sexta-feira, 16 de maio de 2014

Muitos Fernandes nas eleições indianas

O complexo processo eleitoral indiano já terminou e os resultados conhecidos garantem uma vitória esmagadora ao Bharatiya Janata Party (BJP) e ao seu candidato Narendra Modi, que deverá ser brevemente empossado como o novo primeiro-ministro da Índia, num quadro de grande preocupação das populações muçulmana e cristã, não só pelo ideário do BJP mas também pelo passado fundamentalista de Modi. A edição de hoje do Deccan Chronicle já anuncia a vitória de Modi e a mudança. Com a expressiva derrota do Partido do Congresso e do seu candidato Rahul Gandhi, parece terminar o longo domínio da política indiana pela dinastia Nehru-Gandhi e, como tem sido declarado pelos nacionalistas hindus, este resultado eleitoral significa o "começo de uma nova era" que o mundo deseja não ser de confrontação armada com o Paquistão.
No contexto do processo eleitoral, uma empresa de Hyderabad - a Modak Analytics – produziu um gigantesco trabalho de análise das eleições, dos 814 milhões de eleitores, 28 Estados e 7 Union Territories, 12 línguas oficiais e 930 mil assembleias de voto para eleger 543 deputados (MP ou Members of the Parliament). Esse trabalho foi divulgado por diversos jornais indianos e foi reconhecido como um importante instrumento de análise política e sociológica, além de revelar muitas curiosidades eleitorais, algumas das quais estão na edição online do jornal The Hindu. Assim, ficamos a saber que só no Estado de Uttar Pradesh estavam recenseados cerca de 12 milhões de eleitores com o apelido Ram, o que significou “o aparecimento de um Ram em cada 11 eleitores”. No Estado de Maharashtra havia 1141 mil eleitores cujo primeiro nome é Shankar e 2384 mil eleitores com o apelido Patil. No Bihar estavam recenseadas 327 mil mulheres cujo primeiro nome é Sita e outras tantas registadas como Geeta. No Gujarat havia 300 mil mulheres cujo primeiro nome é Gita Ben e entre os 1.057.499 eleitores recenseados em Goa havia 81 mil com o apelido Fernandes, isto é, cerca de 7,2% dos eleitores. Uma verdadeira curiosidade a revelar a herança cultural lusa.

terça-feira, 13 de maio de 2014

A sopa dos pobres está nas ruas de Lisboa

Ontem pelas 20:00 horas, no Largo dos Caminhos de Ferro em Lisboa, em frente da Estação de Santa Apolónia e ao lado do Museu Militar, uma fila com cerca de três dezenas de pessoas esperava a sua vez para receber uma refeição, que alguns jovens distribuiam. Foi uma impressionante cena que fotografei, reveladora da quase tragédia social a que nos conduziram as políticas que têm sido impostas pela troika e que os nossos governantes têm escrupulosamente cumprido sem qualquer sensibilidade social. Não era gente sem abrigo. Era gente com fome. Era a sopa dos pobres nas ruas de Lisboa.
Quando há menos de um mês, durante a sessão evocativa dos 40 anos do 25 de Abril que se realizou na Fundação Gulbenkian, o ex-presidente Ramalho Eanes disse que “a unidade [nacional] não se mantém com este nível de desemprego, de miséria e de portugueses com fome, que é uma coisa que nos ofende e que não deveríamos permitir", até poderia ter havido quem pensasse tratar-se de uma figura de retórica. Mas ontem, em frente da Estação de Santa Apolónia e ao lado do Museu Militar, estava ali à vista o retrato de uma realidade de que os jornais e os jornalistas não falam, exactamente no mesmo local onde há poucos dias tinham atracado os grandes navios de cruzeiro internacionais e tinham desembarcado milhares de turistas endinheirados, para gáudio dos que só pensam “nas nossas exportações”. Tudo isto nos ofende, tudo isto nos envergonha. No mesmo dia há uma sumptuosa comitiva presidencial que se passeia pela China a esbanjar o dinheiro dos nossos impostos e da nossa desgraça social, enquanto está anunciada uma reunião magna da troika em Portugal que, sobre os destroços da batalha que conduziu, vem celebrar a sua vitoriosa campanha de empobrecimento nacional e vergar-nos à sua arrogância com a nossa submissão. Apesar deste quadro de desolação está a decorrer uma gigantesca campanha de propaganda a enaltecer os méritos de uma governação que é responsável pela cena que ontem fotografei em frente da Estação de Santa Apolónia e ao lado do Museu Militar.

