sábado, 30 de abril de 2022

Remendar a França e ter a paz na Ucrânia

O jornal La Croix publica-se em Paris e é um dos grandes jornais franceses de circulação nacional, afirmando-se com uma linha editorial que se diz imparcial nas questões políticas e sociais, mas que tem posições próximas da Igreja Católica.
Na sua edição de hoje, o jornal apresenta um mapa de França rasgado e com os sinais de estar a ser cosido, tendo por legenda “remendar a França”. Depois da recente disputa para as eleições presidenciais, em que Emmanuel Macron venceu com os votos daqueles que “o escolheram entre o menor dos males”, ele mesmo reconheceu as dificuldades que terá que ultrapassar, quer na frente interna com os problemas nas escolas, na segurança pública, na precariedade laboral e na integração das minorias, quer na frente externa com o agravamento da crise no leste europeu. Daí a ideia de remendar a França e de ultrapassar as divisões políticas, sociais e regionais que afectam o país, ameaçado ainda pelo movimento dos coletes amarelos (Mouvement des gilets jaunes), que nasceu em 2018 de forma espontânea para protestar contra “a ordem estabelecida” ou contra “a ordem centrista de Macron”, que quase paralisou a França e que ameaça agora regressar às ruas francesas.
Este quadro acontece quando no Leste da Europa se verifica um agravamento da confrontação entre os protagonistas da Guerra Fria, a mostrar que a Ucrânia é, sobretudo, um pretexto ou um palco para o domínio do mundo. Não se imaginava que tal pudesse acontecer, mas nessas circunstâncias a estabilidade da França é importantíssima para a União Europeia, mas também é importante para Portugal. As tensões entre a Rússia e a Ucrânia não deveriam ter atravessado o Atlântico e deveriam ter sido mediadas e arbitradas por Emmanuel Macron, ou por Olaf Scholz, ou por Recep Erdoğan, ou por António Guterres. No entanto, é sempre desejável que Macron “remende a França” e ajude à conversa entre Putin e Zelensky, para que aconteça o cessar-fogo e haja paz na Ucrânia.

O preço que a Europa paga pela guerra

O jornal espanhol ABC publica na sua edição de hoje uma fotografia de Irpin, uma cidade-satélite situada a ocidente de Kiev, onde se pode observar a enorme destruição provocada pela ocupação russa durante cerca de um mês. A imagem sugere que é preciso acabar com a guerra e procurar o cessar-fogo e a paz, que deveriam ser um objectivo para a comunidade internacional, tal como o seu apoio aos esforços do secretário-geral das Nações Unidas e de outros mediadores.
O mesmo jornal, inclui na primeira página um título que nos ajuda a compreender o que se está a passar na Ucrânia e que diz que “Europa financia la guerra de Putin com 22.000 millones de euros al mes”. Se aquele montante mensal for verdadeiro, representa um valor anual que excede o PIB português que é de cerca de 220 mil milhões de euros. Porém, se olharmos para os 2.451 milhões de euros que estão inscritos para o ano de 2022 no Orçamento do Estado português para a Defesa Nacional, ficamos com uma noção mais exacta do preço que a Europa está a pagar pelo seguidismo com que tem acompanhado os Estados Unidos, ao promover a continuação da guerra e a catástrofe humanitária que a acompanha, em vez de procurar a paz.
A forma desinteressada como foi olhada a visita de António Guterres a Moscovo e a Kiev, parece confirmar que para o lado ocidental é mais importante punir a Rússia, do que encontrar a paz e poupar o sacrifício do povo ucraniano. Antes da invasão ordenada por Putin, houve vários líderes europeus que procuraram mediar o conflito e evitar a guerra, mas as indústrias do armamento e os seus falcões parecem estar a conseguir o seu já declarado objectivo de enfraquecer a Rússia, embora essa tarefa esteja a ser feita à custa do sofrimento dos ucranianos e da destruição das suas cidades e, em menor escala, da regressão da economia, do modelo social e da coesão europeia.
Não são nada animadores os tempos que aí vêm.

sexta-feira, 29 de abril de 2022

A mais dura e humilhante derrota de Putin

O jornal Morgenavisen Jyllands-Posten é o jornal de maior tiragem na Dinamarca, publica-se na cidade de Aarhus e circula desde 1871. Na sua edição de hoje o jornal dá um grande destaque ao cruzador Moskva, o navio-almirante da frota russa do mar Negro que era um símbolo do poder naval da Rússia e que foi afundado há duas semanas. A ilustração que o jornal hoje publica é acompanhada pela legenda “Flagskibet der endte pá bunden af Sortehavet” que, com a ajuda do Google, traduzimos como “o navio-chefe que acabou no fundo do mar Negro”. No meio de tantas notícias que mostram o agravamento da guerra, ao tratar este assunto duas semanas depois de ter ocorrido, o jornal destaca aquela que poderá ter sido a derrota militar mais humilhante que o regime de Putin sofreu até agora.
Entretanto, a situação parece agravar-se no terreno, como mostra o pedido que Joe Biden fez ao Congresso para autorizar uma ajuda suplementar à Ucrânia de 33 mil milhões de dólares, ou o crescente envolvimento da NATO com o fornecimento de material de guerra ou, ainda, o destacamento de soldados para as fronteiras do leste da Europa.
Por outro lado, as diligências feitas pelo secretário-geral das Nações Unidas em Moscovo e Kiev para se caminhar para a paz, parecem ter muito pouco apoio, como se verifica na residual cobertura mediática que a sua deslocação teve, designadamente nos Estados Unidos e no Reino Unido. Parece, assim, que tinha razão o ministro turco dos Negócios Estrangeiros quando afirmou que alguns países-membros da NATO pretendem que a guerra na Ucrânia perdure, de modo causar a erosão das capacidades e o enfraquecimento da Rússia, pois a situação na Ucrânia pouco lhes importa. Isto, diz a Turquia, que é membro da NATO e que tanto se tem esforçado para conseguir a paz.

