sábado, 29 de julho de 2023

Os lucros da banca são uma obscenidade

A imprensa portuguesa dá hoje grande destaque à banca e aos seus resultados do 1º semestre de 2023, com o Diário de Notícias a anunciar que os cinco maiores bancos a operar em Portugal - CGD, Millennium BCP, Novo Banco, Santander e BPI – tiveram um resultado líquido consolidado de 1,9 mil milhões de euros nos primeiros seis meses do ano, o que significa que desde Janeiro e até Junho, lucraram cerca de 11 milhões de euros por dia, o que, comparando com o igual período de 2022, reflecte uma melhoria de quase 60%. A banca costuma exibir-se com indicadores incompreensíveis para as pessoas comuns. Sempre foi assim, como nos lembramos dos tempos negros de Ricardo Salgado, Oliveira e Costa, Jardim Gonçalves ou João Rendeiro, parecendo agora que os tempos da euforia regressaram, como se vê por esta obscena apresentação de um lucro de cerca de 11 milhões de euros por dia.
Estes números nem sequer demonstram capacidade de gestão ou um papel relevante no apoio à economia produtiva, mas apenas uma enorme falta de escrúpulos da banca, pois resultam do agravamento das prestações pagas aos bancos pelos seus clientes, sobretudo através da armadilha do crédito à habitação, conjugada com a ridícula remuneração que a banca paga às poupanças dos depositantes. Daí que os seus lucros obscenos resultem, essencialmente, da diferença obtida entre os juros cobrados nos empréstimos e os juros pagos nos depósitos, mas também da habilidade recente de cobrar mensalmente uma verba pela manutenção das contas dos depositantes, que tem todas as características de um serviço não prestado e não ser mais do que um assalto ao bolso dos depositantes. Recordo aqui o Poemarma de Manuel Alegre, escrito em 1964:

    Que o poema assalte esta desordem ordenada
    que chegue ao banco e grite: abaixo a pança!

Há dias, o Presidente da República pediu à banca “um esforçozinho” para pagar melhor os depósitos, mas a correcção desta imoral situação não se faz dessa maneira.

sexta-feira, 28 de julho de 2023

ONU: era of global boiling has arrived

António Guterres, o secretário-geral das Nações Unidas, discursou ontem em Nova Iorque na sede da organização e, baseando-se nos dados mais recentes divulgados pela União Europeia e pela Organização Meteorológica Mundial, segundo os quais o corrente mês de Julho se observam as mais elevadas temperaturas de que há registo, afirmou que a “era of global boiling has arrived”.
O discurso de Guterres teve pouco destaque na imprensa internacional, talvez porque ela esteja muito comprometida com os poderes poluidores. Uma das excepções foi o jornal canadiano Toronto Star que destacou essa frase na sua edição de hoje, embora António Guterres tenha dito que “a era do aquecimento global acabou; a era da ebulição global chegou”.
Disse ainda Guterres que “para vastas partes da América do Norte, Ásia, África e Europa, o Verão está a ser cruel”, acrescentando que, “para todo o planeta, é um desastre”. As vagas de calor que estão a afectar diversos países por todo o mundo são causadas pelas alterações climáticas e, embora o fenómeno tenha sido previsto desde há muito tempo, “o ritmo da mudança é devastador”. As altas temperaturas e o calor escaldante estão a tornar-se o novo normal, provocando inundações, secas, tempestades e incêndios florestais. As evidências desta desordem climática são observáveis em toda a parte e a opinião é unânime, ao responsabilizar o homem e a sua ganância por esta destruição, mas segundo salientou Guterres, “isso não pode gerar o desespero, mas antes deve inspirar acção”.
Foi mais um duro aviso das Nações Unidas, pela voz respeitada de António Guterres.

quinta-feira, 27 de julho de 2023

O Redondo e o regresso das Ruas Floridas

As ruas e o povo da vila alentejana do Redondo vão festejar mais uma vez as Ruas Floridas, isto é, a ornamentação de 24 ruas da vila com flores, figuras e outros motivos em papel colorido, que constituem um belíssimo espectáculo da cultura popular alentejana. Milhares de visitantes correrão para o Redondo desde o dia 29 de Julho (sábado) até ao dia 6 de Agosto (domingo) para assistir a uma festa, repartida por oito dias, que é considerada uma das mais importantes manifestações culturais do Alentejo. Em paralelo com o deslumbramento das ruas floridas, está sempre a qualidade e a autenticidade da gastronomia alentejana, que é apresentada por mais de duas dezenas de restaurantes.
As ruas são ornamentadas e os temas apresentados por cada rua são escolhidos pelos seus moradores, que são verdadeiros artistas populares e que, na maioria dos casos, participam num trabalho voluntário de criatividade e imaginação desde o início do ano, na produção das flores e dos outros elementos decorativos que abrangem os mais variados temas, mas que são mantidos em segredo até ao dia da apresentação do programa da festa. Muitas centenas de moradores participam na preparação desta grande festa popular em que são utilizadas algumas toneladas de papel, de cartão e de madeira para que as Ruas Floridas sejam uma verdadeira atracção.
Os registos escritos mais antigos indicam que a ornamentação das ruas do Redondo remontam a 1838, mas a sua periodicidade bienal só acontece desde 1998. Porém, devido à pandemia do covid-19, as festas de 2021 não se realizaram, regressando agora com redobrado entusiasmo.
A entrada é livre e, permitimo-nos deixar aqui uma recomendação: se nunca viu as Ruas Floridas, não perca esta oportunidade.