domingo, 11 de maio de 2014

O mundo à volta de Angola

Com muitos milhares de quilómetros quadrados de superfície, os seus 20 milhões de habitantes e as suas riquezas naturais, a República de Angola é um grande país que, por razões históricas e culturais, está presente no imaginário e nos afectos de todos os portugueses. Não deixa de ser singular que os cidadãos de um país que é o mais antigo país da Europa e que pertence à União Europeia, estejam emocionalmente mais próximos de Angola do que da generalidade dos seus parceiros comunitários.
A relação estabelecida entre Portugal e Angola iniciou-se em finais do século XV, prolongou-se por quase cinco séculos e resistiu ao colonialismo e à guerra colonial. Depois, com a independência angolana e a guerra civil que se lhe seguiu, a relação luso-angolana passou por algumas dificuldade mas resistiu e, uma dúzia de anos depois da guerra, assistimos à afirmação da República de Angola como uma importante potência regional onde trabalham milhares de portugueses e que está a atrair as atenções dos grandes interesses internacionais.
Na sua última edição, o semanário Nova Gazeta que é distribuído gratuitamente em Angola, destaca exactamente essa realidade com o título “o mundo à volta de Angola” e diz:
“É inédito na história recente angolana: em apenas uma semana, José Eduardo dos Santos esteve em França e no Vaticano e recebeu o secretário de Estado norte-americano, o líder chinês e o antigo presidente brasileiro. Só faltaram a Alemanha e a Rússia, no naipe dos mais poderosos. Angola ganha peso na geopolítica internacional”.
É, naturalmente, uma boa notícia para Angola, mas também para os amigos de Angola e dos angolanos.

sábado, 10 de maio de 2014

O Gabinete das Maravilhas

Está patente em Lisboa nas instalações do Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT) uma exposição intitulada “O Gabinete das Maravilhas: atlas e códices dos melhores arquivos e bibliotecas do mundo”, que reúne reproduções de algumas obras-mestras da cartografia portuguesa da época da expansão marítima e alguns dos tesouros bibliográficos mais relevantes do património histórico europeu do período compreendido entre os séculos VIII e XVI. Entre as três dezenas de obras incluídas na exposição, destacam-se especialmente algumas das jóias da cartografia portuguesa e universal: o Atlas Miller de 1519 (Bibliothèque Nationale de France), o Atlas Vallard de 1547 (The Huntington Library, San Marino, EUA), o Atlas Universal de Diogo Homem de 1565 (Biblioteca Nacional da Rússia) e o Atlas Universal de Fernão Vaz Dourado de 1571, que é o único destes atlas que se conserva em Portugal no ANTT.
A editora M. Moleiro reproduz essas obras como quase-originais, isto é, com total fidelidade e de uma forma onde se torna imperceptível a fronteira entre o original e a sua reprodução e o Atlas Universal de Fernão Vaz Dourado é a estrela da exposição. Além disso, a exposição apresenta outras reproduções “magníficas” de manuscritos iluminados de grande relevância no panorama do património histórico europeu de entre os séculos VIII e XVI, incluindo códices, livros de horas, livros de medicina e diversos tratados que “nos indicam o caminho para a felicidade”. A exposição foi inaugurada no dia 29 de Abril e poderá ser visitada até ao dia 21 de Junho. Para os profissionais e para os curiosos da História e da História da Cartografia, esta exposição é imperdível.
 