quarta-feira, 27 de abril de 2022

António Guterres, um missionário da paz

António Guterres, o secretário-geral das Nações Unidas, esteve ontem em Moscovo e amanhã vai estar em Kiev. Numa altura em que quase só se fala de guerra e em que há quem deseje a sua continuação, havendo mesmo quem considere que já estamos numa terceira guerra mundial, o sofrimento e a dor do povo ucraniano parecem esquecidos e não se vêm diligências suficientes para conseguir um cessar-fogo que permita negociar a paz. Tem-se verificado, inclusive, um agravamento das ameaças e dos discursos provocatórios, numa escalada belicista irresponsável em que a Europa se deixou envolver, como subalterna de uma outra disputa. Por isso, o esforço de António Guterres “para salvar vidas” ou para abrir caminhos para a paz, deve ser saudado, tal como os repetidos apelos à paz lançados pelo Papa Francisco.
Todos os principais jornais portugueses publicaram a fotografia de Putin e Guterres no Kremlin à volta da grande mesa oval e separados por seis metros, mas apenas porque o secretário-geral é português. Na imprensa estrangeira, essa fotografia não foi publicada, o que significa que a missão de paz de António Guterres está a ter menos importância do que as deslocações de Antony Blinken e de Lloyd Austin, que foram a Kiev anunciar mais apoio financeiro para, segundo disse Austin, “enfraquecer a Rússia ao ponto de já não ser capaz de invadir a Ucrânia”. Do outro lado, a réplica de Putin também é ameaçadora ao dizer que responderá com um ataque “relâmpago” a qualquer ingerência estrangeira na Ucrânia. Entre todas estas e outras preocupantes e até assustadoras declarações, há que saudar a missão de António Guterres e desejar-lhe que consiga progressos nos caminhos da paz.

Uma estátua para o turismo e o emprego

Na pequena cidade brasileira de Encantado, situada no estado do Rio Grande do Sul, foi anunciada a conclusão de uma estátua do Cristo Protetor que, com os seus 43,5 metros de altura, fica a constituir o maior monumento brasileiro desse tipo, superando os 38 metros do Cristo Redentor do morro do Corcovado, no Rio de Janeiro, que foi informalmente escolhido como uma das sete maravilhas do mundo moderno e que desde 2012 foi incluído na lista do património mundial da Unesco. O Cristo de Encantado foi construído em betão e aço, pesa 1,7 toneladas e tem 39 metros de envergadura, isto é, de distância entre a ponta de um braço e a outra ponta.
Encantado é um município que se localiza no Vale do Taquari, a cerca de 140 quilómetros de Porto Alegre, a capital do estado, a 820 quilómetros de São Paulo e a cerca de 400 quilómetros da cidade de Rivera, na fronteira com o Uruguai. A ideia da construção desta estátua teve em vista a criação de um polo de atracção de turismo religioso na cidade de Encantado, tendo sido custeada por empresários da região e por doações de particulares, visando “transmitir a fé do povo e alavancar o turismo na região”. Assim se gera a criação de emprego e se anima a economia da região. De resto, está constituída a Associação Amigos de Cristo do Encantado que é a entidade responsável pela execução desta obra e que vem preparando as estruturas comerciais que apoiarão os futuros visitantes.
O Cristo do Encantado começou a ser construído em 2019 e foi concebido pelos escultores cearenses Genésio Moura e seu filho Markus Moura. Um dos destaques da obra é o coração da estátua, que será envidraçado e terá funções de miradouro, havendo um elevador que levará os visitantes até lá, de onde será possível ter uma vista panorâmica da cidade e do vale onde está implantada.
O jornal Estado de S. Paulo noticiou a conclusão da obra e publicou uma fotografia do Cristo do Encantado com destaque de primeira página. A ideia bem merece esse destaque.

segunda-feira, 25 de abril de 2022

O novo mandato de Macron e a Ucrânia

Na 2ª volta das eleições presidenciais francesas que ontem se realizaram, o candidato Emmanuel Macron foi reeleito com 18,779 milhões de votos (58,5 %), enquanto a sua adversária Marine Le Pen conseguiu 13,297 milhões de votos (41,5 %).
A vitória de Emmanuel Macron foi inquestionável, mas se compararmos os resultados de ontem com os resultados das eleições presidenciais de 2017, em que Macron conseguiu cerca de 20,743 milhões de votos (66,1 %) e Marine Le Pen obteve 10,638 milhões de votos (33,9 %), verificamos que, entre 2017 e 2022, Macron perdeu cerca de dois milhões de votos e que Marine Le Pen subiu a sua votação em mais de dois milhões e setecentos mil votos. Estes resultados foram considerados uma vitória do europeísmo e uma derrota do populismo, mas a vitória de Macron tem um sabor amargo e constitui um desafio para o seu segundo mandato: por um lado houve cerca de 28 % de abstenções que corresponderam a cerca de 14 milhões de franceses que não foram às urnas e, por outro, ele recebeu alguns milhões de votos de eleitores que lhe deram o seu voto apenas porque o não queriam dar a Le Pen. Como disse Jean Luc Mélenchon, o líder da extrema-esquerda, o presidente Macron sobreviveu “num oceano de abstenção e de votos brancos e nulos”.
Emmanuel Macron sabe bem as dificuldades que o esperam tanto interna como externamente, tendo declarado que “já não sou candidato de alguns, mas sou o presidente de todos”, acrescentando que “sei que um grande número dos nossos compatriotas votaram hoje por mim, não por me apoiarem, mas para fazerem barreira à extrema-direita, mas quero dizer-lhes que tenho consciência da minha dívida nos próximos anos".
Todos sabem o empenhamento com que Macron procurou evitar a guerra na Ucrânia, cujo esforço só foi suspenso devido à sua campanha eleitoral. Espera-se agora que Emmanuel Macron volte a restabelecer contactos com Moscovo e Kiev, para ajudar a fazer o que tem que ser feito: o cessar-fogo na Ucrânia.

