sexta-feira, 25 de maio de 2018

A futebolização do nosso quotidiano

O futebol é uma arte e eu gosto muito desse espectáculo artístico, isto é, daquilo que se passa “dentro das quatro linhas”, onde me regalo a ver as fintas do Messi, os remates do Ronaldo ou das defesas do Casillas.
Porém, os interesses não artísticos do futebol invadiram a nossa sociedade e essa invasão é preocupante por ser um símbolo de mediocridade cultural e de retrocesso civilizacional, até porque a futebolização é particularmente activa na política e nos mass media.
A política está cada vez mais futebolizada e os pequenos políticos que querem subir nos aparelhos partidários não largam o futebol e fazem tudo o que consta na check-list do adepto, isto é, usam cachecóis, gritam, oferecem jantares aos presidentes dos clubes, sentam-se nos camarotes dos estádios e fazem-se comentadores futebolísticos. Estão em toda a parte e, muitas vezes, com absoluta falta de bom senso. Por este andar, a Assembleia da República ainda acaba por substituir os actuais grupos parlamentares  por novos grupos parlamentares em representação do Benfica, do Sporting, do Porto e de outros clubes.
Os mass media e, em especial as televisões, estão completamente futebolizados e contratam dezenas de comentadores que passam horas a fio a dizer o mesmo sobre o mundo que envolve o futebol, as contratações, as lesões, os treinos e os humores dos jogadores, mais os penaltis e os árbitros, os cartões e as agressões. É um massacre constante, a que não faltam gritos, insultos e ameaças de agressão.
Agora apareceu essa figura menor, essa espécie de Nicolas Maduro do futebol português e, sem que se perceba porquê, temos as televisões a dar horas e horas do seu tempo de antena a esta criatura menor e aos inúmeros comentadores que se atropelam à entrada das estações televisivas, muitos deles sem a menor noção do ridículo. Uma tristeza e uma lástima.

A corrupção que fez tremer a Espanha

A Audiência Nacional, que é um tribunal com jurisdição sobre todo o território e a principal instância penal espanhola, condenou ontem 29 dos 37 acusados no processo Gürtel a 351 anos de prisão. A Espanha naturalmente tremeu e muitos espanhóis ficaram em estado de choque, mas muitos outros também ficaram aliviados.
O caso Gürtel refere-se a uma rede de corrupção política ligada ao Partido Popular (PP) que era encabeçada pelo empresário Francisco Correa Sánchez, uma figura da alta sociedade de Madrid, tendo sido baptizado como Gürtel, a tradução alemã de Correa, talvez porque quando as coisas foram detectadas Francisco Correa tinha um estatuto de intocável e ninguém queria associar o seu nome a este caso.
A investigação foi iniciada em finais de 2007 e só agora houve sentença. Apurou-se que, durante muitos anos, nos municípios e comunidades autónomas governados pelo PP, eram adjudicados inúmeros serviços a empresas ligadas a Francisco Correa, a troco de subornos e presentes de elevado valor. Os lucros assim obtidos eram canalizados para contas secretas e paraísos fiscais às ordens do PP. Francisco Correa foi considerado o cabecilha deste caso e foi condenado a 51 anos de prisão, enquanto Luis Bárcenas, o ex-tesoureiro do partido, foi condenado a 33 anos de prisão e ao pagamento de uma multa superior a 44 milhões de euros, tendo a sua mulher, Rosalia Iglesias, sido condenada a uma pena de 15 anos de prisão. Ao todo, houve 29 condenações com 351 anos de cadeia. Uma bomba em Espanha!
Como hoje refere o El País, o PP foi condenado e a credibilidade de Mariano Rajoy, o líder do PP, está de rastos. Aproxima-se, portanto, mais uma crise política em Espanha, a juntar às que já por lá viviam.
Não sabemos se este caso teve ou não teve contágio em Portugal, mas ninguém tem dúvidas que muitas adjudicações por aí feitas ao longo dos anos, beneficiaram os amigos de todas as cores, por vezes escandalosamente.