quarta-feira, 26 de julho de 2023

Um trágico inferno na Grécia e na Itália

A orla europeia do mar Mediterrâneo tem estado debaixo de uma intensa vaga de calor, sobretudo na Grácia e na Itália. Trata-se, sem dúvida, de mais um efeito das alterações climáticas por que está a passar o nosso planeta.
Na Grécia mais vinte mil pessoas foram retiradas da ilha de Rodes, devido a um gigantesco incêndio que lavra há mais de uma semana, mas há outros incêndios que lavram por todo o território grego. No caso da Itália sucedem, em simultâneo, duas ocorrências meteorológicas de características opostas, pois enquanto no Norte há inundações, tornados e granizo gigante, no Sul o calor é abrasador e os incêndios têm sido devastadores. Ambos já causaram vítimas e o jornal La Stampa, que se publica em Turim, destaca na sua edição de hoje o título Inferno Italia. O governo italiano anunciou que vai declarar o estado de emergência em várias regiões que têm sido mais afectadas por tempestades e incêndios, tendo pedido à Comissão Europeia o reforço da frota de aviões que já tinham sido enviados por Bruxelas para combater os incêndios.
Tudo isto acontece como se fosse uma situação imprevista, o que é lamentável. É caso para ficarmos muito preocupados com o que andam a fazer os líderes europeus que tantas vezes se reúnem e que não têm soluções para este grave problema ambiental, hoje na Grécia e na Itália, mas amanhã em Portugal.

França no negócio mundial do armamento

“Histórico e inédito”, são as duas palavras com que a revista francesa La Tribune classifica a notícia destacada na sua edição de hoje, na qual informa que a França exportou 27 mil milhões de euros em 2022, o montante máximo de sempre das suas exportações de armamento. Segundo a notícia, foram as vendas de aviões Rafale, sobretudo para os Emirados Árabes Unidos (EAU), que impulsionaram as exportações francesas em 2022, mas a Grécia, a Indonésia, a Polónia e Singapura estão entre os seus principais clientes. Era sabido que a Dassault Aviation conseguira ganhar a batalha comercial do Golfo ao vender o seu Rafale à Arábia Saudita e ao Qatar. Agora com a encomenda dos EAU, o Rafale bate comercialmente os americanos F-15 e os britânicos Tornado.
De acordo com o Instituto Internacional de Estudos para a Paz de Estocolmo (SIPRI), os maiores exportadores de armas do mundo são os Estados Unidos (38,6%), a Rússia (18,6%) e a França (10,7%), enquanto os maiores fabricantes mundiais são os grupos americanos Lockheed Martin, Boeing, Northrop Grumman, Raytheon e a General Dynamics. Os produtos que dominam o mercado mundial do armamento são os aviões de combate da última geração, os helicópteros, os mísseis e os sistemas antimísseis, mas também outros sistemas de armas. Estes negócios alimentam as economias dos países exportadores, mas a concorrência parece não ter regras, como se viu na reviravolta australiana relativamente aos submarinos franceses, ou nos recentes e festivos acolhimentos feitos a Narendra Modi, o primeiro-ministro da Índia, em Washington e Paris.
Naturalmente, as guerras que abalam o mundo não poderão deixar de ser vistas, também, à luz destes negócios.