A diplomacia lusa e o gosto pelo turismo

A Presidência da República anunciou que, entre os dias 13 e 18 de Maio, o nosso Presidente vai realizar uma visita de Estado à República Popular da China e à Região Administrativa Especial de Macau, tendo havido uma fonte oficial que classificou essa deslocação como "uma das mais importantes de sempre em todo o seu mandato, pelo alcance político, económico, cultural e académico de que se reveste". De acordo com o comunicado que foi divulgado no site da Presidência, a visita tem um conteúdo político e diplomático, mas também incluirá fortes componentes económica, cultural e académica. É certo que as viagens presidenciais poderão ser uma necessidade da nossa diplomacia, se estiverem integradas numa estratégia nacional (que ninguém conhece), mas há estudos académicos que concluem que estas viagens não produzem resultados satisfatórios.
A comitiva é sumptuosa, como deve ser nos tempos de abundância e euforia por que passamos. Lá vão os assessores e os mais próximos do Presidente, mais alguns governantes, com o irrevogável a fazer mais uma passeata e talvez a inaugurar mais um ginásio. Lá vai mais uma delegação parlamentar e uma comitiva empresarial com mais de uma centena de empresários de áreas tão diversas como a banca, advocacia, farmacêuticas, imobiliário, turismo, vinhos, agro-alimentar, arquitectos, além de representantes de várias associações de jovens empresários. Lá vão os institucionais do costume. Lá vai Cátia Guerreiro, a fadista favorita da família Cavaco Silva e das gentes de Boliqueime, com lugar cativo nestas viagens. E muitos, muitos jornalistas, para que a sumptuosidade desta embaixada tenha o devido registo histórico. 
Depois de 4 séculos em Macau, ainda haverá quem precise de alguém para lhes abrir as portas da China? Claro que não. Toda a gente sabe isso. Por isso, estas grandes comitivas são um insulto aos nossos sacrifícios, uma exibição de novo-riquismo serôdio e um esbanjamento de dinheiros públicos. Como sempre acontece, a comitiva presidencial tem demasiada gente e, com frequência, repete os mesmos protagonistas. É muita gente a fazer turismo à custa dos dinheiros públicos. É tudo “à grande e à francesa” ou é “a mania das grandezas”! Devem precisar de um A380 para levar tanta gente, mas ao menos divulguem a lista nominal da comitiva e revelem quanto vai custar tudo isto que é pago com os nossos impostos. Depois queixam-se de serem apupados...

quinta-feira, 8 de maio de 2014

A construção naval espanhola reanima-se

Os jornais galegos anunciaram hoje com grande destaque que os estaleiros públicos Navantia, na cidade de Ferrol, vão construir um buque de acción marítima (BAM) que representa um investimento de 200 milhões de euros e que essa encomenda garantirá cerca de 500 postos de trabalho durante um período de 30 meses. A notícia informa que nos estaleiros da Navantia situados na Bahía de Cadiz será construído um navio idêntico, pelo mesmo preço e com o mesmo impacto no emprego. A importância destas encomendas é enorme para a economia de duas das mais debilitadas regiões da Espanha – Galiza e Andaluzia – pois irá ter uma grande repercussão no emprego directo daquelas regiões autónomas, mas também nas suas indústrias a montante. No entanto, a oposição espanhola veio lamentar que o governo de Mariano Rajoy tivesse anunciado estas decisões de investimento em vésperas das eleições europeias, o que para ela significa uma lamentável cedência ao eleitoralismo.
O BAM é um navio modular que desloca 2500 toneladas e tem 93,9 metros de comprimento, resultando de um projecto desenvolvido pela Navantia e pela Armada espanhola, que pode ser adaptado a diferentes propósitos – navio polivalente, navio de operações contra o tráfico, navio hidro e oceanográfico, navio de busca e salvamento, etc. Os dois navios que vão ser construídos serão semelhantes aos que recentemente estiveram nas águas da Somália para proteger os atuneiros espanhóis, têm uma guarnição de 35 elementos, são altamente automatizados, possuem plataforma para um helicóptero e podem adicionalmente embarcar 110 elementos.
Aqui em Portugal, como algumas vezes salientamos, não se aproveitaram as potencialidades da nossa indústria naval para satisfazer as necessidades de um país que possui a maior Zona Económica Exclusiva da União Europeia e, entre outras medidas lesivas da nossa economia, foram encerrados e vendidos ao desbarato os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, uma obra feita por um advogado que, sem saber porquê, é Ministro da Defesa.

