novos tempos da cultura

A Academia Sueca anunciou ontem a atribuição do Prémio Nobel da Literatura de 2016 e, para surpresa de toda a gente, mesmo para os mais entendidos em questões literárias, decidiu distinguir Bob Dylan, um “não-escritor” que é o ícone da música popular americana, por ter sabido criar “novas formas de expressão poética”. Sou daqueles que, depois de José Saramago (1998) e de Mário Vargas Llosa (2010), nunca ouvira falar nem lera nenhum dos mais recentes escritores distinguidos com o Prémio Nobel da Literatura. Porém, Bob Dylan era meu conhecido há muitos anos.
Bob Dylan tem 75 anos de idade, nasceu no Minnesota e dedicou-se à música desde a adolescência como compositor e cantor, adquirindo notoriedade mundial, sobretudo através da sua militância pela paz, contra o racismo e contra a guerra do Vietname. Depois encontrou outras temas e foi reinventando a sua música, embora sempre dentro daquilo a que se tem chamado a folk music. Uma famosa revista americana elegeu-o como o sétimo maior cantor de todos os tempos e o segundo melhor artista de música de sempre, logo a seguir aos lendários The Beatles, a banda inglesa sua contemporânea que nasceu em Liverpool. Uma das canções de Bob Dylan intitulada Like a Rolling Stone que foi apresentada em 1965, foi mesmo escolhida por aquela revista como uma das melhores de todos os tempos.
Bob Dylan apresentou seis concertos em Portugal: em 1993 no Coliseu do Porto e no Pavilhão de Cascais, em 1999 no Pavilhão Atlântico e de novo no Coliseu do Porto, em 2004 em Vilar de Mouros e em 2008 no festival Nos Alive, em Algés. Há uma quase unanimidade em torno do mérito da obra poética de Bob Dylan e, por isso, a imprensa mundial destacou a atribuição do prémio como um sinal de mudança e de aceitação de novos tempos, inclusive na cultura. O jornal francês Libération foi apenas um dos muitos jornais de todo o mundo que hoje se renderam a Bob Dylan e à decisão da Academia Sueca.

terça-feira, 11 de outubro de 2016

Os novos sinais da diplomacia económica

Desde há muitos anos que assistimos à deslocação de comitivas ministeriais ou presidenciais, por vezes bem numerosas, aos mais diferentes lugares do mundo e com os mais diversos pretextos, embora quase sempre de índole económica, isto é, para atrair investimento ou para promover a exportação dos nossos produtos. Embora se trate de acções fundamentais da chamada diplomacia económica, até porque “quem não aparece esquece”, bem sabemos como a maioria das deslocações dessas comitivas de alto nível, cheias de assessores e jornalistas, são inconsequentes e não trazem qualquer benefício ao país. Muitas vezes, as extensas comitivas até são escandalosas exibições de novo-riquismo e de práticas turísticas. Seria bem interessante estudar os custos e os benefícios de cada uma dessas deslocações e, já agora, detectar quem tirou proveito pessoal delas...
A maior parte das vezes sabemos dessas deslocações apenas porque os jornalistas que nelas tomam parte as noticiam, sempre muito laudatoriamente, até porque nessas viagens é tudo em grande e nada lhes falta.
Uma das formas de perceber o interesse das deslocações dessas comitivas é através da imprensa local. Nunca, ou muito rarissimamente, a imprensa local noticia uma qualquer visita ministerial portuguesa. Fartei-me de pesquisar e pouco ou nada encontrei.
Estes comentários vêm a propósito da deslocação do Primeiro-ministro António Costa  à China, que a imprensa chinesa noticiou com grande destaque em vários jornais de língua chinesa e até inglesa, caso do China Daily. Não é costume. Para além de ilustrar a notícia com uma fotografia, o jornal destaca na sua primeira página uma declaração do Primeiro-ministro Li Keqiang: “Portugal pode ser uma ponte para outras nações”. Outro jornal destaca declarações do Presidente Xi Jimping a encorajar o investimento chinês em Portugal.
São declarações animadoras, mas não sabemos se têm substância. Veremos. Bom seria que aqui pudéssemos registar brevemente quaisquer notícias sobre verdadeiros investimentos chineses em Portugal que gerassem crescimento e emprego, até para ensinar uns tantos figurões que por aí andam e que tanto nos quiseram enganar, quando chamavam "investimento" à simples compra de casas com dinheiros de que não se sabia a origem.