terça-feira, 25 de julho de 2023

As lições a aprender da política espanhola

Por razões de proximidade geográfica e cultural, quase tudo o que acontece em Espanha interessa aos portugueses e, portanto, as eleições gerais do passado domingo foram seguidas com muita atenção.
Havia 37,4 milhões de espanhóis para ir às urnas e as previsões apontavam para uma folgada vitória do PP de Alberto Feijóo e a derrota do PSOE de Pedro Sánchez, mas os resultados foram bem diferentes dos números apontados pelas sondagens, pois o PP teve 33,1% dos votos, enquanto o PSOE conseguiu 31,7%. Pouca diferença. Assim, o PP venceu e conseguiu 136 deputados, seguido pelo PSOE com 122, pelo Vox de Santiago Abascal com 33 e pelo Sumar de Yolanda Diaz com 31. Com estes resultados, a formação do novo governo espanhol torna-se muito difícil, pois nem o bloco da direita, nem o bloco da esquerda conseguiram a maioria de 176 dos 350 deputados. A solução poderá estar nos restantes 28 deputados eleitos pelos movimentos independentistas ou pelos interesses locais, como a ERC, Junts, EH Bildu, PNV, BNG e CCA.
Tanto Feijóo como Sánchez vão procurar negociar as alianças e os compromissos que permitam obter os 176 votos necessários à sua investidura pelo Congresso dos Deputados, como hoje anunciam o elPeriódico de Aragón e outros jornais espanhóis. Em política tudo é possível, mas parece muito provável que os espanhóis terão que ir novamente às urnas para resolver este imbróglio, ou esta hipótese de ingovernabilidade.
Entretanto, é bom que por na faixa mais ocidental da península Ibérica se aprenda alguma coisa com o que se passa com nuestros hermanos.

segunda-feira, 24 de julho de 2023

Vingegaard festejou a vitória no Tour

Terminou a 110ª edição do Tour de France, uma das mais populares e mais duras provas do desporto internacional, com a televisão a mostrar como alguns milhões de pessoas aplaudiram os ciclistas nas estradas francesas com um entusiasmo indescritível.
Enquanto somatório de muitas etapas de alta montanha, a prova é também um somatório de desafios e de maratonas que, durante três semanas, muito exigem das capacidades físicas e emocionais dos atletas que, nesta edição, percorreram 4.405 quilómetros. A prova deste ano não decepcionou os adeptos do ciclismo e todos assistimos a grandes lutas protagonizadas por dois dos mais famosos ciclistas da actualidade, com o dinamarquês Jonas Vingegaard a superiorizar-se ao esloveno Tajed Pogacar, um resultado que hoje é destacado na edição do jornal espanhol Marca.
Partiram 176 ciclistas de Bilbau, mas apenas 150 chegaram a Paris, entre os quais dois portugueses: Nélson Oliveira da espanhola Movistar classificou-se no 53º lugar da classificação final e Rui Costa da belga ICW, que já foi campeão mundial, ficou-se pela 67ª posição. Merecem o nosso aplauso pois chegaram ao fim e ambos na primeira metade da classificação geral. 
Para o ano há mais, mas Jonas Vingegaard já veio declarar que espera ganhar cinco Tours, o que significa que ainda quer ganhar mais três vezes. O problema vai ser Tajed Pogacar e, quem sabe, se também o nosso João Almeida, que este ano se classificou em 3º lugar no Giro d'Italia.

sábado, 22 de julho de 2023

Quando o regresso de um navio é notícia

O navio-escola espanhol Juan Sebastián de Elcano regressou à sua base de Cádiz depois de ter completado o seu XCV Crucero de Instrucción, em que esteve ausente durante 189 dias e em que visitou onze portos de sete países (Brasil, Argentina, Chile, Perú, Colombia, Costa Rica e Estados Unidos).
O quase centenário navio que já efectuou onze viagens de circumnavegação, foi construído exactamente em Cádiz e nesta viagem cruzou pela primeira vez o mítico cabo Horn, no extremo meridional da América do Sul. No seu historial consta que é “o terceiro maior veleiro do mundo”, que navegou mais de um milhão e oitocentas e cinquenta mil milhas por todos os mares do globo, tendo visitado 205 portos de 73 diferentes países. Naturalmente, os portos mais visitados pelo navio foram Cádiz, onde tem a sua base, o porto galego de Marín que é a sede da Escuela Naval Militar de Espanha, os portos das ilhas Canárias por serem o ponto de partida para as travessias atlânticas e, nas duas margens do oceano, os portos de Lisboa e de Nova Iorque.
O Juan Sebastián de Elcano é um verdadeiro ex-libris do município de Cádiz e o seu regresso é notícia. Por isso, o jornal La Voz de Cádiz destaca na sua edição de hoje o regresso do navio-escola espanhol a Cádiz, com uma fotografia do navio a entrar na grande baía gaditana que ocupa toda a primeira página e com a frase “El embajador de España y de Cádiz regresa a su casa”. Este destaque mostra bem como os jornais espanhóis tratam o seu navio-escola e estimulam a autoestima nacional, o que é bem diferente do que fazem os jornais portugueses que, segundo creio, nunca fizeram notícia nem manchete do regresso a Lisboa do nosso belíssimo navio-escola Sagres.