quarta-feira, 7 de maio de 2014

Copa 2014: os 23 eleitos do Brasil

Aproxima-se a data do início do 20º Campeonato do Mundo de Futebol ou Copa do Mundo que se disputará no Brasil a partir do dia 12 de Junho e cada uma das 32 selecções participantes começa a anunciar os nomes dos futebolistas que as irão integrar. Trata-se, sobretudo, de um processo técnico que visa escolher os melhores jogadores de cada país para formar a melhor equipa, mas é também um processo de gestão de expectativas para jogadores, empresários e dirigentes que se promovem e valorizam naquela montra mundial do futebol, para além de ser também uma escolha emocional de maior ou menor agrado dos adeptos, dos patrocinadores e de outros agentes desportivos. É uma equação muito complexa e com muitas variáveis.
Hoje foi divulgada a lista dos 23 futebolistas escolhidos por Luis Felipe Scolari para representar o Brasil e esse anúncio era esperado com muita expectativa, havendo jornais que lhe dedicaram a totalidade da sua primeira página nas suas edições matutinas. Assim aconteceu com o Correio Braziliense.
O homem que entre 2003 e 2008 foi responsável pela selecção portuguesa e que a colocou definitivamente no topo do futebol mundial, tinha pela frente a exigente tarefa de escolher 23 atletas entre as muitas centenas de bons futebolistas brasileiros em actividade por todo o mundo, tendo ido buscar os seus jogadores a 9 países – Inglaterra (6), Brasil (4), Espanha e Itália (3). França e Alemanha (2), Rússia, Ucrânia e Canadá (1). Apesar de nenhum dos eleitos de Scolari jogar em Portugal, há três deles que são bem conhecidos dos adeptos portugueses – Hulk, David Luiz e Ramires. Assim, para além de muitas outras razões emocionais, os portugueses irão torcer pelo Brasil. Até à final? Seria bem interessante...

A saída limpa e a submissão nacional

No passado domingo o primeiro-ministro anunciou a saída do programa de assistência financeira (PAEF) sem “recorrer a qualquer programa cautelar” e garantindo que essa solução tinha o apoio dos parceiros europeus, exactamente os mesmos que durante três anos alinharam numa continuada humilhação aos portugueses e não revelaram qualquer tipo de solidariedade. A saída limpa do PAEF foi tão boa, quanto a entrada no mesmo PAEF tinha sido má. Quer na entrada, quer na saída estiveram exactamente os mesmos protagonistas. Valeu a pena?, perguntaria Fernando Pessoa.
O governo alinhou-se em pose apropriada para ouvir o nosso primeiro. O foguetório das hostes governamentais foi enorme. A independência nacional foi recuperada. O 1640 de Portas concretizou-se. Por essa Europa fora toda a gente fez declarações – o amigo Barroso e o Olli Rehn, a Madame Lagarde, os mercados, o Jeroen Dijsselbloem, o candidato Martin Schulz, o reformado Jean-Claude Trichet, vários comissários europeus, o homem da OCDE e muito mais gente. Até o homem de Belém se esqueceu que há um mês defendia outra solução e entrou nestes verdadeiros jogos florais. É que temos eleições à porta e, por isso, até o descontrolado Rangel rejubilou. Porém, há gente mais comedida e, sabe-se agora através do Expresso, que o BCE resistiu à saída limpa pois tem muitas dúvidas sobre a situação de Portugal, afirmando que ela foi motivada por razões políticas. Também a OCDE  veio avisar que a escolha do governo por uma saída sem recurso a um programa cautelar é arriscada. A imprensa europeia não deu importância ao tema, salvo o Financial Times que, na sua primeira página, lhe dedicou uma breve referência de 25 palavras com o título “Portugal’s clean exit”.
No meio de todo este foguetório de propaganda, durante a inauguração de um museu dedicado aos Descobrimentos, o nosso primeiro veio dizer que Portugal “vai mostrar ao mundo que não precisa de tutela externa”. Ora aí está! Uma descoberta, no Museu das Descobertas, a revelar que quase chegamos ao grau zero da submissão.

