segunda-feira, 18 de abril de 2016

O Brasil tremeu com o voto dos deputados

O plenário da Câmara dos Deputados brasileira aprovou ontem a abertura do processo de destituição da Presidente Dilma Rousseff por 367 votos a favor, 137 contra, 7 abstenções e 2 ausências, numa sessão marcada por grandes protestos e por dura troca de acusações. Muitos milhares de brasileiros assistiram àquele espectáculo que foi transmitido por todo o país em écrans gigantes, num ambiente mais próximo do futebol e do carnaval do que da gravidade política da situação. A generalidade da imprensa brasileira, caso do Estado de S. Paulo, alinhou nessa onda de euforia pelo avanço do impeachment, mas nos jornais estrangeiros há um clima de apreensão pelo que pode acontecer no futuro, com a proximidade dos Jogos Olímpicos, a recessão económica e a crise generalizada, o que pode dar origem a uma grave situação política e social de radicalização e de contornos imprevisíveis.
No estrangeiro há sempre muita dificuldade em perceber o que se está a passar porque existe um grave problema interno no Brasil, que só os brasileiros poderão compreender e resolver. No entanto, a decisão dos deputados parece ser uma decisão desproporcionada e que abre o caminho não só à destituição da Presidente eleita do Brasil, mas também ao descrédito internacional do país e ao desprestígio das suas instituições. Para um português, que é um estrangeiro especial porque fala a mesma língua dos brasileiros, que compreendeu o que foi dito e que ouviu a gritaria e os insultos dos deputados, a dificuldade ainda é maior porque sabe que cerca de 60% dos deputados presentes na sala, incluindo o seu presidente Eduardo Cunha, têm causas pendentes na Justiça, algumas delas bem graves. Ninguém vai achar normal esta forma brasileira de deitar abaixo os seus Presidentes eleitos pelo povo: ontem foi Collor de Mello, hoje é Dilma Rousseff. Aqueles deputados foram longe de mais. A imprensa internacional está estupefacta. Ninguém compreende aquele julgamento político.
A partir de agora os amigos do Brasil ficam muito apreensivos com o que se possa passar.

Aqui tão perto, a Polisário não dorme

Aqui bem perto de nós há algumas situações de tensão cujas características e níveis de preocupação são bem diversos. Uma dessas situações é a questão do Saara Ocidental.
O Saara Ocidental é uma antiga colónia que a Espanha abandonou em 1975, sem infraestruturas e com um população nómada e totalmente analfabeta, que faz fronteira terrestre com Marrocos, Argélia e Mauritânia. Os saaráuis fundaram a Frente Polisário (Frente Popular para la Liberación de Saguía el-Hamra y de Río de Oro) e em Fevereiro de 1976 proclamaram a independência da República Árabe Saaraui Democrática (RASD), que tem um governo no exílio, reconhecido por cinco dezenas de países. Com a saída espanhola do território, o reino de Marrocos e a Mauritânia ocuparam o Saara Ocidental invocando direitos históricos, mas a Frente Polisário conseguiu expulsar a Mauritânia. Dessa forma, o conflito passou a colocar frente a frente o reino de Marrocos e a Frente Polisário ou, como se diz, Marrocos e a Argélia, que é a grande aliada da Frente Polisário. Enquanto Marrocos oferece uma ampla autonomia ao território sob a soberania marroquina, a Frente Polisário reclama a autodeterminação e a independência do território através de um referendo.
As Nações Unidas intervieram a partir de 1991 e conseguiram que fosse assinado um cessar-fogo e, com base na Resolução 690 do Conselho de Segurança, estabeleceram a MINIURSO (Misión de las Naciones Unidas para el Referéndum del Sáhara Occidental), exactamente para organizar o referendo, mas passados cerca de 25 anos não o conseguiram. Agora, exilado na cidade argelina de Tindouf, que é a sede do governo saaráui no exílio, o presidente Mohamed Abdelaziz fala ao El Watan de Argel para criticar a ineficiência da ONU, denunciar as violações dos direitos humanos no território ocupado pelos marroquinos e avisar que poderá voltar a pegar em armas. Muita gente pensa que a questão é uma pequena borbulha sem importância, mas tem-se visto que certas borbulhas geraram processos inflamatórios que se transformaram em grandes epidemias.