sábado, 19 de fevereiro de 2022

As milícias digitais como arma política

O Brasil parece estar sob a crescente influência das milícias digitais, uma expressão que se vem impondo na cobertura mediática para definir aqueles que actuam organizadamente nas redes sociais e em aplicações de troca de mensagens com o objectivo de influenciar resultados políticos, através da mentira, da difamação, da violência e da intimidação. Porém, as chamadas milícias digitais não são um exclusivo brasileiro, estiveram activas sob as ordens de Donald Trump e a sua acção é bem evidente nos nossos dias, como se vê na manipulação da opinião pública internacional a respeito do conflito na Ucrânia.
No que respeita à milícia digital bolsonarista, segundo revela a última edição da revista IstoÉ, trata-se de uma organização criminosa que é comandada por gente da confiança de Jair Bolsonaro e que difunde mentiras sob a forma de fake news para atacar a reputação dos seus adversários políticos, estando agrupada no chamado gabinete do ódio, instalado no terceiro andar do palácio do Planalto a poucos metros do gabinete do presidente Jair Bolsonaro. A Polícia Federal brasileira estará a investigar esta grave situação de ataque à democracia, que terá começado a manifestar-se durante a campanha eleitoral que em 2018 levou Bolsonaro à presidência, com 55% dos votos e com vitória em 16 dos 27 estados brasileiros.
O gabinete do ódio dispõe de diversos núcleos operacionais e é dirigido pelo senador Flávio Bolsonaro e pelo vereador Carlos Bolsonaro, filhos de Jair Bolsonaro. O seu principal objectivo é o ataque ao ex-presidente Lula da Silva, que tem sido alvo de mentiras, calúnias e notícias distorcidas, não só para o difamar, mas também para encobrir a gestão bolsonarista que levou o Brasil ao retrocesso económico e social.
O facto é que quem assiste diariamente aos noticiários televisivos portugueses, não tem dificuldade em constatar que, também por cá, existem milícias semelhantes às milícias digitais bolsonaristas.

A tempestade Eunice e uma bela fotografia

A passagem da tempestade Eunice pelo noroeste europeu traduziu-se em algumas mortes e muitas destruições em vários países, devido aos ventos que chegaram a atingir quase 200 quilómetros por hora, às chuvas torrenciais, à forte agitação marítima e às ondas gigantes que afectaram a sua orla costeira. As Ilhas Britânicas, devido aos seus condicionalismos geográficos, foram severamente afectadas e o jornal Daily Express classificou a tempestade como “the storm of the century”, enquanto um jornal espanhol escrevia que foi “la peor tormenta en décadas y causa el caos en Europa”. Na ilha de Wight, a sul de Southampton, pode ter sido registada a rajada de vento mais violenta alguma vez registada na Inglaterra: 196 quilómetros por hora. Mais de 400 mil pessoas ficaram sem electricidade na área de Londres e a cobertura da O2 Arena, a maior sala de espectáculos da capital britânica, foi levada pelo vento. Muitas árvores caíram, os aeroportos foram encerrados e milhões de pessoas foram aconselhadas a ficar em casa.
Na sua edição de hoje o jornal The Guardian também destaca a Eunice como a pior tempestade acontecida em décadas na Inglaterra e publica uma espectacular fotografia captada em Porthcawl, nas proximidades da cidade de Cardiff, em South Wales, a mostrar que apesar das destruições causadas pela tempestade, é possível captar fotografias excepcionais.

Ucrania: la guerra ci fa vergognare tutti

O jornal L’Osservatore Romano, que é a voz do Vaticano e do Papa, destaca na sua última edição a fotografia de um tanque e a frase “la guerra ci fa vergognare tutti”, isto é, a guerra que nos envergonha a todos. É verdade, esta guerra envergonha-nos a todos. Os falcões ocidentais com um tal Stoltenberg à cabeça, bem como aqueles que não os denunciam, parecem estar ávidos de uma guerra que significa tragédia e morte, destruição de património e lucro para as indústrias do armamento. As suas centrais de propaganda e os seus agentes querem ressuscitar a guerra fria e todos os dias anunciam a concentração de mais soldados russos nas fronteiras e a iminência de uma invasão do território ucraniano, apontando mesmo o seu modus faciendi. Há poucos meses assistimos à forma como esse exemplo de democrata que é Donald Trump insultou a unidade europeia e, agora, são exactamente os mesmos americanos que nos falam da unidade do Ocidente para fazer frente às tropas do ditador Vladimir Putin, como se os interesses americanos e europeus, ou das várias europas, fossem convergentes.
Aqui em Portugal é inquietante assistir ao desfilar televisivo de inúmeros pseudo-especialistas em geopolítica e em estratégia militar que, desonestamente, têm feito passar na opinião pública a ideia de que os russos são maus e que os americanos são bons, mas também que a Europa tem que alinhar ao lado do aventureirismo americano, tal como já fez no Iraque, na Síria e no Afeganistão, numa cruzada sem sentido e sem glória.
A compreensão do que se passa obriga-nos a conhecer a História e a ver com atenção o mapa da Europa. O Velho Continente não pode ser condenado a ser um mero peão americano neste complexo xadrez e compete-lhe ser a voz da diplomacia, da moderação e do apaziguamento, neste conflito de rivalidades e de interesses estratégicos que se vem desenvolvendo na Ucrânia e que nos envergonha a todos.