terça-feira, 6 de maio de 2014

O porto de Lisboa renasce e está no topo

O porto de Lisboa recebeu hoje seis navios de cruzeiro com 13 mil turistas a bordo e com cerca de cinco cinco mil tripulantes, perfazendo um total de 18 mil visitantes, o que tornou o dia de hoje como o melhor de sempre da sua história em termos de recepção de navios de cruzeiro. É realmente um dia ímpar para um dos mais belos portos do mundo e e para uma cidade que cada vez mais tem estreitado a sua ligação ao estuário do Tejo.
Lisboa tornou-se o quarto porto do mundo a receber em simultâneo os três grandes navios de cruzeiro mais emblemáticos da frota britânica da Cunard Line – o RMS Queen Elizabeth 2 (1969), o RMS Queen Mary 2 (2004) e o MS Queen Victoria (2007). É a quarta vez na história que as “Três Rainhas” do operador inglês se juntam no mesmo porto, sendo Lisboa o terceiro a recebê-las em simultâneo, depois de esse facto já ter acontecido em Southampton e Nova Iorque. Além dos três navios da Cunard Line, o porto de Lisboa também recebeu hoje o Rotterdam, o Silver Whisper e o Ruby Princess.
Um estudo realizado em 2013 pelo Observatório de Turismo de Lisboa em parceria com a Administração do Porto de Lisboa traçou o perfil do passageiro de cruzeiro com escala em Lisboa, concluindo que cada um deles “efectua uma despesa diária de 97,40 euros”, um montante em que estão incluídas despesas em alimentação, alojamento, compras diversas, deslocações na cidade e visitas a monumentos e museus. Dessa forma, estima-se que só nos consumos dos passageiros o dia de hoje possa ter rendido cerca de 1,4 milhões de euros à cidade de Lisboa o que, em tempos de crise, é um importante acontecimento a justificar os investimentos de modernização que têm sido feitos na orla ribeirinha do porto de onde sairam “as naus que descobriram o mundo”.