Ucrânia e a competição entre dois mundos

Estamos com dois meses de guerra na Ucrânia e temos sido inundados com enormes volumes de informação, temos ouvido muitas dezenas de comentadores e temos visto imagens da guerra e das suas muito dramáticas consequências. 
Porém, a simplicidade da capa da edição de ontem do jornal berria oferece-nos mais uma perspectiva do conflito que opõe Moscovo e Kiev, ou da guerra em que se enfrentam Vladimir Putin e Volodymyr Zelensky.
O berria é um jornal diário com sede em Andoain, uma pequena cidade do norte de Espanha, localizada próximo de San Sebastián/Donostia, na província de Guipúscoa da comunidade autónoma do País Basco, sendo o único jornal publicado em língua basca. A imagem que o jornal escolheu para ilustrar a sua última edição sugere uma visão do conflito que desvaloriza o agressor e o agredido, pois centra-se num exercício de equilíbrio e na competição entre dois blocos e dois mundos. Com a ajuda do Google, pudemos ler que “embora o conflito militar, que começou há dois meses, não se tenha espalhado para fora do país do Leste europeu, as suas consequências geopolíticas estão a espalhar-se por quase todos os cantos do globo”. 
Como se verifica pelas múltiplas interferências externas que já estão a influenciar a evolução do conflito, designadamente através da presença de combatentes estrangeiros e do intenso fornecimento de armamento proveniente de muitas origens, há muitas razões para nos preocuparmos com o que se está a passar na Ucrânia e para desejarmos que rapidamente se chegue ao cessar-fogo.

domingo, 24 de abril de 2022

Viva o 25 de Abril, viva o dia da Liberdade!

Cartaz da Associação 25 de Abril
Já lá vai o tempo em que alguns discutiam se o 25 de Abril tinha valido a pena, mas 48 anos depois daquele dia inicial inteiro e limpo, já ninguém ousa discutir a importância que tiveram para a sociedade portuguesa as portas que Abril abriu.  Hoje, só os mais velhos sabem o que foram os tempos sombrios da ditadura e das suas verdades indiscutíveis, das perseguições políticas e da emigração maciça, do obscurantismo cultural e do subdesenvolvimento económico, da intransigência salazarista-caetanista e da guerra colonial.
As sociedades são dinâmicas e evoluem por ciclos. Os nossos quase nove séculos de história mostram-nos isso mesmo, com ciclos como os tempos faustosos das índias e dos brasis, mas também com os tempos das humilhações da ocupação filipina e das invasões francesas. Mais recentemente, ao ciclo da repressão política e do conformismo em que vivemos desde 1926, seguiu-se depois de 1974 um esperançoso ciclo com a integração no espaço democrático europeu e a apressada recuperação do tempo perdido, com liberdade, bem-estar económico e paz social.
Porém, nos tempos que vivemos é imprevisível definir ou antecipar que outro tipo de ciclo nos espera. Por isso, a evocação do 25 de Abril não pode ser apenas uma referência histórica e um marco festivo e emocional para aqueles que viveram a alegria da libertação, mas tem que constituir um momento de reflexão relativamente aos princípios e valores que esse dia nos ajudou a adquirir, mas que carecem de aprofundamento no que respeita ao nosso sistema político e social, designadamente na defesa dos interesses e das causas públicas, no combate às desigualdades sociais e às assimetrias regionais, no reforço da solidariedade nacional e na prevenção das alterações climáticas e dos seus efeitos. 
Os princípios democráticos e de desenvolvimento que nortearam o 25 de Abril têm que ser reafirmados a propósito da sua celebração, para mostrar aos cidadãos e aos que eles escolheram como seus representantes, que desejamos uma sociedade mais justa e mais solidária, sem corrupção, sem tráfico de influências e sem clientelismo. 
Será nesse espírito que amanhã havemos de celebrar o 25 de Abril.

sábado, 23 de abril de 2022

Brasil: fim da pandemia, volta a euforia

Os festejos de Carnaval acontecem em todo o mundo entre os meses de Fevereiro e Março, mas este ano o Brasil está a celebrá-lo no mês de Abril.
Nos dois últimos anos as autoridades brasileiras tinham decretado a suspensão dos festejos carnavalescos devido à pandemia da covid-19, mas com a melhoria que se tem verificado, apesar de ter havido alguma hesitação e até adiamento, foi finalmente decidido fazer o Carnaval nas cidades brasileiras, embora fora da sua época natural. 
No caso do Rio de Janeiro, o sambódromo da Avenida Marquês de Sapucai voltou a animar-se desde a passada 4ª feira com os primeiros desfiles das escolas de samba, “após dois anos de sono involuntário, devido à pandemia”. Nos dois primeiros dias desfilaram 15 agremiações da chamada Série Ouro, mas ontem e amanhã, dias 22 e 23, desfilarão as 12 agremiações ou escolas do chamado Grupo Especial. Significa que, este ano, participam no Carnaval do Rio de Janeiro e no sambódromo de Sapucai um total de 27 escolas. Porém, a força do Carnaval encontra-se não só nas escolas de samba, mas também nos carros alegóricos e nos seus detalhes, bem como na perfeição e criatividade das inúmeras fantasias carnavalescas, para além da participação popular que fazem do Carnaval a grande festa brasileira. 
Naturalmente, a imprensa brasileira destaca hoje o regresso do Carnaval, tendo o jornal O Dia indicado os nomes das escolas que desfilarão amanhã: Paraíso do Tuiuti, Portela, Mocidade Independente de Padre Miguel, Unidos da Tijuca, Grande Rio e Vila Isabel.