sábado, 8 de outubro de 2016

Brasil: fé, devoção e património cultural

O jornal O Liberal que se publica na cidade brasileira de Belém do Pará, dedica a sua edição deste fim de semana às festividades promovidas em honra de Nossa Senhora da Nazaré, que se celebram naquela cidade desde 1793. Só por isso é um acontecimento histórico e cultural e não apenas religioso.
Aquela festa foi introduzida pelos jesuitas portugueses ainda no século XVII, que transpuseram para o Brasil o culto à Senhora da Nazaré. Porém, em nenhuma localidade brasileira aquela festividade suscitou tanta devoção como em Belém, onde se transformou num dos mais participados acontecimentos religiosos do mundo. Porém, o ponto alto das festividades é o famoso Círio de Nazaré, uma procissão da imagem de Nossa Senhora de Nazaré que percorre a cidade de Belém durante algumas horas e que junta mais de dois milhões de pessoas de todos os credos.
Actualmente, as manifestações de devoção religiosa em Belém estendem-se por duas semanas – a quadra nazarena – e incluem diversas cerimónias que mobilizam toda a população da região, como o translado da imagem da Senhora da Nazaré, as romarias rodoviária e fluvial e, ainda, outras procissões destinadas a jovens ou a crianças. Estão programadas doze procissões ou romarias que percorrerão cerca de 140 quilómetros em cerca de 40 horas, mas o acontecimento culminante da festa nazarena é o Círio de Nazaré que, no ano de 2013, foi inscrito pela UNESCO na sua Lista do Património Cultural Imaterial da Humanidade.
Quando se trata do património cultural brasileiro de origem portuguesa reconhecido pela UNESCO, costumam indicar-se os centros históricos de Ouro Preto e Olinda, Salvador e São Luís de Maranhão, Diamantina e Goiás, com os seus santuários, igrejas, imagens e azulejos. Porém, o património cultural brasileiro inscrito nas listas da UNESCO também inclui património imaterial de origem portuguesa, como acontece com o Círio de Nazaré.

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

O enorme Guterres e o pequenino Barroso

No mesmo dia em que o Conselho de Segurança das Nações Unidas escolheu António Guterres para seu secretário-geral por unanimidade e aclamação, o semanário francês Politis centra a sua edição na “Europe des profiteurs” e destaca na sua primeira página a fotografia de José Manuel Barroso, o ex-presidente da Comissão Europeia.
Fui ao Micro Robert, o meu dicionário de francês, para saber o significado exacto daquela palavra “profiteur” e verifiquei que significa “personne qui tire des profits malhonnêtes ou immoraux de quelque chose”. Fiquei estarrecido! No mesmo dia em que a comunidade internacional elogiava e enaltecia a figura exemplar de António Guterres e que o nosso orgulho passava por um raro momento de entusiasmo colectivo, um semanário francês com uma circulação de algumas dezenas de milhar de exemplares revela alguns detalhes sobre “l’avidité et l’affairisme” dos ex-comissários europeus e destaca a promiscuidade entre os interesses das grandes instituições financeiras e as autoridades comunitárias que, segundo salienta o semanário, já não surpreende ninguém.
A figura central dessas críticas é José Manuel Barroso, o homem que aceitou aliar-se à Goldman Sachs pelo dinheiro que lhe ofereciam. Para ele, não houve princípios nem valores. Apenas a febre do dinheiro. Porém, o semanário vai mais longe e informa que no próximo dia 12 de Outubro, os sindicatos dos antigos funcionários europeus irão remeter aos presidentes das três instituições da União Europeia uma petição, na qual reclamam “medidas fortes e exemplares contra José Manuel Barroso por se ter ligado à Goldman Sachs”, a qual é feita em sete línguas e já recolheu 150 mil assinaturas. Uma vergonha!
O contraste entre estes dois antigos primeiros-ministros de Portugal não podia ser mais evidente: um deles entra nas Nações Unidas por unanimidade e aclamação, enquanto outro entra no Goldman Sachs ganancioso e sem princípios, mas humilhado e ridicularizado pela imprensa e pela opinião públicas mundiais. Um grande e um pequenino. Como é possível haver quem seja capaz de comparar estes dois homens, como têm feito nas últimas horas alguns políticos muito medíocres e analfabetos que por aí andam.