quinta-feira, 20 de julho de 2023

Ondas de calor que sufocam meio mundo

Uma onda de calor tem perturbado meio mundo e, em especial, o sul da Europa, onde têm sido anunciados recordes históricos de temperatura que afectaram a vida das populações e obrigaram a medidas de emergência. Nos últimos dias, a Espanha, a Itália e a Grécia têm estado a suportar temperaturas muito elevadas com máximos acima dos 40 graus, que já estão a ser consideradas como normais e não como excepção. Na Espanha, conforme anuncia hoje o jornal Málaga Hoy, o dia de ontem foi um dia negro em termos de calor com os termómetros a registarem 44,1 graus. Na ilha Sardenha foram atingidos 48 graus e a cidade grega de Atenas “está cercada” por incêndios, que têm obrigado a evacuações de populações e a restrições às movimentações turísticas.
Os recordes de temperatura também foram atingidos nos Estados Unidos, onde no californiano Vale da Morte, um dos lugares mais quentes do planeta, foram registadas temperaturas superiores a 52 graus no passado domingo. Da mesma forma, também na China e no Japão têm sido registadas temperaturas acima dos 40 graus e a Organização Meteorológica Mundial das Nações Unidas já anunciou que os actuais fenómenos de calor intenso “vão continuar a intensificar-se e o mundo deve preparar-se para ondas de calor mais intensas”. Hoje ninguém tem dúvidas de que o aumento das temperaturas que está a afectar grande parte do planeta é o resultado directo do aquecimento global e das alterações climáticas, mas os dirigentes mais poderosos do mundo continuam a parecer indiferentes a este problema, sobre o qual muito fala António Guterres e poucos mais.

segunda-feira, 17 de julho de 2023

Com Favaios não há desmaios

A Publicidade é uma técnica de comunicação que codifica ideias e as transmite para o espaço público, para influenciar o comportamento das pessoas, levando-as a adquirir um bem ou um serviço, a adoptar uma determinada opinião ou a escolher o candidato a quem deve dar o seu voto. 
Tal como o Jornalismo, a Publicidade também obedece a regras de conduta ética e deve inspirar-se na verdade, embora estas actividades nem sempre cumpram essas regras, sobretudo em ambientes mediáticos do tipo “vale tudo”.
No complexo mundo da comunicação, a codificação de mensagens publicitárias é uma arte em que a imaginação é essencial para que os receptores distingam, reconheçam e adoptem certas mensagens e rejeitem outras mensagens de concorrentes ou de adversários. No quadro de intoxicação publicitária em que vivem as sociedades contemporâneas, a Publicidade por vezes distingue-se como uma expressão de inteligência e de oportunidade. Assim aconteceu um dia destes.
O Supremo Magistrado da Nação estava na Costa da Caparica, sentiu-se mal disposto e desmaiou, tendo sido transportado de urgência numa ambulância dos Bombeiros da Trafaria para o Hospital de Santa Cruz, em Carnaxide. Era um problema simples, recuperou rapidamente e, no seu habitual estilo de não estar calado, tratou de informar os jornalistas que desmaiou porque… “tomei o moscatel quente”.  
Nestas circunstâncias, a Adega de Favaios que produz o Moscatel do Douro, semelhante ao Moscatel que incomodou o Supremo Magistrado da Nação, veio dizer que “com Favaios não há desmaios”.
Isto é que é Publicidade inteligente e, provavelmente, eficaz.

O brilho de Carlos Alcaraz em Wimbledon

O tenista espanhol Carlos Alcaraz venceu ontem o Torneio de Wimbledon e, aos 20 anos de idade, chegou ao topo da fama e do proveito no circuito mundial do ténis, ao arrecadar nada menos do que 2,3 milhões de libras, o que equivale a cerca de 2,7 milhões de euros. Hoje a sua fotografia ilustra a primeira página de inúmeros jornais internacionais, não só pelo prestígio daquele torneio, mas também porque derrotou ao fim de quatro horas e meia o campeão Novak Djokovic, o homem que obteve mais vitórias até hoje nos torneios do Grande Slam e que há dez anos não perdia em Wimbledon.
Apesar de Espanha estar em campanha eleitoral, a imprensa espanhola esqueceu tudo o mais para se deslumbrar com a proeza de “El Rey Carlitos” e para anunciar o início da “era Alcaraz”. Talvez se justifique este deslumbramento espanhol, porque uma parte do prestígio internacional de Espanha também resulta das proezas dos seus tenistas e havia alguma preocupação pela “queda” do fenomenal Rafael Nadal que, durante mais de uma dezena de anos, deu muitas alegrias aos desportistas espanhóis.
É caso para dizer: rei morto, rei posto.
Para os espanhóis, Rafael Nadal já é um passado glorioso, enquanto Alcaraz passou a ser a garantia de um futuro de alegrias desportivas para nuestros hermanos.