sexta-feira, 22 de abril de 2022

E já vão dois meses de guerra na Ucrânia

No dia 24 de Fevereiro, logo que Putin anunciou uma “operação militar especial” em território ucraniano, classificamos aqui que era “um dia negro na História da Europa” e a concluir esse texto escrevemos: 
“Todos condenam Putin e declaram solidariedade para com o povo ucraniano. Nós também. Que o cessar-fogo e a diplomacia cheguem depressa. Que tudo isto seja apenas um sonho mau”.
Vai para dois meses que essa invasão começou. O invasor russo terá imaginado que tudo resolveria numa semana, mas falhou na sua caminhada para Kiev, onde não esperava a corajosa resistência dos ucranianos. As tentativas já feitas para conseguir um cessar-fogo ainda não resultaram e os trágicos efeitos da guerra são visíveis nos mortos deixados no terreno, nas filas de milhares de refugiados e nas indescritíveis marcas de destruição das cidades. Nestas circunstâncias todos perdem com a catástrofe humanitária desta guerra, embora os russos venham perdendo mais, sobretudo porque foram travados nas grandes cidades e perderam o Moskva, o navio-chefe da sua frota do mar Negro.
Não se sabe bem como estão as coisas no terreno, mas as informações são contraditórias. A imprensa americana de hoje anuncia que “Putin proclaims fall of Mariupol, yet fight goes on (The New York Times) e que “Russia claims Mariupol victory as Ukrainian troops hold out” (The Wall Street Journal), mas The Washington Post diz que “U.S. reinforces aid to Ukraine”.
Há várias teorias, que diariamente são expostas pelos comentadores televisivos, quanto ao possível desenvolvimento da guerra, às ajudas e aos envolvimentos externos, à prática de crimes de guerra e à capacidade de resistência dos contendores, mas ninguém, ou quase ninguém, fala do cessar-fogo e da paz, como se não fosse esse o principal objectivo a perseguir. A propaganda domina e há quem queira que a guerra continue, parecendo cada vez mais que a Ucrânia e os ucranianos são apenas um campo experimental, ou um pretexto, para que os grandes poderes se enfrentem na sua ganância pelo domínio do mundo.

quarta-feira, 20 de abril de 2022

Eleições francesas: Macron ou Le Pen?

Os candidatos à presidência da França que chegaram à 2ª volta, vão encontrar-se esta noite num debate televisivo que interessa a meio mundo e não apenas aos franceses. O centrista e actual presidente Emmanuel Macron parece ter alguma vantagem sobre a candidata radical de extrema-direita Marine Le Pen, mas as sondagens têm errado tanto, como se viu desde o imprevisto "sim" ao Brexit, até à recente vitória de Carlos Moedas em Lisboa, que é caso para utilizar a repetida expressão “prognósticos só no fim do jogo”. Por isso, o debate desta noite pode influenciar o resultado do próximo domingo.
As eleições francesas são muito importantes para a Europa e para o mundo, porque à instabilidade e à incerteza trazidas pela guerra na Ucrânia, junta-se a ameaça de implosão da União Europeia, que o projecto nacionalista de Marine Le Pen corporiza. Por outro lado, Emmanuel Macron tem sido o líder ocidental que, aparentemente, mais tem feito no sentido de haver um cessar-fogo na Ucrânia e para que haja negociações entre Kiev e Moscovo, ou entre Moscovo e Washington.
Hoje, toda a imprensa francesa, como sucede com o jornal Le Parisien, dedica largo espaço ao debate desta noite. Nos tempos por que passamos, a vitória de Emmanuel Macron é uma necessidade para não aprofundar a incerteza com que actualmente nos confrontamos, ou mesmo para salvar o projecto europeu de paz, solidariedade e progresso.

terça-feira, 19 de abril de 2022

Angola protege o seu património cultural

O Dia Internacional dos Monumentos e Sítios foi ontem evocado em todo o mundo sob a inspiração da Unesco e, em Angola, segundo hoje revela a edição do Jornal de Angola, ocorreram muitas iniciativas de que se destaca a classificação do Palácio do Governo, em Luanda, como novo registo do Património Histórico-Cultural Nacional.
De acordo com a directora-geral do Instituto Nacional do Património Cultural de Angola, o país conta actualmente com 265 monumentos e sítios classificados, embora a notícia do Jornal de Angola refira que são mais de trezentos. O facto é que parece que as autoridades angolanas estão a trabalhar para preservar o seu património cultural – património imaterial, património móvel e património imóvel – mas também para a sensibilização da sociedade sobre essa matéria, incluindo a consciencialização quanto aos efeitos ambientais na vida e na cultura dos povos.
Do registo nacional para o plano mundial há um enorme salto e, actualmente, Angola apenas tem Mbanza Kongo, que conserva os vestígios da capital do antigo Reino do Kongo, registada desde 2017 na World Heritage List da Unesco. Entretanto, a Unesco já tinha aceitado os processos de inscrição preliminar que agora deverão ser acelerados, das gravuras rupestres de Tchitundu-Hulu, no Namibe, do corredor do Kwanza que está ligado à rota da escravatura e da cidade de Cuito Cuanavale, que é considerada um símbolo da paz, do diálogo e da reconciliação nacional. O governo angolano anunciou agora que pretende avançar este ano com estas três candidaturas para inscrição na rota do património mundial da Unesco. É uma boa notícia para Angola e não só.

segunda-feira, 18 de abril de 2022

Viva o andebol que nos dá boas alegrias!

A selecção portuguesa de andebol classificou-se pela segunda vez consecutiva para o Campeonato do Mundo de 2023, depois de ter derrotado a selecção dos Países Baixos por 35-28 num jogo disputado em Eindhoven, depois de ter perdido por 33-30 no jogo da primeira mão disputado em Portimão. Desta maneira, a selecção portuguesa garantiu a sua quinta presença num Mundial de andebol, depois de ter participado nas edições de 1997, 2002, 2003 e 2021.
O 2023 World Men’s Handball Chamionship vai ser disputado na Suécia e na Polónia, entre os dias 11 e 29 de Janeiro de 2023. No dia 2 de Julho será realizado em Katowice o sorteio que distribuirá as 32 equipas finalistas por oito grupos de quatro equipas cada.
A Dinamarca é a actual bicampeã do mundo, tendo triunfado no anterior campeonato disputado em 2021 no Egipto, em que Portugal obteve a décima posição.
Hoje, com a sua insensibilidade habitual aos desportos que não o futebol, a imprensa portuguesa não deu qualquer destaque a esta notícia desportiva, incluindo os jornais desportivos que se esgotaram a discutir e a analisar o Sporting-Benfica que se realizou ontem.
Porém, aqui fica o nosso aplauso à equipa portuguesa de andebol que, esperemos, nos possa dar alegrias no próximo Campeonato do Mundo.