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Os meus parabéns para António Guterres

O Diário de Notícias anunciava na sua edição de hoje que “Guterres vai a votos frente a candidata de última hora”. Depois de ter vencido as cinco primeiras votações para a escolha do novo secretário-geral das Nações Unidas realizadas entre os 15 membros do Conselho de Segurança, o candidato António Guterres cuja candidatura para aquele cargo foi proposta em Fevereiro pelo governo português, foi confrontado com o aparecimento de uma nova candidatura, protagonizada pela búlgara Kristalina Georgieva com o apoio do seu governo, da chanceler Merkel e da Comissão Europeia.
Muita gente que apoiava a candidatura de Guterres, incluindo muitos comentadores, criticaram o aparecimento tardio de Georgieva e começaram a imaginar negociações de bastidores, sobretudo entre os membros permanentes do Conselho de Segurança, de que poderia resultar a eleição de um outro candidato. Nessas circunstâncias, as características pessoais e a experiência política de António Guterres podiam deixar de impressionar o Conselho de Segurança, como acontecera até então.
Hoje a meio da tarde a notícia chegou: António Gueterres venceu a sexta votação dos membros do Conselho de Segurança, sem ter tido nenhum veto dos seus membros permanentes.
Pouco depois, o embaixador russo Vitaly Churkin, rodeado pelos embaixadores dos outros membros do Conselho de Segurança afirmou: "Hoje, depois da nossa sexta votação, temos um favorito claro e o seu nome é António Guterres. Decidimos avançar para um voto formal amanhã de manhã e esperamos fazê-lo por aclamação".
Foi a vitória de António Guterres e do governo português, num processo em que todos se uniram em torno de um homem exemplar (excepto um tal Mário David e mais alguns rapazolas que andam por Bruxelas), mas que também foi a afirmação do prestígio de que Portugal goza no mundo como país culturalmente aberto e amante da paz e do progresso.
Eu sou daqueles que acham que é bom para o nosso país que o secretário-geral da ONU seja um português! Estou orgulhoso. Parabéns e boa sorte!