sábado, 15 de julho de 2023

Tragédias marítimas e sinais dos tempos

Quase todos os dias, a imprensa publica notícias relatando grandes tragédias marítimas com perda de muitas vidas, que ocorrem sobretudo nas travessias do Mediterrâneo e na rota canária, em que milhares de pessoas originárias da África, do Médio Oriente e da Ásia fogem da pobreza, da fome e da guerra, procurando trabalho e uma vida melhor na União Europeia. Embarcam em frágeis e inseguras  embarcações, superlotadas e dirigidas por poderosos traficantes. 
No passado mês de Junho, uma embarcação que saíra da Líbia com cerca de 750 migrantes naufragou nas costas gregas, tendo sido apenas encontrados 104 sobreviventes e recuperados 81 corpos, o que foi classificado por uma comissária europeia como “a pior tragédia de sempre no Mediterrâneo”. As instituições comunitárias têm procurado fazer alguma coisa, mas não tem havido consensos e o Pacto de Migração e Asilo da União Europeia tem sido muito criticado, parecendo que os milhares de pessoas que já morreram no Mediterrâneo e nas Canárias são “um preço aceitável” no quadro da política europeia de importação da mão de obra de que necessita o velho Continente. “Esta é uma mancha que irá ficar durante muito tempo na história e na memória da Europa”, disse um deputado português.
Ontem o jornal Diario de Avisos, que se publica em Tenerife, deu notícia de uma canoa que, tendo partido do Sernegal com rumo às ilhas Canárias, esteve à deriva durante 18 dias e na nela ocorreram “al menos 20 muertos”, mas o jornal também refere que se desconhece o paradeiro de três canoas com cerca de 300 pessoas a bordo que “llevan más de 15 dias a la deriva intentando llegar a Canarias”.
São sinais dos tempos, a mostrar o declínio da Europa e a mediocridade dos seus líderes, pois a União Europeia não tem sido capaz de encontrar uma solução humanitariamente digna para as migrações do sul e, demasiadas vezes, parece muito desnorteada com o seu posicionamento geopolítico, não atendendo a este problema, nem às mudanças que se estão a verificar no seu tecido social, como mostraram os recentes distúrbios em França.
“Deixas criar às portas o inimigo, por ires buscar outro de tão longe”, foi o aviso que, pela palavra do velho do Restelo, Luís Camões deixou ao rei de Portugal. Se fosse hoje, o que diria o poeta aos líderes europeus, sobretudo à Ursula, ao Olaf, ao Emmanuel e até ao António?

sexta-feira, 14 de julho de 2023

A lição que nos vem do Tour de France

Hoje celebra-se o 14 Juillet, a Festa Nacional de França, em que se evoca a tomada da Bastilha, que em 1789 constituiu um passo decisivo no arranque da Revolução Francesa. Os franceses festejam este feriado nacional com festas populares e paradas militares por todo o país mas, também, com uma das mais importantes etapas da 110ª edição do Tour de France. Os ciclistas disputam hoje a 13ª etapa iniciando o “assalto” aos Alpes e, no final da etapa, terão que subir os 17 quilómetros do Gran Colombier, a famosa montanha da cordilheira do Jura.
O dinamarquês Jonas Vingegaard e o esloveno Tajed Pogacar têm justificado o favoritismo que lhes era atribuído desde o primeiro dia da prova e ocupam os dois primeiros lugares da tabela classificativa, mas hoje vão entrar na fase final da luta pela vitória. A rivalidade entre ambos é enorme e há grandes interesses comerciais em volta das camisolas que vestem. Porém, como destaca a fotografia que hoje é publicada na edição do jornal La Dépêche du Midi, os dois ciclistas são amigos, são colegas de profissão, têm fair-play e grande desportivismo. Hoje irão medir forças e suscitar o entusiasmo dos milhares de pessoas que os acompanharão na estrada e dos milhões que os irão ver pela televisão, mas eles saberão estar à altura da sua rivalidade e dos interesses que profissionalmente defendem. É uma bela lição que dão ao mundo, numa altura em que no leste da Ucrânia se agudiza a guerra e em que a lógica belicista e os interesses que lhe estão associados se acentuam. 
É uma pena que a paz na Ucrânia não dependa de Vingegaard e de Pogacar, pois eles saberiam lutar pelos seus interesses com determinação e coragem, à mesa das negociações como na estrada, mas certamente em clima de paz e de concórdia.

