quarta-feira, 3 de julho de 2019

Portugal e Moçambique: relações fortes

Na minha já distante juventude uma visita de um chefe de Estado estrangeiro a Portugal era um grande acontecimento e eu lembro-me das visitas da Rainha Isabel II da Grã-Bretanha (1957) e do Presidente Eisenhower dos Estados Unidos (1960), entre outras visitas presidenciais feitas a Portugal nesse tempo. A televisão que acabara de aparecer no nosso país mostrava imagens dos banquetes oficiais e dos desfiles militares, enquanto os jornais e as estações radiofónicas dedicavam grandes reportagens ao acontecimento. O povo saía à rua para ver passar a caravana oficial, para apreciar as vistosas guardas de honra e para aplaudir o dignitário, ao mesmo tempo que as crianças das escolas eram alinhadas nas bermas dos percursos para agitar bandeiras.
Depois, com o surgimento de uma nova ordem internacional marcada pelo progresso económico e tecnológico, pela interdependência regional, pelo desanuviamento e pelo interesse mútuo, as relações entre os Estados intensificaram-se e as visitas presidenciais tornaram-se uma rotina e passaram a ter, quase sempre, objectivos de natureza económica. Porque essas visitas se tornaram uma rotina na vida das nações e, por vezes, duram poucas horas, quase deixaram de ser notícia.
Porém, a visita oficial a Portugal ontem iniciada por Filipe Nyusi, o Presidente da República de Moçambique, tem características especiais e é uma notícia importante, destacada hoje no jornal moçambicano O País. Moçambique e Portugal falam a mesma língua e partilharam um passado histórico comum, com altos e baixos como todos os relacionamentos, mas seguramente que não há na Europa um país tão moçambicano como Portugal, enquanto na costa oriental africana não há país tão português como Moçambique. 

Quem são os caloteiros que devem à banca

Em Portugal há uma forte tendência para encontrar bodes expiatórios para tudo o que não corre bem, isto é, arranja-se um alvo e a imprensa, ou a justiça, ou a política, encarregam-se de influenciar a opinião pública e queimar esse alvo na praça pública. Há uns anos atrás foi o Relvas que usou títulos académicos indevidos e tudo lhe caiu em cima, como se fosse só ele. Depois foi o Pinto de Sousa que vivia acima das suas possibilidades e também tudo lhe caiu em cima, como se fosse só ele. A seguir foram os incêndios de Pedrógão e à ministra Constança tudo lhe caiu em cima, como se fosse só ela. Agora é o José Berardo e tudo lhe cai em cima, como se fosse só ele a dever dinheiro à Caixa Geral de Depósitos ou a provocar a derrocada do sistema financeiro português e das fraudes que aconteceram no BPN, no Banif, no BES e não sei onde mais.
Os aspectos jurídicos ou criminais destes casos não me interessam particularmente, embora saiba que “47 banqueiros foram ou ainda estão presos por causa da crise financeira. Metade são da Islândia. Nenhum é de Portugal” (Expresso, 23 de Setembro de 2018).
No caso da dívida de 320 milhões de euros de José Berardo à Caixa Geral de Depósitos, assistimos ao triste episódio de uma audição parlamentar que mais parecia um inquérito policial, enquanto os políticos e os jornalistas estão calados no que respeita à divulgação dos nomes dos outros grandes devedores da banca pública ou privada, sem que sejam conhecidas as suas fraudes e as enormes batotas de quem se governou e que, por vezes, até comendas recebeu. Uma tristeza e, por isso, o título do jornal i tem o meu aplauso. O que tem acontecido com este silêncio e com a ajuda pública a toda a banca é obsceno, pois é o dinheiro dos nossos impostos. É caso para perguntar quem são e quanto devem todos os Berardos que há por aí.

Um passo errado do soberanismo catalão

O movimento independentista da Catalunha ensaiou em Outubro de 2017 uma insurreição contra o Estado espanhol, que incluiu a realização de um referendo organizado pelo governo catalão que não passou de uma farsa, uma declaração unilateral de independência feita por Carles Puigdemont e a promoção de grandes manifestações populares que mostraram que a Catalunha estava politicamente dividida. A unidade da Espanha que consta da sua Constituição levou à intervenção da justiça espanhola de que resultou a detenção de alguns dos líderes independentistas, enquanto outros se decidiram pelo exílio em Bruxelas. Quando no passado mês de Maio se realizaram as eleições europeias, dois tribunais de Madrid anularam a decisão da Junta Eleitoral que excluira Carles Puigdemont e Toni Comín, ambos fugidos à justiça espanhola pela sua participação no mencionado referendo, que o governo espanhol considerou ilegal.
No passado dia 26 de Maio tanto Carles Puigdemont como Toni Comín foram eleitos eurodeputados e ontem, em Estrasburgo, prepararam-se para tomar posse na primeira sessão da nova legislatura. Porém, os dois políticos catalães foram impedidos pelo Tribunal Geral da União Europeia porque não tinham a cédula emitida pela Comissão Nacional Eleitoral de Espanha que exige que todos os novos eurodeputados espanhóis se apresentem numa cerimónia de posse e de compromisso, que se realiza em Madrid, onde juram obedecer a Constituição de Espanha. Ora estes eleitos não tinham essa cédula, uma vez que não compareceram à referida cerimónia (pois seriam detidos), além de que o governo espanhol considera que ambos eram "inelegíveis" nas europeias por não estarem inscritos como cidadãos espanhóis a viver no estrangeiro. O legítimo movimento soberanista catalão continua a ser muito mal servido por esse Puigdemont que, enquanto representante da Catalunha, não tem assento no Parlamento Europeu. Foi um erro dos independentistas que esqueceram a sua causa para safar um descontrolado político.