quinta-feira, 28 de março de 2013

O regresso e a denúncia de uma narrativa

Ontem foi o dia do regresso televisivo do ex-primeiro ministro Pinto de Sousa e a RTP chamou-lhe “O fim do silêncio”, pois tinham decorrido cerca de dois anos desde que se ausentara do panorama político nacional. Nesse período, houve inúmeros valentões que tudo disseram contra ele, incluindo o nosso corajoso primeiro magistrado da nação. Sem contraditório. Até que foi convidado pela RTP para ser entrevistado. Aceitou, mas logo se levantaram algumas vozes fundamentalistas a condenar a iniciativa da RTP. Também apareceram petições públicas, umas a recusar a sua presença em qualquer programa da RTP (134.023 signatários) e outras a favor da sua presença (7.492 signatários). Era o início de uma estéril polémica. Depois, sucederam-se declarações de diferentes tons, por vezes na fronteira do fanatismo. No dia da entrevista, juntaram-se nas instalações da RTP duas manifestações, uma contra a presença do ex-primeiro-ministro que contou com menos de duas dezenas de pessoas e, uma outra, a favor dessa presença, com um número de manifestantes ligeiramente maior. A primeira levou uma simbólica factura de 78 mil milhões de euros, enquanto a segunda levou ramos de flores.
E veio a entrevista que permitiu a denúncia de uma narrativa que, até agora, circulava sem contraditório. O ex-primeiro ministro, que tem sido o bode expiatório de tudo o que de mal nos está a acontecer, teve a oportunidade de se defender e de esclarecer muita coisa. E esclareceu quase tudo. Com factos e com números. Com muita habilidade. Segundo o Diário de Notícias a entrevista foi um ajuste de contas com Cavaco Silva. Não sei se esta entrevista contribuiu ou não para alterar os pontos de vista dos 1.721.300 espectadores que a ela assistiram, pois "a cada um, a sua verdade". Porém, seguramente que a entrevista incomodou muita gente. Era um desafio difícil, mas Sócrates ultrapassou-o.

Os outros que aguentem!

O governo tem imposto um duro programa de austeridade aos portugueses, de que tem resultado uma sucessão de desgraças, tais como a recessão económica, o aumento da dívida pública e do défice orçamental, o empobrecimento, a deterioração do tecido empresarial, e, ainda, a incerteza e a falta de confiança quanto ao futuro. Mais do que aquilo que mostram as estatísticas, somos confrontados com a recessiva realidade que se depara aos nossos olhos. A austeridade tem implicado um brutal aumento do desemprego e uma substancial perda de rendimentos dos trabalhadores e dos pensionistas. Porém, a austeridade não é para todos. Perante o programa de privatizações inscrito no Memorando de Entendimento assinado com a troika e de outras anunciadas privatizações de iniciativa governamental como a RTP e os CTT, o governo decidiu contratar o economista António Borges como consultor para esta área. Porém, o professor e antigo vice-presidente do PSD decidiu “esconder-se” atrás da sua empresa de consultoria e “sacar” ao Estado a quantia de 300 mil euros anuais mais IVA, acrescidos do reembolso de despesas “indispensáveis para a concretização do trabalho e previamente autorizadas, designadamente no caso de viagens ao estrangeiro, as quais deverão ser documentadas e respeitar as normas aplicáveis ao sector público”. É sempre a mesma coisa: “rapar o tacho” todo e escapar ao fisco. São estes os amigos da nação. Eles. Os outros que aguentem! Como não lhe basta a exorbitância que o Estado lhe paga e a isenção de impostos de que beneficia por ser funcionário do FMI, no ano passado o economista Borges recebeu 50 mil euros pelo seu cargo de administrador não executivo do grupo Jerónimo Martins. Os outros que aguentem! Há gente cuja arrogância e ambição não tem limites. São muito pequeninos. Vulgares.