segunda-feira, 10 de julho de 2023

A monção na Índia: chuva, muita chuva

A edição de hoje do jornal The Pioneer, que se publica em Nova Delhi, destaca que a fúria da monção (monsoon) devastou o norte da Índia e que, entre sábado e domingo, a capital indiana suportou um forte período de chuvas e registou 153 milímetros de pluviosidade, batendo um recorde de 41 anos, o que parece ser mais um exemplo das alterações climáticas que vão perturbando a estabilidade do nosso planeta.
A monção é um fenómeno meteorológico caracterizado por vento forte que ocorre em várias regiões asiáticas confinantes com os oceanos Índico e Pacífico e que resulta do desigual aquecimento da terra e do mar. O diferencial térmico entre o mar e a terra nessas regiões tropicais e subtropicais provoca ventos que, no caso da monção de Verão da Índia que ocorre de Junho a Setembro, sopram do mar para a terra e transportam muita humidade e provocam chuvas torrenciais, por vezes durante vários dias seguidos, tanto na costa ocidental da Índia, como no interior da península do Industão. A monção fertiliza as terras e ressuscita a vida depois de vários meses de seca extrema, mas a intensidade das chuvas provoca o aumento do caudal dos rios, inundações e deslizamento de terras, que afectam milhares de pessoas e provocam a perda de vidas. Muitas construções e árvores não resistiram à força do binómio vento/chuva, enquanto muitas escolas foram encerradas, o movimento ferroviário foi suspenso e muitos aeroportos foram encerrados por períodos prolongados.
A notícia do jornal The Pioneer relata detalhadamente as ocorrências, muitas delas dramáticas, provocadas pela monção no noroeste da Índia, incluindo na capital Nova Delhi, mas surpreendentemente não há referências ao estado de Goa, onde a monção é usualmente muito intensa em termos de vento, chuva e agitação marítima.

domingo, 9 de julho de 2023

R.I.P. Professor José Mattoso

Com 90 anos de idade faleceu ontem o Professor José Mattoso, uma notável figura da cultura portuguesa, com uma vasta obra publicada sobre a nossa História Medieval. Reconhecido como um dos mais ilustres historiadores medievistas portugueses, como investigador e como professor universitário, era também muito respeitado pelo seu percurso de vida, em que se destacavam a sua militância cívica, a sua inteligência e a sua humildade.
Após o curso liceal que frequentou na sua cidade natal de Leiria, foi monge da Ordem de São Bento, tendo vivido na abadia portuguesa de Singeverga e na cidade belga de Lovaina, em cuja Universidade Católica se licenciou e doutorou em História Medieval.
Depois de cerca de vinte anos de vida monástica, regressou à vida laica em 1970 e iniciou a sua carreira académica em Portugal, onde foi professor catedrático da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Em 1987 foi a primeira personalidade a quem foi atribuído o prestigiado Prémio Pessoa e, entre 1996 e 1998, dirigiu o Arquivo Nacional da Torre do Tombo. Publicou mais de três dezenas de obras de referência, dirigiu a edição em oito volumes da História de Portugal (Círculo de Leitores) e coordenou o projecto de inventariação do Património de Origem Portuguesa no Mundo (Fundação Calouste Gulbenkian).
Viveu em Timor-Leste no período imediatamente anterior e posterior à sua independência, dirigindo de forma competente e persistente a recuperação da memória histórica timorense e a criação dos Arquivos Nacional e da Resistência. Foi aí que o conheci e que com ele privei algumas horas de conversa, rendido à sua cultura, à sua humildade, ao seu espírito de missão e à sua sabedoria.
Portugal e a cultura portuguesa perderam uma das suas mais distintas personalidades da segunda metade do século XX.

sexta-feira, 7 de julho de 2023

O Tour de France e a loucura dos franceses

As transmissões televisivas diárias têm confirmado a 110ª edição do Tour de France como uma grande prova desportiva, mas também como um entusiástico espectáculo popular de quase loucura, com muitos milhares de pessoas nas bermas das estradas, sobretudo nas altas montanhas, a incitar e aplaudir o colorido pelotão de ciclistas. Embora haja muitos desportos que entusiasmam as multidões, não será exagero afirmar que as Grandes Voltas ciclistas e, em especial o Tour de France, estão no topo desse entusiasmo.
A corrida iniciou-se no País Basco espanhol e à partida tinha o dinamarquês Jonas Vingegaard e o esloveno Tajed Pogacar como grandes favoritos. Como primeira dificuldade, os ciclistas enfrentaram os Pirinéus e as suas montanhas e, na 5ª etapa, Vingegaard deixou Pogacar para trás. Ontem disputou-se a 6ª etapa, na qual os ciclistas subiram o col d’Aspin e o col du Tourmalet e foi a vez de Pogacar deixar Vingegaard para trás. Faltam muitos quilómetros, muitas montanhas e há sempre imprevistos, mas estas duas etapas já mostraram que estamos perante um “duelo de gigantes”, como hoje titula o diário desportivo espanhol as.
O presidente Emmanuel Macron acompanhou a 6ª etapa a bordo de uma viatura, porque é um entusiasta do ciclismo como são todos os franceses e, talvez, para esquecer os graves problemas que tem no país e fora dele. Na meta de Cauterets-Cambasque, o presidente francês viu a chegada de Pogacar, de Vingegaard, do norueguês Johannessen e do português Rúben Guerreiro, que com muito brilho chegou em 4º lugar, mas teve que esperar até que um ciclista francês cortasse a meta em 10º lugar.
O nosso aplauso ao Rúben Guerreiro e os votos para que no “duelo de gigantes” ganhe o melhor.

