segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Da costa do Malabar ao Estado de Kerala

Na sua edição de ontem, o diário The Washington Post, provavelmente o mais influente jornal americano, decidiu evocar na sua primeira página a passagem do centenário da Revolução de Outubro, com uma fotografia de Lenine e uma alargada reportagem intitulada “One of the few places where a communist can still dream”. Esse lugar é o Estado de Kerala, situado na costa ocidental da península do Industão e que é um dos 28 estados da União Indiana. Tem cerca de 36 mil quilómetros quadrados de superfície, cerca de 35 milhões de habitantes e a sua capital é a cidade de Trivandrum, um porto do mar Arábico situado no extremo sul do seu território.
O Estado de Kerala não foi constituído em 1947 aquando da independência da Índia e, tal como em muitas regiões do subcontinente indiano, só veio a ser formado mais tarde. A criação do estado e as primeiras eleições aconteceram em 1956 e o vencedor foi o Communist Party of India que formou o governo, considerado o primeiro governo comunista eleito livremente no mundo. Desde então, a coligação liderada por aquele partido tem alternado o poder com a coligação liderada pelo Indian National Congress, tendo sido desenvolvidos com sucesso muitos programas de desenvolvimento social ao longo dos anos. O resultado foi a transformação de Kerala no melhor exemplo indiano do progresso, tendo todos os seus indicadores económicos e sociais acima da média indiana, assim sucedendo com o mais elevado Índice de Desenvolvimento Humano, a mais elevada esperança de vida, a maior taxa de alfabetização, a menor taxa de mortalidade infantil e a melhor saúde pública. Além disso, é considerado pela Transparência Internacional como o “estado menos corrupto da Índia”, que é um dos países mais corruptos do mundo.
A orla costeira do Estado de Kerala é a costa do Malabar, onde há menos de quatro séculos existiam as fortalezas ou feitorias portuguesas de Cananor (Kannur), Calicute (Kozhikode), Cranganor (Kodungallur), Cochim (Kochi) e Coulão (Kollam), entre outras. Quem percorra aquela região não tem dificuldade em notar alguns traços de influência cultural portuguesa, porque alguma coisa por lá ficou, nomeadamente na língua, no património religioso e militar, nas práticas religiosas e até nos apelidos adoptados, pois nas listas telefónicas da região não faltam os almedas, os costas, os souzas, os pereras e outros nomes que nos são comuns.