Um presidente que é uma enorme tristeza

Podia e devia ser o presidente de todos os portugueses, mas não é capaz. É uma tristeza. Uma enorme tristeza.
Lembramo-nos da noite da sua reeleição em Janeiro de 2013 quando espumou críticas contra os seus adversários eleitorais ao afirmar que foi “a vitória da verdade sobre a calúnia”. Agora vêmo-lo a atacar aqueles que legitimamente previam a inevitabilidade de um segundo resgate como aconteceu na Grécia ou os que defendiam que a saída do PAEF devia ser apoiada por um programa cautelar. Porém, ele também defendeu um programa cautelar há pouco mais de um mês quando, no prefácio dos seus Roteiros VIII, escreveu:
Em termos gerais, para um país que conclua com sucesso um programa de assistência financeira, é possível que um programa cautelar seja preferível a uma saída dita à irlandesa. Ficando inteiramente à mercê da volatilidade e das contingências típicas dos mercados, um país pode incorrer em custos de regressão elevados, sobretudo se as principais forças políticas não revelarem uma firme convicção no sentido de garantir, de forma concertada e a médio prazo, uma trajetória de sustentabilidade das finanças públicas e a prossecução de uma política de reformas para a melhoria da competitividade das empresas”.
Nesse mesmo texto, ele também escreveu que ”é uma ilusão pensar que as exigências de rigor orçamental irão desaparecer em meados de 2014” e  que “o país continuará sujeito a uma supervisão reforçada por parte da Comissão Europeia e a avaliações regulares do cumprimento das medidas acordadas...”. Então isto é que é a saída limpa de que fala o governo e que Belém apoia tão entusiasticamente?
Como todos sabemos, estas matérias não são ciência exacta. São muitos os prós e os contras de cada opção e a decisão tem sempre um elevado grau de incerteza. Só o tempo dirá se foi esta a melhor solução. Eu quero crer que sim. Então, porque razão foi ele espumar outra vez, agora no Facebook, contra os que tiveram opinião diferente daquela que o governo adoptou e que ainda os desafia com a pergunta “o que dizem agora?” Ele não consegue ultrapassar os seus medos nem a sua própria periferia. É uma tristeza termos alguém na presidência que não sabe o que é o consenso nacional. Basta!
 

sábado, 3 de maio de 2014

Mentiras e trapalhadas da nossa troika

A lusa troika
Há duas semanas, perante a aproximação do final do programa de assistência económica e financeira (PAEF), a generalidade dos nossos.governantes "passou-se" e garantiu que os impostos não seriam aumentados e, alguns deles, até admitiram que o IRS pudesse baixar. Essa garantia foi assegurada pelos componentes da lusa troika, isto é, os ministros Passos, Portas e Madame Albuquerque, a contabilista que sucedeu a Gaspar. Pressionados pela proximidade das eleições e pela desproporção entre os sacrifícios impostos à generalidade da população e os resultados catastróficos que foram obtidos, esses governantes não se pouparam em declarações de propaganda e garantiram que não seriam pedidos mais sacrifícios aos portugueses, porque o PAEF tinha sido um sucesso. Mentiram, sabiam que estavam a mentir e agora estão a desconsiderar-nos e a tratar-nos como uns parvos, ao negar que vão subir os impostos e que preparam mais medidas de austeridade.
As 84 páginas do Documento de Estratégia Orçamental (DEO) que entretanto apresentaram, são de uma confrangedora pobreza e prevêem o aumento do IVA e da TSU, além de outros impostos e sacrifícios. Sempre a mesma receita contabilística de aumentar impostos, enquanto o corte das gorduras do Estado continua por fazer. A reforma do Estado não foi feita porque não há coragem para combater os interesses corporativos instalados no aparelho de Estado e porque continua a faltar a coragem para acabar com os boys e as girls que, vindos das estruturas partidárias, enxameiam a administração pública central, regional e local. Foram três anos de empobrecimento, de endividamento, de emigração, de maior desigualdade, de descrença e de bloqueio, mas de muitos assessores, muitas viagens e muitos Audis. Ajustamento, ainda não sei se foi, mas regabofe foi com certeza. Não foram apenas os programas eleitorais e as promessas não cumpridas. Ninguém sabe o que agora aí vem. A desconfiança é absoluta, até porque a incerteza nas perspectivas económicas mundiais é alta, como aliás salienta o DEO. A crítica a esta trapalhada é quase unânime.
Uma política de verdade deveria reconhecer que a maioria dos objectivos do PAEF falharam e deveria prevenir os cidadãos de que a austeridade terá que continuar, porque três anos de sacrifício e humilhação nada resolveram. Para que os portugueses soubessem e ajuizassem.
Porém, eles insistem na mentira que desacredita a democracia e os políticos, além de minar a confiança dos portugueses. Estou curioso por saber o que vai acontecer no dia 25 de Maio.