quinta-feira, 6 de julho de 2023

O dia mais quente de sempre no mundo

As alterações climáticas são uma realidade cada vez mais sentida no mundo, apesar de ainda haver países que continuam a ignorar os compromissos assumidos com a assinatura dos Acordos Climáticos de Paris de 2015. A persistência com que vão afectando a vida no nosso planeta teve nos últimos dias um episódio significativo, quando na passada segunda-feira foi registada a mais elevada temperatura média de sempre - 17,01 graus C - com os termómetros a ultrapassarem os 45 graus em muitas cidades do Médio Oriente e dos Estados Unidos. Nessa altura, os especialistas afirmaram que esse valor seria ultrapassado em breve e… tinham razão. 
De facto, na terça-feira seguinte, que foi o dia 4 de Julho, o recorde foi novamente batido quando a temperatura média diária do ar na superfície da Terra foi de 17,18 graus C, isto é, foi o dia mais quente de sempre no mundo, segundo os dados medidos nos Estados Unidos pelos serviços da NOAA (National Oceanic and Atmospheric Administration) e por outras agências. A NOAA regista os valores máximos mundiais da temperatura do ar desde 1979 e o seu maior registo tinha sido estabelecido no dia 24 de Julho de 2022 com 16,92 graus C.
António Guterres, o secretário-geral das Nações Unidas, tem sido o grande paladino pela causa da luta contra as alterações climáticas e, perante estes casos, afirmou numa conferência de imprensa em Nova Iorque, estar muito preocupado com a posição do mundo em relação ao clima e com a “falta de ambição e cooperação”, acentuando que "as actuais políticas levarão à catástrofe".
O jornal brasileiro O Globo fez deste caso a notícia do dia, mas os jornais generalistas portugueses destacaram que um tal Di Maria assinara contrato com o Benfica e que as equipas do FC Porto e do SL Benfica se encontrarão no dia 1 de Outubro, na 7ª jornada do campeonato. Que tristeza…

Onda de violência e vandalismo em França

No passado dia 27 de Junho, um jovem francês chamado Nahel de origem magrebina e com 17 anos de idade, foi morto nos arredores de Paris pelo disparo de um agente durante uma operação de controlo policial, quanto tentava esquivar-se com o automóvel que conduzia sem carta de condução. Este episódio inflamou o país e reacendeu a enorme tensão social devida às assimetrias da sociedade francesa, bem como as acusações de racismo feitas às forças de segurança francesas, surgindo na linha dos protestos violentos dos últimos anos, como a reacção ao aumento da idade da reforma ou o movimento dos coletes amarelos. Todas estas situações geraram violência e vandalismo em várias cidades francesas, estando apurado que a idade média dos participantes na onda de protesto é de 17-18 anos.
Segundo revelou o ministro do Interior, os distúrbios ocorridos nos últimos dez dias provocaram incêndios em 2.508 edifícios e a destruição de 12.031 veículos automóveis, enquanto 3.505 pessoas, na sua maioria jovens, foram detidas por suspeita de envolvimento nesses crimes. As forças policiais registaram um total de 23.178 incêndios, dos quais 273 atingiram esquadras da polícia ou quartéis da guarda nacional. Uma enormidade! 
O mundo está estupefacto com esta onda de violência e de vandalismo que se verifica muito frequentemente em França, o país da Liberdade, da Igualdade e da Fraternidade. O jornal La Dépêche du Midi, que se publica em Toulouse, exprime bem essa estupefação ao destacar em primeira página que “le monde ne nous reconnaît plus”.
Esta situação mostra-nos a incapacidade de alguns líderes europeus, designadamente Emmanuel Macron, para gerir os actuais problemas sociais que afectam os seus países e obriga-nos a repensar o mundo e a Europa em que temos vivido.