Aniversário da implantação da República

Celebram-se hoje 106 anos sobre a data em que foi implantada a República Portuguesa, na sequência de uma revolta preparada pelo Partido Republicano Português que foi bem sucedida.
O descontentamento popular era enorme devido à crise económica e social, havendo fortes críticas à subordinação nacional aos interesses britânicos, ao poder da Igreja, aos gastos da Família Real e ao governo da Ditadura. Esse descontentamento vinha-se acumulando desde há muitos anos e os adversários da Monarquia aumentavam. O Regicídeo de 1908 foi um sério aviso. Quando os marinheiros e os soldados se revoltaram em Lisboa estavam politicamente enquadrados pelos partidos republicanos e por outras organizações políticas, tinham o apoio da população e encontraram uma resistência débil. Na Rotunda impôs-se a tenacidade, a coragem e a inteligência do comissário naval Machado dos Santos e na manhã do dia 5 de Outubro de 1910, os dirigentes do Partido Republicano Português dirigiram-se para os Paços do Concelho, de cuja varanda José Relvas proclamou a República em nome do Povo, do Exército e da Armada. Pela mesma hora o rei D. Manuel II e a Rainha D. Amélia suamãe, embarcaram na Ericeira para o exílio.
O dia 5 de Outubro passou a ser um dia de grande unidade nacional. Durante muitos anos foi feriado, teve cerimónia oficial e foi dia de festa. Depois deixou de ser tudo isso. Voltou o feriado e a cerimónia oficial, mas a festa foi esquecida, inclusive pela Imprensa.
Hoje, apenas o Diário de Notícias da Madeira evoca a proclamação da República e fá-lo com grande destaque. São sinais dos tempos e da falta de memória histórica por que passa a nossa Imprensa que, certamente, esteve muito envolvida no cocktail da inauguração do Maat.

Maat: o novo museu que nos enche a vista

Foi inaugurado ontem em Lisboa o novo Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia que resultou de uma iniciativa da Fundação EDP e que a publicidade e a imprensa já consagraram pela sigla maat.
Localizado na margem do rio Tejo na zona de Belém, o maat foi desenhado pela arquitecta britânica Amanda Levete e traz novas formas arquitectónicas à cidade de Lisboa, alinhando-se na mesma zona da cidade com outras expressões da arquitectura contemporânea, como são as instalações da Fundação Champalimaud concebidas pelo arquitecto goês Charles Correa e o Museu Nacional dos Coches desenhado pelo arquitecto brasileiro Paulo Mendes da Rocha. Esta zona histórica da cidade onde se encontram alguns dos mais simbólicos monumentos portugueses que evocam o nosso passado histórico, fica agora enriquecida com mais uma construção moderna, futurista e de grande qualidade arquitectónica, que valoriza a cidade de Lisboa e que tem características para se tornar uma referência no circuito internacional da arte contemporânea, para além de ser um novo e sofisticado miradouro sobre o Tejo.  
A EDP e a sua Fundação estão de parabéns por esta iniciativa cultural e aqui fica registado o meu aplauso, com base naquilo que a televisão nos mostrou e os jornais escreveram, porque só mais tarde visitarei este novo equipamento cultural.
Porém, os jornais dizem que o maat custou 20 milhões de euros. Assim sendo, esta obra custou apenas 2% do lucro anual da EDP que, habitualmente, atinge mais de mil milhões de euros. Nessas circunstâncias, os merecidos louvores à EDP têm que ser controlados, até porque todos esses lucros resultam da prática continuada e abusiva de preços exagerados que a EDP pratica nos seus fornecimentos de energia aos consumidores. Por isso, a EDP não exagerou na sua generosidade cultural, pois limitou-se a devolver à fruição dos cidadãos uma parte daquilo que mensalmente lhes tinha retirado.

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

A Índia e o Paquistão em rota de colisão?