A guerra civil já começou na Ucrânia

Nos últimos dias a Ucrânia tem assistido a um aumento da tensão e da confrontação entre os apoiantes do regime instalado em Kiev que tem o apoio ocidental e os separatistas pró-russos, sobretudo nas regiões do sul e do leste do país. A imprensa ocidental trata este tema com profundidade, noticiando os acontecimentos e afirmando uma vez mais que a Ucrânia está à beira da guerra civil. Enquanto as autoridades que tomaram o poder nas ruas de Kiev defendem a unidade da Ucrânia e a ligação ao ocidente, os separatistas pró-russos reivindicam a criação de um estado federal, ou a independência, ou a sua integração na Rússia em termos semelhantes ao que sucedeu na Crimeia. Os acordos de Genebra, que foi negociado em Abril entre a Rússia, a Ucrânia, os Estados Unidos e a União Europeia, previam que as milícias pró-russas abandonassem os edifícios que ocuparam, mas estas recusaram-se a fazê-lo por não terem sido consultadas. Nessas condições, as autoridades de Kiev decidiram impor a ordem e avançaram com tropas sobre as cidades ocupadas. Os russos exigem que as tropas ucranianas retirem, mas os ucranianos exigem que os russos retirem o seu apoio às milícias.
Odessa e Slaviansk são duas cidades onde os separatistas ocuparam ruas e edifícios que nesta altura escapam ao controlo das autoridades ucranianas. Nessas circunstâncias, os confrontos são inevitáveis e ontem traduziram-se em cerca de quatro dezenas de mortos, havendo também a registar o abate de dois helicópteros militares ucranianos, empenhados nas operações de restabelecimento da ordem, o que pressupõe a posse de armamento apropriado fornecido pelos russos. Os esforços diplomáticos já realizados e as sanções económicas já decretadas contra a Rússia não produziram resultados no terreno e, nessas condições, a guerra civil parece que já começou. A dúvida agora está em saber como irá ser - mais ou menos musculada, mais ou menos prolongada - a intervenção da Rússia de Vladimir Putin.  

quinta-feira, 1 de maio de 2014

O insólito na política brasileira

Todos sabemos como a política é perversa e que, um pouco por todo o mundo, acontecem casos escandalosos em que as mais elementares regras democráticas são violadas por gente corrupta e sem escrúpulos.
Porém, o insólito aconteceu agora no Brasil, quando um grupo de três dezenas de pessoas foi pago para aplaudir os discursos de alguns deputados e, como destaca a edição de hoje do Correio Braziliense, esse grupo “foi flagrado a receber dinheiro nos corredores do 10º andar do Anexo IV da Câmara dos Deputados”, poucos minutos depois da aprovação de um texto que altera a lei dos caminhoneiros”. Foi trabalho feito, trabalho pago!  Durante a sessão essas pessoas ocuparam as galerias da Câmara dos Deputados para aplaudir cada um dos deputados que apoiou o texto relativo ao aumento da jornada de trabalho para os motoristas. Logo que a sessão terminou, essas pessoas dirigiram-se para o Anexo IV e, nas proximidades do gabinete de Nelson Marquezelli, um deputado federal pelo Partido Trabalhista Brasileiro-São Paulo (PTB-SP) que cumpre actualmente o seu sexto mandato, receberam notas de 50 e de 20 reais pelos serviços prestados, numa cena que foi filmada por alguns jornalistas e divulgada em vários jornais digitais. Foi realmente um caso insólito!
Aqui em Portugal também as galerias do Parlamento são muitas vezes ocupadas por cidadãos que não aplaudem mas que protestam contra a violação dos seus direitos constitucionais ou contra as políticas governamentais. A presidência do Parlamento tem instruído as autoridades policiais para intervirem e para reprimirem esses protestos, talvez porque ainda não se lembrou de contratar claques para aplaudir as discursatas pró-governamentais muitas vezes mentirosas e, dessa forma, abafar os protestos.

