quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

Goa e a controversa estátua de Ronaldo

Os portugueses tomaram Goa aos muçulmanos do sultanato de Bijapur em 1510 e durante 451 anos ocuparam aquele território de cerca de 3.700 km2. A ocupação levou a um processo de aculturação que deu origem a uma cultura específica – a cultura indo-portuguesa – com evidências na língua, no modo de vida, nas artes, na religião, na gastronomia e em outros aspectos da vida social goesa. 
Goa era a “joia da coroa” do império português e o berço de gente muito ilustre.
Em 1947 a Índia tornou-se independente do Reino Unido e logo reivindicou o regresso de Goa à mother India, mas o governo português foi intransigente e, em 1961, as tropas, os navios e os aviões indianos invadiram e ocuparam aquele território, assim como Damão e Diu, que conjuntamente constituíam o Estado Português da Índia. O trauma foi enorme, tanto em Portugal como em Goa, onde uma parte dos goeses se considerou “libertada” e outra parte se afirmou “invadida”. Sessenta anos depois, a controvérsia entre libertação e invasão ainda continua, embora menos intensa do que antes. Contudo, permanecem em Goa muitos traços culturais e emocionais de cariz português e os indianos consideram Goa a “Europa da Índia”.
Nesse país que é o segundo mais populoso do mundo, o cricket é o desporto-rei, mas no estado de Goa – um dos 28 estados da Índia – o desporto-rei é o futebol, o que é uma das mais relevantes heranças culturais portuguesas. Foi aí que, na área de Calangute e por iniciativa oficial, foi agora erguida uma estátua de Cristiano Ronaldo para servir de incentivo e inspiração aos jovens futebolistas goeses. Numa terra onde depois de 1961 foram derrubadas as estátuas de Camões e de Afonso de Albuquerque, esta iniciativa de erguer uma estátua a um jogador de futebol português não caiu bem em alguns sectores da sociedade goesa que a consideraram um insulto ou um sacrilégio, enquanto outros sectores consideraram que a estátua de uma figura prestigiosa como Cristiano Ronaldo é mesmo um incentivo aos jovens e um sinal de reconciliação entre o colonizador e o colonizado. 
A iniciativa é realmente controversa embora tenha o meu aplauso. Porém, fico na expectativa quanto ao que irão fazer os fossilizados freedom fighters goeses, useiros e vezeiros em atentar contra tudo o que é português.