domingo, 4 de outubro de 2020

Chissano e a guerra em Cabo Delgado

Por razões históricas, muitos portugueses conheceram a orla costeira da província moçambicana de Cabo Delgado desde o início do século XVI, quando as naus da carreira da Índia escalavam ou invernavam na ilha de Moçambique, tendo-se estendido até 1975, quando a República Popular de Moçambique se tornou independente. Por isso, por razões históricas e emocionais, o que se passa em Cabo Delgado interessa a muitos portugueses que por lá passaram, como é o nosso caso.  A região é muito rica em recursos naturais e tem abundantes reservas de gás natural, mas está pouco desenvolvida, enquanto uma parte da sua população é fortemente islamizada. A cidade de Maputo, que é a capital, encontra-se a quase dois mil quilómetros e a população tem dificuldade em apoiar um poder político tão distante e tão ausente, para além de sentir que o seu empenhamento na luta armada de libertação nacional continua a não ser reconhecido. Por tudo isso parece haver muito descontentamento em Cabo Delgado. 
Em Outubro de 2017 grupos armados não identificados atacaram a vila costeira de Mocímboa da Praia, registando-se desde então um crescente número de assaltos a povoações que já causaram mais de um milhar de mortos e que levou a que mais de cem mil pessoas abandonassem as suas aldeias e procurassem refúgio em áreas mais seguras. As forças de defesa moçambicana e, eventualmente, grupos de mercenários contratados pelo governo não têm tido sucesso e a situação parece agravar-se. Trata-se de uma insurreição ou de uma guerra? Que apoios nacionais ou internacionais têm os insurgentes? Será uma tentativa para criar um estado islâmico no norte de Moçambique? Que relação tem esta guerra com a exploração do gás natural? 
É neste contexto que, numa sábia entrevista ao jornal O País, o antigo presidente moçambicano Joaquim Chissano veio dizer que “é preciso aprofundar as causas da guerra em Cabo Delgado”. Exactamente.