terça-feira, 29 de abril de 2014

O futebol indiano não existe só em Goa

Bengaluru FC, campeão indiano de futebol
O cricket é o desporto-rei da Índia, mas o interesse pelo futebol tem aumentado muito nos últimos anos, com mais equipas, mais jogadores e mais entusiasmo.
Foi na época de 1996-97 que se começou a disputar um campeonato nacional baptizado como Indian National Football League (NFL) que na época de 2007-2008 se tornou na actual I-League e que, nos seus dois formatos, já teve 18 edições. No passado domingo terminou a edição de 2013-2014 da I-League com o triunfo do Bengaluru Football Club, um clube de Bangalore, que é a capital do Estado de Karnataka. Curiosamente, o clube foi fundado há menos de um ano (20 de Julho de 2013) mas foi logo campeão, o que mostra que o poder do dinheiro também já chegou ao futebol indiano. No plantel do novo campeão estão integrados os futebolistas Keegan Pereira, Bruno Colaço, Ricardo Cardoso e Darren Caldeira, cujos apelidos mostram ser originários de Goa.
Goa é o mais pequeno dos 28 Estados da Índia mas é exactamente aquele em que o futebol desperta mais paixões, sendo esse facto apontado muitas vezes como uma herança cultural portuguesa. Nenhum outro Estado indiano tem tantas equipas na I-League e as equipas goesas triunfaram em 9 dos 18 campeonatos disputados até agora: Dempo SC (5 vezes), Churchill Brothers SC e Salgaocar SC (2 vezes cada um). Depois de terem vencido os últimos 7 campeonatos, na época que agora terminou as equipas de Goa classificaram-se, respectivamente, em 3º lugar (Salgaocar SC), 4º lugar (Dempo SC), 5º lugar (Sporting Club de Goa) e 11º lugar (Churchill Brothers SC).
É um bom resultado, mas não é costume que as equipas goesas fiquem ausentes dos dois primeiros lugares da I-League.
 

segunda-feira, 28 de abril de 2014

O porta-aviões da recuperação económica

O irrevogável ministro Portas tem sido um paladino da promoção das nossas exportações, desdobrando-se em viagens por todo o mundo, acompanhado por empresários, muitos amigos e alguns jornalistas. Tem sido um verdadeiro globetrotter lusitano e um frequent flyer ao serviço da nação. Um Fernão Mendes Pinto! Um homem das Arábias! Nas suas frequentes aparições televisivas, primeiro como Ministro dos Negócios Estrangeiros e depois como vice-Primeiro Ministro, exibe sempre um ar triunfalista e de auto-convencimento sobre o sucesso das suas missões e dos méritos daquilo a que ele chama “as nossas empresas”.
Há cerca de dois meses, no final de uma visita ao salão internacional do sector alimentar e bebidas, o irrevogável ministro brindou às exportações e declarou aos jornalistas que "as exportações estão a ser o porta-aviões da recuperação económica no nosso país". Porém, um estudo publicado esta semana no Boletim Económico do Banco de Portugal (Bdp) alerta para as exportações porque têm agora uma maior componente importada, isto é, o peso percentual das importações em cada bem ou serviço exportado tem aumentado e, por exemplo, no caso dos combustíveis a componente importada representa 82% do seu valor de exportação. Além disso, o estudo mostra que mais de 30% das exportações portuguesas estão sobrevalorizadas e que os maiores exportadores portugueses contribuem bem menos do que se pensa para o aumento do produto nacional. Assim, o contributo das exportações para o crescimento do PIB não é um valor absoluto e tem sempre que ser deduzido da sua componente importada. Significa, portanto, que há algumas exportações que são boas e outras que são menos boas. Há que distingui-las, porque se o crescimento da economia for feito apenas pela via das exportações faz aumentar as importações e o desequilíbrio externo, o que parece já estar a acontecer. O irrevogável ministro tem utilizado as exportações com ligeireza e como arma de promoção pessoal, mas a imprensa foi clara ao escrever que o “Banco de Portugal denuncia farsa nas exportações”.