domingo, 17 de abril de 2022

Falcon 50, ou vício de utilizar mordomias

O semanário tal & qual foi fundado em 1980 pelo jornalista Joaquim Letria e foi publicado até 2007, data em que por motivos económicos cessou a sua publicação. De formato tablóide e de circulação semanal, tinha bastante aceitação e teve grande sucesso, embora adoptasse uma postura demasiado sensacionalista.
Em Junho de 2021 o jornal reapareceu sob a responsabilidade de um consórcio de jornalistas, alguns dos quais são reconhecidamente credíveis, com o mesmo estilo sensacionalista que tinha adoptado na sua versão inicial.
Na sua última edição, o semanário escolheu o título “o que está a dar é andar de Falcon”, que está em linha com a sua orientação editorial sensacionalista. Pois o jornal verificou que, entre Abril de 2021 e Abril de 2022, os três Falcon 50 da Força Aérea Portuguesa realizaram 71 viagens ao serviço do Presidente da República e de membros do Governo, designadamente do Primeiro-Ministro e dos Ministros dos Negócios Estrangeiros e da Defesa Nacional. No caso do Chefe do Estado, o Falcon 50 foi utilizado trinta vezes, não só no interior do território nacional, mas também em viagens para o estrangeiro. Esta frequente requisição do Falcon 50 é uma mordomia, um verdadeiro exagero, uma despesa desnecessária e um caso de novo-riquismo injustificável. Um dos exemplos apresentados na imprensa referem-se ao passado dia 29 de Março, em que Marcelo Rebelo de Sousa utilizou um Falcon 50 para ir ao Porto ver o jogo de futebol entre Portugal e a Macedónia do Norte, de qualificação para o Mundial de 2022 e, depois, para regressar a Lisboa para poder estar presente no Coliseu dos Recreios, para assistir ao final do concerto com que Simone de Oliveira assinalou o seu fim de 65 anos de carreira.
Então os Falcon 50 são para estas coisas?

sexta-feira, 15 de abril de 2022

Um duro golpe para a Marinha da Rússia

A evolução da guerra na Ucrânia, ou da operação especial como se lhe referiu o Vladimir, tem-me interessado pouco, sobretudo porque as televisões são demasiado repetitivas e seguem à risca as novas regras do jornalismo tablóide e sensacionalista, em que a verdade pouco vale. Daí resulta uma manipulação dos factos, com a difusão de notícias a transformar-se muitas vezes num exercício de propaganda, em que se misturam opiniões com factos, uns verdadeiros e outros não. Porém, as imagens da guerra são brutais, trágicas e chocantes. Não se imaginava que fosse possível acontecer o que está a suceder. Há que parar com esta catástrofe e discutir depois o que tiver que ser discutido.
Entretanto, parecem estar suspensas as negociações com vista a um cessar-fogo que tarda e, pelo contrário, há demasiados sinais de agravamento do conflito, tanto no terreno, como nas chancelarias que parece pensarem mais no envio de armas para a fogueira, do que chegar à paz.
Na noite de quarta-feira, ao largo de Odessa, o cruzador russo Moskva, o navio-almirante da frota do mar Negro, teve uma explosão a bordo, seguida de incêndio e acabou por se afundar. Russos e ucranianos deram explicações bem diferentes para esse caso. Para os ucranianos, o navio terá sido atingido por dois mísseis R-360 Neptuno, que provocaram o incêndio, a que se seguiu a explosão de munições, mas os russos negam que tenha havido impacto de mísseis. A tripulação de cerca de 500 elementos abandonou o navio que, com graves danos, começou a ser rebocado para Sevastopol, mas acabou por se afundar.
O cruzador Moskva deslocava 12.490 toneladas e tinha 184 metros de comprimento, estando ao serviço desde 1983. O seu afundamento foi um duro golpe para a Marinha da Rússia, uma enorme derrota no campo psicológico e um forte abalo no seu orgulho, enquanto os ucranianos reivindicam uma grande vitória que, a ser verdade o ataque de mísseis, é um feito notável para a tecnologia ucraniana e que, certamente, vai entusiasmar a resistência contra o invasor russo.
Fontes americanas não confirmaram a reivindicação ucraniana, afirmando apenas que houve uma “explosão significativa” no navio e que deu origem a um “incêndio significativo”. Os jornais americanos de referência usam as palavras afundamento, explosão e perda, para referir o que se passou, sem se referirem a qualquer acção ucraniana e sem grande destaque jornalístico, apesar de se tratar do mais relevante acto de guerra acontecido até agora.
Com ou sem a intervenção de mísseis, este episódio é uma grande vitória ucraniana e um dolorosa derrota russa. Curiosamente só o jornal Público e dois jornais italianos publicam a notícia com fotografia do navio em primeira página, mas o jornal português destaca-se por ser o único jornal que afirma que “ataque ucraniano afundou o Moskva”.
É caso para dizer que é mais papista do que o Papa.

quinta-feira, 14 de abril de 2022

Carlos Tavares: remunerações e prémios

Na sequência de um acordo de fusão 50:50 celebrado em Dezembro de 2019 entre a Peugeot (Grupo PSA) e o grupo Fiat Chrysler Automobiles NV, foi criado um novo grupo gigante do sector automóvel que adoptou o nome Stellantis e que iniciou a sua actividade em Janeiro de 2021, com o gestor português Carlos Tavares como CEO.
O grupo está registado e tem sede em Amesterdão, possui quase trezentos mil funcionários e reúne 14 marcas, entre as quais a Alfa Romeo, Citroën, Fiat, Jeep, Lancia, Maserati, Opel e Peugeot. Ontem, em assembleia geral, os accionistas do grupo rejeitaram a proposta de remunerações dos administradores, influenciados pela polémica que surgiu em França relativa aos valores pagos ou a pagar pela Stellantis a Carlos Tavares que, segundo o jornal Le Monde, terá recebido 66 milhões de euros de remunerações em 2021. Porém, de acordo com o relatório submetido aos accionistas, a remuneração de Carlos Tavares relativa a 2021 terá sido de 19.153.507 euros, dos quais apenas 1,99 milhões de euros correspondem à remuneração-base.
O valor de 66 milhões de euros que tem sido divulgado não constitui uma remuneração imediata, pois trata-se de acções atribuídas no âmbito do plano de incentivos de longo prazo, avaliadas em 32 milhões de euros, e outras remunerações em dinheiro que poderão ser recebidas a longo prazo. Portanto, o anúncio de 66 milhões de euros, não é verdadeiro, mas quer seja 19, quer seja 66, é uma coisa escandalosa em qualquer parte do mundo.
No entanto, num ano em que os lucros da Stellantis atingiram 13.354 milhões de euros, o grupo reconheceu “a excepcional capacidade de Mr. Tavares para transformar a Stellantis”, mas os valores do seu pacote salarial têm sido considerados “indecentes e revoltantes” e o assunto já entrou na disputa eleitoral em França, enquanto o jornal La Tribune lhe dedica a capa da sua edição de hoje.

