sexta-feira, 17 de abril de 2020

Os navios-escolas que regressam a casa

O navio-escola espanhol Juan Sebastián de Elcano atracou ontem na Base Naval de La Carraca, em Cádis, depois de cinco meses e meio de viagem de instrução de guardas-marinhas e, pela primeira vez na sua existência e por causa do covid-19, não atracou no cais da cidade para receber as tradicionais boas-vindas da cidade, o que inspirou o título de capa do jornal La Voz de Cádiz: triste regreso a casa del JS Elcano.
Durante a sua viagem de 18.000 milhas, o navio visitou nove portos de sete países das ilhas e das costas ocidentais atlânticas, em que cumpriu os seus objectivos de instrução e representação da Espanha, mas com “especial énfasis en transmitir la españolidad de la gesta y su transcendencia para el progreso de la humanidad”, isto é, nuestros hermanos não perdem nenhuma oportunidade para chamar a si todos os méritos de uma viagem à volta do mundo “sem querer “ que, como o mundo sabe, foi um empreendimento ibérico em que os castelhanos entraram com a força do dinheiro e os portugueses contribuíram com a força do seu saber náutico.
Segundo as notícias publicadas, a viagem terminou quando em Miami, devido à pandemia do covid-19, foram cancelados todos os actos institucionais previstos e a visita se tornou numa simples escala técnica para satisfazer necessidades logísticas.
O regresso do navio mereceu fotografias na primeira página em seis jornais diários espanhóis (!), o que mostra a grande empatia existente entre a imprensa espanhola e o seu navio-escola, uma situação que a imprensa portuguesa não cultiva em relação ao nosso belo navio-escola que, nesta altura navega no Atlântico Sul com rumo a Lisboa, depois de ter sido interrompida a sua viagem de circum-navegação, também por causa da pandemia do covid-19.

Como um só vírus paralisa uma Marinha

O porta-aviões francês Charles de Gaulle aparece hoje em destaque na imprensa francesa, porque se verificou que 668 dos seus 1.767 tripulantes (38%) estão infectados pelo covid-19, o que significa que a principal unidade da Marinha francesa e o seu poder de dissuasão nuclear estão de facto inactivos. 
O orgulho francês está ferido.
No passado dia 9 de Abril este assunto fora aqui tratado na ruadosnavegantes, quando cerca de quatro dezenas de tripulantes do porta-aviões francês manifestaram sinais gripais que, de imediato, foram associados à pandemia de covid-19. O navio encontrava-se ao largo da costa portuguesa e recebeu ordens para regressar à sua base mediterrânica de Toulon, mas três elementos da tripulação foram evacuados para hospitais franceses através do aeroporto de Lisboa e uma equipa médica de especialistas foi deslocada para bordo do navio-chefe da Marinha francesa. O navio tinha saído de Brest no dia 15 de Março e esta situação tornou-se um enigma por não se saber a origem desta infecção generalizada, que foi detectada quando o navio estava há mais de vinte dias sem qualquer contacto com terra. Quem teria introduzido o vírus no navio?
Porém, o problema agravou-se nas últimas horas quando se descobriu que havia 668 infectados, embora alguns deles sejam da guarnição da fragata Chevalier Paul, que sempre acompanha o porta-aviões Charles de Gaulle para assegurar a sua defesa aérea. O enigma assumiu, portanto, muito maiores proporções, não só sanitárias, como também operacionais, até porque o pessoal do porta-aviões e as suas famílias souberam da situação pela comunicação social, o que provocou muito alarmismo e fortes críticas às autoridades navais. O orgulho francês está realmente ferido, porque os franceses assistiram, em menos de dez dias, ao fiasco que está a ser o facto de um vírus ter neutralizado o poder de dissuasão nuclear do principal navio da sua esquadra, onde se incluem os famosos aviões Rafale.