quarta-feira, 5 de julho de 2023

Os BRICS, a OCS e a nova ordem mundial

Na histórica disputa entre o Oriente e o Ocidente, as coisas não correm à mesma velocidade, como se pode observar nas movimentações da OCS e dos BRICS, em ambos os casos por inspiração chinesa. Ontem os líderes da OCS reuniram-se em videoconferência e afirmaram a sua solidariedade à Rússia.
A Organização para a Cooperação de Xangai (OCS) é uma organização política, económica e de segurança liderada pela China, que foi fundada em 2001. Inicialmente, a organização incluia a China, o Cazaquistão, o Quirguistão, a Rússia, o Tajiquistão e o Uzbequistão, mas em 2017 acolheu a Índia e o Paquistão e, em 2021, recebeu o Irão. São nove países que, como já foi salientado, “representam metade da humanidade” e que visam a cooperação em vários domínios, sobretudo em matérias de segurança, mas que tem sido criticada por ser antiocidental, por querer acabar com o dólar enquanto moeda forte do comércio internacional e por querer construir uma aliança militar rival da NATO. A reunião de ontem parece ter reforçado a solidariedade para com a Rússia pois “nenhum estado-membro da OCS votou contra a Rússia em resoluções da ONU desde a invasão da Ucrânia, há quase 500 dias”, como salienta o jornal South China Morning Post que se publica em Hong Kong e que, na sua edição de hoje, destaca as fotografias de Xi Jinping, Putin e Narendra Modi.
Entretanto, tanto a OCS como o grupo dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) alimentam a vontade de reformar o sistema internacional e criar uma nova ordem mundial. Quando no próximo mês se reunirem em Joanesburgo, os líderes dos BRICS irão analisar as candidaturas da Argentina, Egipto, Indonésia, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita, Argélia, Irão e Bangladesh, mas nem a Índia nem o Brasil apoiam tantas adesões pois não querem perder influência na organização.
Assim vai o mundo com muitas disputas e demasiadas guerras.

domingo, 2 de julho de 2023

A festa do Tour de France já começou

Começou ontem a 110ª edição do Tour de France, a maior e mais famosa prova ciclista da actualidade, que este ano teve início na cidade espanhola de Bilbao, que é a capital da província da Biscaia da Comunidade Autónoma do País Basco, ou Euskadi. Partiram 176 ciclistas representando 22 equipas, que vão percorrer 3.405 quilómetros que se repartem por 21 etapas, muitos deles a obrigá-los a pedalar em alta montanha. A prova termina em Paris no dia 23 de Julho e espera-se que os três ciclistas portugueses que integram o pelotão cheguem ao fim, mas também com boas classificações.
Toda a imprensa basca deu grande cobertura ao “historico estreno en Euskadi”, como acontece com a edição de hoje do jornal El Correo, em linha com o enorme entusiasmo popular que se viu na transmissão televisiva em directo da primeira etapa, que percorreu os arredores da cidade e terminou junto do Museu Guggenheim, mas que obrigou os ciclistas as trepar as primeiras montanhas desta prova.
Os favoritos desta 110ª edição são o dinamarquês Jonas Vingegaard, que ganhou em 2022, e o esloveno Tadej Pogacar, que triunfou em 2020 e 2021. Porém, para além dos aspectos desportivos inerentes a esta grande prova mundial, o Tour de France é uma grande festa popular e há sempre a expectativa de podermos assistir a grandes transmissões televisivas que mostram a riqueza patrimonial e paisagística da França e que, esperemos, também sirvam para refrear a preocupante onda de vandalismo que está a atravessar o país.

sábado, 1 de julho de 2023

Bolsonaro inelegível, mas ainda é pouco

O Tribunal Superior Eleitoral do Brasil (TSE) tomou ontem a decisão de declarar o ex-presidente Jair Bolsonaro inelegível até 2030, por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação numa reunião com embaixadores estrangeiros realizada no Palácio da Alvorada, por atacar sem provas, o sistema de voto electrónico que é utilizado no Brasil. O TSE decidiu-se pela condenação, por cinco votos contra dois, mas Jair Bolsonaro vai certamente recorrer desta decisão.
Toda a imprensa brasileira deu destaque a esta notícia e a edição do Correio Braziliense publicou a fotografia do Jair e uma sua declaração em que afirmou que antes “levei uma facada na barriga, hoje levei uma facada nas costas com a inelegibilidade”. É caso para dizer que o Tribunal decidiu e que, portanto, está decidido.
Porém, o que surpreende é o facto de ainda não terem sido apuradas as responsabilidades de Jair Bolsonaro nos graves acontecimentos de 8 de Janeiro de 2023 em Brasília, quando alguns milhares dos seus apoiantes, extremistas e vândalos, ocuparam a Praça dos Três Poderes e invadiram o Palácio do Planalto, o Palácio do Congresso Nacional e o Palácio do Supremo Tribunal Federal, com o objectivo de pressionar um golpe militar contra o governo do presidente Lula da Silva e, por essa via, entregar a presidência a Jair Bolsonaro, que tinha sido derrotado nas urnas. Nos meses seguintes foi anunciada a prisão de 2.182 pessoas por participação ou envolvimento na tentativa do golpe bolsonarista, que provocou a destruição e roubo de obras de arte, a destruição parcial de edifícios e, sobretudo, afectou a imagem externa do Brasil.
Bolsonaro foi declarado inelegível politicamente, mas certamente que o Brasil espera que venha a ser acusado criminalmente pelos acontecimentos de 8 de Janeiro de 2023.