terça-feira, 12 de abril de 2022

A imponência da Semana Santa em Málaga

A Espanha tem uma forte tradição religiosa e cultural em torno da Semana Santa, durante a qual se presta homenagem e devoção à Paixão de Jesus Cristo na última semana da Quaresma, que antecede a Páscoa. As inúmeras irmandades católicas espanholas organizam monumentais procissões de penitência pelas ruas de quase todas as cidades e vilas, sobretudo na Andaluzia e, em especial, nas cidades de Sevilha, Málaga, Granada e Jerez de la Frontera. 
Nessas procissões incorporam-se os pasos, que são semelhantes a carros alegóricos que suportam esculturas de santos ou cenas da Paixão de Cristo, que por vezes existem há séculos e são guardados durante o ano pelas irmandades. Alguns desses pasos ou tronos pesam mais de cinco toneladas e são carregados por mais de 250 membros da irmandade ou irmãos, que usam uma vestimenta especial que consiste de uma túnica ou manto, com ou sem capuz com ponta cónica, sendo acompanhados por bandas de música que executam marchas adequadas.
A Semana Santa de Málaga é celebrada desde há mais de cinco séculos e foi declarada em 1965 como Festival de Interesse Turístico Internacional, sendo famosa em toda a Espanha. Durante a Semana Santa Malaguenha as 42 irmandades existentes na cidade organizam 45 procissões pelas ruas da cidade e a imponência das cerimónias atrai milhões de visitantes, segundo informa um texto oficial.
A edição de hoje do jornal Sur, o mais conhecido diário malaguenho, dedica toda a sua primeira página à Procissão da Segunda-Feira Santa que se realizou ontem, na qual se pode observar a presença de milhares de pessoas.

segunda-feira, 11 de abril de 2022

A escolha dos franceses: Macron ou Le Pen

As eleições presidenciais francesas são um acontecimento político muito importante para a Europa, sobretudo no actual quadro de guerra que se vive no leste europeu e, por isso, são destacadas hoje no jornal Le Figaro, mas também pela imprensa mundial.
Na primeira volta que ontem se disputou, o candidato Emmanuel Macron obteve 28,3% dos votos e a candidata Marine Le Pen conseguiu 23,6%, pelo que irão de novo a votos no próximo dia 24 de Abril. Pelo caminho ficaram dez outros candidatos, com destaque para Jean-Luc Mélenchon que obteve 20,8% dos votos.
Significa que a França ficou com um quadro muito semelhante ao que teve nas anteriores eleições presidenciais de 2017, pois voltará a ter os mesmos candidatos na segunda volta. Nessas eleições, Macron obteve 24,01% na primeira volta realizada no dia 23 de Abril de 2017 e Le Pen ficou-se pelos 21,3% dos votos. Depois, na segunda volta realizada no dia 7 de Maio, Macron chegou aos 66,1% e Le Pen obteve apenas 33,9% dos votos.
Os comentadores especializados dizem que em 2022 não vai ser como em 2017, o que as sondagens também estão a confirmar, além de que o próprio Emmanuel Macron já declarou que “não nos enganemos, nada está decidido”.
A escolha dos franceses preocupa a Europa, pois parece que muitos tenderão a favorecer os candidatos que melhores garantias lhes ofereçam quanto à qualidade de vida, ao emprego e à melhoria do poder de compra, isto é, ao seu interesse pessoal imediato. Porém, numa altura em que o conflito ucraniano está na ordem do dia, os europeus esperam que o futuro presidente da França possa contribuir para a estabilidade e para o apaziguamento no leste europeu e que não atire mais gasolina para a fogueira.

domingo, 10 de abril de 2022

As vistas a Kiev dos líderes europeus

Quando, há muitos anos, assistia a disputas e confrontações violentas entre duas pessoas, sempre procurei separá-las sem cuidar de saber quem tinha razão e, por isso, quando hoje vejo as multidões de refugiados a abandonar a Ucrânia, a brutal destruição do património e os mortos espalhados pelas cidades, só penso no cessar-fogo, na arbitragem, nas negociações e, naturalmente, no fim de toda esta tragédia.
Há todas as versões possíveis sobre as causas próximas ou remotas deste conflito que já se transformou numa grande catástrofe mas, nesta fase, não interessará muito discuti-las na praça pública pois tendem a ser distorcidas por razões emocionais. Também não é suficiente dizer-se que a Rússia é o agressor e que a Ucrânia é o agredido porque, pelo menos desde 2014, se sucediam intermináveis escaramuças entre os dois países, ou seja, tudo isto já começou há vários anos. Esses são alguns dos assuntos para discutir à mesa das negociações, mas primeiro há que concretizar o cessar-fogo.
Porém, tem havido uma intensa campanha nos mass media internacionais e, de forma muito especial nas televisões portuguesas, não para procurar o cessar-fogo e a paz, mas sobretudo para acusar a Rússia e incriminá-la por crimes guerra. Volodymyr Zelensky tornou-se a principal figura desta guerra, pela sua coragem, persistência e capacidade de comunicação que usa com mestria, mas ao mesmo tempo que pede armas, afirma-se pronto para negociações. Porém, os seus aliados ocidentais gostam de o ouvir enquanto pede armas que lhe são prometidas e que objectivamente prolongam a guerra, mas nunca falam na necessidade de parar com a guerra.
A recente visita de Ursula von der Leyen a Kiev teve uma marca de solidariedade e de apoio humanitário que deve ser elogiada mas, pelo contrário, a visita de Boris Johnson que o jornal The Sunday Telegraph hoje destaca, foi um acto de propaganda pessoal e de instrumentalização da catástrofe ucraniana do primeiro-ministro britânico que, perigosamente, tende a intensificar ou mesmo a internacionalizar a guerra e nada contribui para a paz.