A descolonização e a partilha da Índia Inglesa aconteceu em 1947 e dela resultou a criação da Índia e do Paquistão como Estados independentes, numa separação em que o factor religioso foi dominante. Porém, a partilha dessa região do Império Britânico não ficou bem resolvida e, desde então, os muçulmanos de Islamabad e os hindus de Nova Delhi já se envolveram em quatro guerras em 1947, 1965, 1971 e 1999, embora esses conflitos tenham sido sempre muito localizados.
A rivalidade indo-paquistanesa não é só religiosa mas também é política, pois resulta das suas discordâncias em relação ao território de Jammu e Caxemira, que é considerado o lugar mais perigoso ou a fronteira mais perigosa do mundo, daí resultando a presença da UN Military Observer Group in India and Pakistan (UNMOGIP), que desde 1949 observa o que se passa e procura dissuadir aqueles países de se envolverem em acções militares. Ambos os países reivindicam essa região, a China não se mostra desinteressada e há os movimentos locais independentistas.
Os atritos e as incursões são frequentes e geram tensões que, muitas vezes, tendem para a escalada. Assim tem acontecido nos últimos dias, como tem sido noticiado por alguma imprensa internacional, o que já levou as Nações Unidas a recomendar moderação aos dois países que, como se sabe, dispõem de armamento nuclear.
Embora a imprensa indiana ainda não tenha tratado deste tema porque ainda estará nos limites do tolerável, a última edição em hindi da revista Outlook (आउटलुक), que se publica em Nova Delhi, chama a atenção para a situação que se está a viver e mostra uma fotografia da extravagante cerimónia militar do encerramento da fronteira em Wagah, no Punjab, à qual assistem muitas centenas de pessoas entusiasmadas e delirantes, como se fosse um grande espectáculo musical ou desportivo. A publicação desta fotografia na mais influente revista indiana não pode deixar de ser “um apelo ao nacionalismo indiano face à ameaça de agressão paquistanesa”. Certamente que em Islamabad também haverá revistas com semelhantes "apelos ao nacionalismo paquistanês face à ameaça de agressão indiana". Tem sido sempre assim desde 1947, isto é, desde que o hindu Jawaharlal Nerhu e o islamita Muhammad Ali Jinnah se desentenderam.

O referendo ameaça a paz na Colômbia

As enormes expectativas criadas há uma semana com a assinatura dos acordos de Cartagena e com o fim da guerra civil, tremeram ontem na Colômbia com o anúncio dos resultados do referendo promovido pelo Presidente Juan Manuel Santos: 49,8% dos colombianos disseram sim aos acordos de Cartagena, mas 50,2% recusaram-no. Em termos mais simples, o povo colombiano rejeitou o acordo de paz com as FARC.
Tal como aconteceu recentemente no Reino Unido, os referendos têm por vezes resultados inesperados e que tudo complicam...
A interpretação destes resultados mostra que os colombianos querem a paz, mas estão divididos e não a aceitam a qualquer preço. Assim, uma boa parte da população parece não querer esquecer e perdoar as práticas de terror desenvolvidas pelos guerrilheiros durante tantos anos e não aceita os termos negociados para a sua integração na sociedade colombiana.
Sabia-se das dificuldades que os guerrilheiros teriam na sua transição da selva para a cidade, mas não se imaginava que houvesse um tão forte sentimento de rejeição aos guerrilheiros, o que significa que as feridas da guerra são ainda muito profundas.
Hoje o jornal El Heraldo publica uma declaração de Juan Manuel Santos: “no me rendiré, seguié buscando la paz hasta el último minuto de mi mandato”. De facto, a tarefa que o Presidente da República da Colômbia tem pela frente é complexa e difícil mas, apesar da ameaça que é o resultado do referendo, os colombianos vão certamente ultrapassar esta dificuldade.

