terça-feira, 1 de março de 2016

O Brexit é um desafio para muita gente

A decisão do governo britânico de realizar no próximo dia 23 de Junho um referendo para que o Reino Unido escolha se deve permanecer ou abandonar a União Europeia é, porventura, o mais grave acontecimento a afectar a coesão e o futuro de um projecto que se aproxima dos sessenta anos de idade. De facto, os tempos mostram-se difíceis para um projecto que já agrega 28 Estados-membros, com muitas línguas e muitas culturas, com percursos históricos e interesses bem diversos, cujas economias estão a passar por grandes dificuldades. A Europa está em crise profunda, sem liderança, sem solidariedade, sem rumo e à mercê de uma burocracia mais ou menos corrupta que se instalou em Bruxelas.
Embora a adesão do Reino Unido ao projecto europeu tivesse acontecido em 1973, o facto é que a sua integração tem sido um processo muito complicado, que agora se agudizou com a exigência britânica de reformas que devolvam competências aos Estados-membros, que travem ou limitem o processo de  integração europeia e que imponham restrições aos direitos dos imigrantes comunitários. Esta atitude britânica de afrontamente à tirania burocrática de Bruxelas corre o risco de ser seguida por outros Estados-membros, insatisfeitos pelo rumo que a Europa segue, com países com e sem o euro, que pertencem ou não pertencem à NATO, que estão integrados ou não nos Acordos de Schengen, isto é, provavelmente com mais factores de divergência do que de convergência.
Nesta altura, segundo as sondagens, equivalem-se os que dizem Sim e os que dizem Não à permanência do Reino Unido na União Europeia. Aos poucos, vão surgindo estudos que apoiam uma ou outra alternativa e um desses estudos foi divulgado pelo The Economist que, na capa da sua última edição, diz que o Brexit é mau para o Reino Unido, para a Europa e para o Ocidente. Outros estudos asseguram que a vida de dois milhões de cidadãos britânicos que vivem na Europa será muito afectada durante muitos anos, tal como o fabrico de automóveis, a agricultura e os serviços financeiros. Há estudos para todos os gostos, mas não restam dúvidas que o que vier a acontecer em Junho no Reino Unido vai afectar toda a Europa e pode ser a caixa de Pandora europeia que muitos temem.

Os jornais e os jornalistas da treta

Qualquer semelhança entre isto e um jornalista económico...
No passado dia 25 de Fevereiro a agência de notação financeira Moody's deu nota positiva à versão revista do Orçamento do Estado para 2016, considerando que a sua aprovação mostra "a capacidade e vontade do Governo em reverter o curso dos acontecimentos e apresenta um rumo fiscal mais realista que o apresentado no primeiro esboço do Orçamento". Esta opinião da Moody’s mostra que a negociação do Orçamento satisfez todas as partes envolvidas ou, dito de outra forma, foi bem negociado. Andávamos tão habituados a ver a Moody’s baixar o rating da dívida pública portuguesa e a prenunciar mais e piores desgraças financeiras, que este raríssimo e inesperado elogio nos surpreendeu, sobretudo depois da intensa campanha, por vezes caluniosa e insultuosa, que foi feita contra o Orçamento e contra o governo de António Costa.
Fiquei à espera de ver o que a imprensa ia dizer e, em especial, a imprensa económica. Porém, salvo duas ou três excepções que de forma ligeira trataram o assunto, não vi manchete, nem notícia, nem editorial, nem artigo de opinião. É certo que não li tudo, mas o que li foi suficiente para ver que os Gomes Ferreiras, os Antónios Costas, os David Dinizes e os Josés Manuel Fernandes se calaram. A notícia terá passado em algumas televisões mas, ao contrário do que aconteceu quando a agência canadiana DBRS poderia ter descido o rating da dívida portuguesa, agora ninguém tomou a iniciativa de ligar para a Moody’s para se perceber melhor esta sua surpreendente posição.
Hoje, o jornalista Nicolau Santos destacou-se uma vez mais como um profissional de excepção ao denunciar no Expresso este comportamento sectário da nossa imprensa e ao sugerir que aguardemos pelas futuras posições menos favoráveis das outras agências de rating, casos da Standard & Poor’s, da Fitch e da DBRS. Nem foi preciso esperar: hoje o Conselho de Finanças Públicas fez comentários ao Orçamento e os telejornais esqueceram tudo para abrir os noticiários com essa informação. Que tristeza!