As imagens da
tragédia que está a acontecer no Mediterrâneo envergonham a Europa, com as suas
águas a transformarem-se num gigantesco cemitério para os desafortunados do
século XXI, sobretudo no chamado canal da Sicília, no estreito de Gibraltar e
no mar Egeu. Milhares de emigrantes têm morrido afogados porque fogem do caos
da Síria ou da Líbia ou, simplesmente, porque fogem da pobreza e ambicionam uma
vida melhor. Calcula-se que nas costas da Líbia haverá cerca de um milhão de
pessoas que espera a sua oportunidade para se lançar na aventura, organizada
por mafias que, a troco de 8 mil euros, lhes prometem o sonho europeu.
Esta tragédia
humanitária não acontece por acaso. É, sobretudo, uma consequência das
políticas que têm sido seguidas por alguns dirigentes europeus e americanos,
que têm apostado na intervenção militar e no derrube dos ditadores desta zona
do mundo (e do petróleo), casos de Saddam Hussein, Bashar-el-Assad e Muammar
Kadaffi, sem que haja alternativas democráticas, daí resultando a completa
instabilidade, a anarquia e a destruição destes países.
Todos nos
lembramos do que aconteceu na Líbia em 2011. Em poucos meses, com o aval da
ONU, os falcões da NATO lançaram os seus Tomahawks sobre o regime líbio, efectuaram
21.200 voos de reconhecimento e 7.958 voos de ataque sobre a Líbia, tendo-se
tornado a “componente aérea” da oposição a Kadhafi. A operação apenas teve o
apoio de metade dos 28 membros da NATO e a participação de oito - França,
Grã-Bretanha, Estados Unidos, Bélgica, Dinamarca, Noruega, Itália e Canadá. A
Alemanha, tal como o Brasil, a Rússia, a China, a Índia e a África do Sul, não
apoiaram esta agressão, porque perceberam que era pior a emenda que o soneto. E
tinham razão.
A tragédia que
hoje se desenrola no Mediterrâneo só pode estar a fazer chorar lágrimas de
crocodilo aos dirigentes que apoiaram o derrube de Kadaffi e abriram as portas
ao caos na Líbia, muitos dos quais ainda estão no poder ou próximo dele, sem
que ninguém nos lembre do mal que nos fizeram.