Ontem, eram quase
23 horas, quando o governador do Banco de Portugal veio à televisão anunciar as
medidas adoptadas para ultrapassar a crise do BES, um problema que até há bem pouco
tempo ninguém tinha detectado, nem percebido, nem imaginado. Como regulador, o Banco de Portugal esteve ausente e nunca foi
capaz de identificar as contabilidades criativas, as práticas fraudulentas e as
operações de branqueamento de capitais, nem no BES, nem nos outros bancos. Corre
tudo entre oficiais do mesmo ofício ou entre amigos. Gente de confiança.
Colegas de faculdade ou de partido. Apesar do fumo que até os cegos viam...
Porém, há menos
de um mês, o Banco de Portugal veio dizer que a situação de solvabilidade do
BES era sólida e que tinha sido reforçada com o recente aumento de capital. Mesmo
há poucos dias, quando a coisa se
começou a saber, com referências a irregularidades, gestão danosa e prática de
ilícitos, ainda houve quem nos tivesse impingido aquela história de que o BES e
o GES eram coisas diferentes e que todos podíamos estar descansados. Um deles foi o primeiro Passos, agora em banhos no Algarve. O BES merecia
toda a nossa confiança. Afinal, ontem fomos informados que a coisa é muito grave, possivelmente mais
grave que o caso BPN pelos impactos directos e indirectos que tem na economia,
mas foi-nos dito e repetido que “esta
operação não implica custos para o erário público”, embora a mesma coisa nos
tivesse sido dita quando do caso BPN.
Se a minha surpresa foi grande com a notícia do afundamento do BES e
com mais uma escandalosa demissão do Banco de Portugal, igual surpresa tive
ontem com a enorme quantidade de especialistas que passaram pela televisão a
explicar tudo, sem quaisquer dúvidas ou hesitações. Foram dezenas deles que,
nada tendo visto antes, nos apareceram ontem como verdadeiros gurus das
artimanhas bancárias. Desde o Marques Mendes ao Marcelo RS, passando pelos muitos jornalistas-comentadores que nada viram antes e que, quem sabe, também fizeram
férias na neve à custa do BES. Ninguém se interrogou sobre o destino que
tiveram tantos milhares de milhões de euros que têm sido roubados e que têm
servido para que alguns enriqueçam, ao mesmo tempo que nos acusam de vivermos
acima das nossas possibilidades.
Como diria Pessoa: Ó mar
salgado, quanto do teu sal são lágrimas de Portugal!