sábado, 9 de abril de 2022

A França e a incerteza das suas eleições

A edição de hoje do jornal Le Figaro dedica a sua primeira página às eleições presidenciais francesas que se realizam amanhã e escolheu como título “A França na hora da escolha”, enquanto ilustra a notícia com uma fotografia onde se podem ver os cartazes dos doze candidatos presidenciais que vão a votos. As últimas sondagens que se conhecem vieram aumentar a incerteza quanto aos resultados esperados, até porque há cada vez mais gente a desconfiar de sondagens.
O actual presidente Emmanuel Macron, que liderava destacado nas intenções de voto, vem perdendo espaço nas sondagens, enquanto Marine Le Pen se vem aproximando da linha da frente nas intenções de voto. Os últimos resultados apontam para 27% para Macron, 24% para Marine Le Pen, 17% para Jean-Luc Mélenchon e 9% para Eric Zemmour, o que no quadro das margens de erro destas sondagens significa a incerteza. No entanto, há sondagens que dão esses dois candidatos, do centro e da extrema-direita, separados apenas por 2%. 
Essa incerteza quanto ao vencedor da 1ª volta, não se coloca em relação aos candidatos que disputarão a 2ª volta no dia 24 de Abril, podendo afirmar-se com segurança que serão Macron e Le Pen. Significa, assim, que Macron e Le Pen irão retomar o combate que disputaram na 2ª volta das eleições presidenciais de 7 de Maio de 2017, quando Macron obteve 66% e Le Pen 33%. Agora, as sondagens apontam para um resultado favorável para Emmanuel Macron apenas com 52%, o que significa incerteza, mas também que, apesar dos seus cinco anos no Eliseu, não conquistou a popularidade nem a confiança dos franceses.
Quanto à importância destas eleições para a França, para a Europa e até para a paz no mundo, ninguém tem dúvidas.

quinta-feira, 7 de abril de 2022

Algumas hipocrisias da guerra na Ucrânia

Estamos a assistir diariamente a preocupantes sinais de um alastramento do conflito ucraniano a outras esferas que não apenas a específica área militar, com destaque para a esfera económica e para as sanções que têm sido impostas à Federação Russa por inúmeros países. Uma das sanções mais dolorosas para os russos, terá sido a Executive Order (O.E.) de 8 de Março, assinada por Joe Biden, em que é proibida aos americanos a importação de petróleo, gás natural e carvão russos, isto é, os Estados Unidos decretaram o embargo à importação de hidrocarbonetos ou energias fósseis russas.
Porém, é sabido como a globalização deu origem a uma enorme interdependência entre as economias e como os factores de produção se encontram muito dispersos, pelo que o processo produtivo se internacionalizou e mostra como todos são cada vez mais dependentes de todos. Por isso, todos os embargos têm um efeito bumerangue, pois afectam as duas partes do processo e nem todos se sujeitam aos diktats políticos.
Só assim se compreende a notícia que hoje é destacada pelo jornal financeiro francês La Tribune, em que revela que apesar do embargo, os Estados Unidos continuam a importar petróleo russo. A investigação baseou-se na consulta do portal marinetraffic.com, que regista os movimentos de navios petroleiros, bem como as datas e portos de partida e de chegada. Assim, o jornal verificou o registo de chegada a portos americanos de vários navios hasteando diferentes bandeiras, uns saídos de Krasnodar, no mar Negro, e outros de Ust-Luga, na região de São Petersburgo. O jornal diz ainda que “pelo menos sete petroleiros provenientes da Rússia, navegam actualmente para os Estados Unidos com petróleo russo, segundo os dados do portal marinetraffic.com”.
Segundo o jornal, estes fluxos mostram que apesar do embargo, os hidrocarbonetos russos continuam a chegar aos Estados Unidos e que se elevam a cerca de 148 mil barris diários. Para além da tragédia humana e da destruição, é realmente cada vez mais difícil perceber o que se está a passar no meio de tantas hipocrisias.

quarta-feira, 6 de abril de 2022

China is watching

Enquanto a incerteza e a guerra, mas também a tragédia humanitária e a brutal destruição das cidades continuam a dominar a situação na Ucrânia, a China observa. Esse é o teor de alguns conteúdos da imprensa internacional e é esse o título da mais recente edição da revista Newsweek, em cuja capa se vê Xi Jinping a espreitar.
Significa que o conflito da Ucrânia não é apenas uma disputa entre irmãos, geograficamente bem localizada no centro da Europa, mas que está a ser uma luta pela recomposição de poderes militares e económicos à escala planetária, na qual muita gente está interessada, tanto no ocidente, como do outro lado do mundo.
Há poucas semanas, as ambições repetidamente expressas pelos responsáveis chineses de anexar Taiwan pela força talvez tivessem muitos seguidores em Pequim, mas com os acontecimentos que estão a observar na Ucrânia, incluindo a corajosa postura dos seus líderes, a resistência popular da população, a solidariedade activa da NATO e a derrota russa na sua tentativa de dominar Kiev, a China está a ficar desencorajada de cumprir a promessa de capturar a ilha “rebelde” de Taiwan e os seus 24 milhões de habitantes. Noutra perspectiva, também a união que até agora se tem verificado em torno da NATO e os efeitos das sanções económicas impostas à Rússia, são motivos adicionais para dissuadir Xi Jinping e a sua equipa de tomar qualquer iniciativa no sentido do regresso forçado da ilha de Taiwan à grande China, onde a resistência ucraniana está a ser uma inspiração para a população de Taiwan.
No entanto, tudo está em movimento e a China observa.

segunda-feira, 4 de abril de 2022

Que venha o cessar-fogo e bem depressa!