domingo, 2 de outubro de 2016

Argentinos festejam no Mundial de futsal

A cidade colombiana de Cali assistiu ontem à final da Copa Mundial de Fútsal de la FIFA – Colômbia 2016, em que a equipa da Argentina derrotou a equipa da Rússia por 5-4, tornando-se campeã mundial pela primeira vez nesta modalidade que, até então, apenas tinha tido o Brasil e a Espanha como campeões. Antes, jogaram as equipas de Portugal e do Irão para discutir o 3º lugar, mas depois de um empate por 2-2 no tempo regulamentar, a sorte dos pontapés de grande penalidade sorriu ao Irão e a equipa portuguesa regressou de Cali com um 4º lugar.
A vitória argentina teve honras de primeira página na maior parte dos jornais argentinos, como sucedeu com o diário Clarín que salientou em título “la alegria más grande en el futsal”, mas os jornais portugueses não deram qualquer destaque à participação portuguesa neste campeonato mundial. Apesar da equipa portuguesa não tenha atingido o resultado de 2000 quando se classificou em 3º lugar no campeonato do mundo disputado na Guatemala, a participação portuguesa em 2016 foi muito positiva, como se pôde observar através das transmissões directas da RTP. Depois de defrontar a Colômbia (1-1), o Panamá (9-0), o Uzbequistão (5-1), a Costa Rica (4-0) e o Azerbaijão (3-2), a equipa defrontou a Argentina nas meias-finais e foi derrotada por 5-2. Com esta derrota no jogo de acesso à final, a selecção portuguesa foi disputar o 3º lugar com o Irão e perdeu esse jogo.
A espetacularidade do futsal é entusiasmante e o 4º lugar obtido em Cali pela selecção portuguesa merece aplauso, tal como o virtuoso Ricardo Braga ou Ricardinho, um filho de Gondomar que além de já ser considerado o melhor jogador do mundo, foi o maior marcador de golos (12) nesta Copa Mundial de Fútsal de la FIFA – Colômbia 2016. Porém, a grande festa foi argentina como se vê na fotografia publicada pelo diário Clarín e na restante imprensa argentina.

Um caso tão triste “born in Boliqueime”

Os livros que tratam da Ciência da Comunicação ensinam que uma notícia é um relato de um acontecimento verdadeiro ou não. Assim, a notícia da primeira página do Público de ontem, segundo a qual “Cavaco pagou durante 15 anos metade do IMI que devia ter pago”, pode referir-se a uma facto verdadeiro ou não verdadeiro, mas é com certeza mais uma achega para confirmar a desastrada apetência de Aníbal Cavaco Silva por dinheiro e a sua ânsia por atingir uma situação material que apague o seu passado rural e altere o seu estatuto identitário de born in Boliqueime. A história é longa, controversa e não cabe toda aqui.
Por escritura realizada em 9 de Julho de 1998, Cavaco trocou a sua vivenda Mariani de Montechoro pela Gaivota Azul no empreendimento da Aldeia da Coelha, sendo atribuido o valor de 135 mil euros a cada uma das casas, embora fossem muito diferentes. Ele fez que não viu. Segundo refere a notícia, o contribuinte Cavaco terá fornecido às Finanças dados errados da sua nova casa, da sua área e das suas características, o que terá feito cair para cerca de metade os impostos que devia pagar. Ele fez que não viu. Entretanto, em 2009 a autoridade tributária considerava que, pelo menos desde 1999, a casa de Cavaco tinha um valor patrimonial de 199.469 euros, mas em 2015 os mesmos serviços reavaliaram a mesma casa e chegaram a um valor muito diferente: 392.220 euros. O jornal não conseguiu apurar se as Finanças lhe exigiram ou não que pagasse o diferencial entre os impostos que pagou desde 2000 e aqueles que realmente devia ter pago.
Porém, a trapalhada contributiva de Cavaco tem outros contornos nada exemplares para quem ocupou os mais altos cargos do Estado. Assim, tendo sido accionista da S.L.N., que era a detentora do BPN, em 2001 adquiriu 105.378 acções dessa sociedade gerida pelos seus amigos Oliveira e Costa e Dias Loureiro. Dois anos depois, essas acções que tinham sido compradas a um euro cada uma foram recompradas pela S.L.N. a 2,4 euros, o que significou um lucro de 147,5 mil euros, enquanto a sua filha lucrou ainda mais ao embolsar um lucro de 209,4 mil euros. Uma mais-valia de cerca de 150% em dois anos! Como é que um economista tão experiente não viu anormalidade neste caso?
Depois Cavaco foi para Belém e, pasme-se, abdicou do seu vencimento como Presidente da República para beneficiar da pensão de reforma que era mais elevada, isto é, Cavaco alheou-se demasiadas vezes dos princípios de cidadania em que devia ter sido exemplar, fazendo negócios cinzentos com acções e não cumprindo obrigações fiscais.
Cavaco continua a ser um caso triste da nossa história recente.