Nas guerras modernas como aquela que está a devastar a Ucrânia, são decisivos os papéis desempenhados pela propaganda e pela contrainformação, não só para mobilizar as populações e os combatentes, mas também para agitar as opiniões públicas internacionais e para assegurar apoios políticos ou militares de governos estrangeiros.
Por isso, quando se está a cerca de 3.500 quilómetros de Kiev e sem a pressão emocional e directa da tragédia, é normal que haja muita desconfiança quanto às notícias que nos chegam, pois incluem distorções e mentiras que se repetem nas televisões e nas redes sociais, adquirindo por vezes o estatuto de notícias verdadeiras. Dessa forma, pouco sabemos sobre o que realmente se passa na Ucrânia, embora saibamos do drama dos refugiados, da enorme destruição nas cidades e da corajosa resistência popular ucraniana. Desconhecemos, também, se há envolvimento de forças estrangeiras nos combates, quais são e de quem são os avanços e os recuos e, ainda, qual é o real andamento das negociações para um cessar-fogo cada vez mais urgente.
Porém, a retirada russa dos arredores de Kiev veio permitir a divulgação de imagens captadas em Bucha, nos arredores da capital, em que se vêm centenas de cadáveres de civis, aparentemente executados pelas tropas russas. Essas imagens aparentam ser verdadeiras e estão a gerar grande indignação internacional, com o regime de Putin a ser acusado de genocídio. Há suspeitas de torturas e de massacres. Há fortes indícios de crimes de guerra a lembrar My Lai (1968), Wiriyamu (1972) e Srebenica (1995), mas também pode haver alguma encenação para incriminar os russos. A exigência de uma investigação independente que foi reivindicada pelas Nações Unidas é absolutamente necessária para conhecer a verdade.
Nas suas edições de hoje a imprensa internacional faz eco da horrível situação que foi encontrada em Bucha e o jornal francês Libération usa a palavra barbárie para a descrever. Quanto tempo irá decorrer até que saibamos a verdade sobre a trágica realidade encontrada em Bucha?

domingo, 3 de abril de 2022

Salgueiro Maia, o maior capitão de Abril

O jornal Público evoca na sua edição de hoje o 30º aniversário da morte de Fernando Salgueiro Maia, o capitão que no dia 25 de Abril de 1974 comandou a coluna de blindados que saiu de Santarém e se dirigiu para Lisboa. Na capital começou por ocupar o Terreiro do Paço onde resistiu às forças que se lhe opuseram e, ao fim da tarde, montou o cerco ao quartel do Carmo, forçando a rendição de Marcelo Caetano, o presidente do Conselho de Ministros. Com a sua enorme coragem e grande determinação, Salgueiro Maia deu o principal passo para o derrube da ditadura do Estado Novo e para a instauração da democracia, tornando-se muito justamente num dos maiores símbolos dessa data libertadora, a par de Otelo Saraiva de Carvalho e de outros militares.
Salgueiro Maia morreu em 1992 por doença, quando tinha 47 anos de idade. Apesar de lhe terem sido abertas todas as portas do poder, sempre recusou privilégios ou cargos confortáveis e bem remunerados com que o sistema costuma proteger os mais ambiciosos ou os menos escrupulosos. Essas circunstâncias tornaram-no um militar respeitado, tanto pelos seus companheiros, como pelos seus adversários. O povo compreendeu o seu destacado papel na mudança do regime político, bem como a sua coragem física e a sua generosidade cívica. O seu nome passou a fazer parte da toponímia das nossas cidades e vilas, inspirou criadores e autores, dando origem a manifestações culturais de toda a ordem, na literatura, na música, no cinema e na arte urbana. O filme Salgueiro Maia, o implicado que vai estrear brevemente, é um dos mais recentes tributos à memória do capitão que “nunca quis ser herói”.
Aqui lhe presto, também, a minha grata homenagem.

sábado, 2 de abril de 2022

A desejável neutralidade para a Ucrânia

A guerra da Ucrânia ocupa a informação portuguesa desde há mais de um mês, através da presença de muitos enviados especiais no terreno e de inúmeros comentadores e comentadoras nos estúdios, cujas notícias, opiniões e comentários são repetidos demasiadas vezes, como se fizessem parte de um programa de propaganda organizada.
Apesar disso, hoje sabe-se pouco sobre o que realmente se passa no terreno, embora possamos ver cenários de grande tragédia humana e de grande destruição patrimonial, que as televisões nos mostram durante horas e horas. O cessar-fogo já deveria ter acontecido, mas há quem não esteja interessado nele, apesar das negociações estarem a dar alguns bons passos, segundo tem sido divulgado, designadamente quanto a uma futura neutralidade ucraniana e à sua não integração na NATO.
A questão russo-ucraniana tornou-se um problema mundial. Na Eslováquia, um dos sete países que tem fronteiras com a Ucrânia e que é um pequeno país que pertence à União Europeia e à NATO, o jornal Denník N que se publica em Bratislava, deu hoje espaço de primeira página a um curioso cartoon com as cores ucranianas e com um guarda-chuva que protege o país dos bombardeamentos, russos ou outros, escrevendo Akú neutralitu by brali Ukrajinci que, em tradução feita pelo google significa, que neutralidade aceitariam os ucranianos. O cartoon é inteligente e insinua uma Ucrânia neutral, em que o guarda-chuva da neutralidade protege o país de todas bombas, venham elas de onde vierem.
Para além da questão da neutralidade ucraniana e da integração na União Europeia, há as questões mais complexas das autonomias ou das independências no Donbass, da ocupação russa da Crimeia, do estatuto da cidade autónoma de Sebastopol, dos acessos ucranianos ao mar Negro e da compatibilização no mesmo país de duas línguas, duas culturas e duas religiões, para além das feridas que irão persistir durante muito tempo na sociedade ucraniana em relação às suas próprias comunidades e à Rússia.
É mesmo um desafio muito difícil, mas não pode deixar de ser procurada uma rápida solução para a Ucrânia com a ajuda da comunidade internacional. A neutralidade como tem a Áustria ou a Finlândia pode ser uma solução.