sábado, 17 de novembro de 2012

Não apertem de mais!

Numa entrevista publicada ontem no Jornal de Notícias, o bispo do Porto, D. Manuel Clemente, lamentou que a Igreja Católica e as suas instituições de solidariedade social ainda não tenham sido ouvidas pelos elementos da troika, para lhes explicar a verdadeira realidade do país, que tão bem conhecem. E acrescentou: “Não apertem de mais! Nós precisamos de respirar”.
Através de D. Manuel Clemente e de outros bispos portugueses, mas também de muitas outras relevantes personalidades da nossa sociedade civil, todos os dias, desde há muitos meses, se repetem os avisos a alertar para os incertos e muito perigoso0s caminhos que vamos percorrendo.
      - A austeridade está a rebentar com o país (Jorge Sampaio)
      - Nunca vi uma situação tão severa na vida portuguesa (Adriano Moreira)
      - É a altura do país fazer ouvir a sua voz para um ajustamento mais suave (Rui Vilar)
      - Esta carga fiscal pode gerar uma septicemia na economia (Bagão Félix)
Os parceiros sociais, através do CES, também afirmaram o receio de que o país entre num círculo vicioso de recessão e aumento da dívida, sugerindo que haja uma renegociação com a troika. Porém, as críticas à austeridade não são apenas feitas intra-muros, pois também chegam de fora através da sábia palavra dos grandes economistas mundiais.  
Diz Joseph Stiglitz, o Prémio Nobel da Economia, 2001:
      A austeridade é um suicídio
      - A austeridade agrava as consequências da crise europeia
      - Para sair desta grande recessão não há outra alternativa que não seja estimular a procura
Avisa Paul Krugman, o Prémio Nobel da Economia, 2008:
      - Os defensores da austeridade esqueceram-se das pessoas
      - Espanhóis e gregos "estão certos" ao protestar contra mais austeridade
      - As medidas de austeridade levadas a cabo em Portugal foram demasiado longe
Com todas estas ajudas à navegação, é caso para dizer que é apenas por teimosia que esta gente anda com a nau à deriva, desgovernada e em vias de encalhar. Podiam ouvir, mas não ouvem. Ainda vão acabar a dizer que estão "orgulhosamente sós".

 

 

 

The time-bomb at the heart of Europe

The Economist destaca hoje na sua primeira página um tema que não sendo uma novidade, tem estado razoavelmente esquecido por jornalistas e por comentadores: trata-se da França, que a revista classifica como uma bomba-relógio no coração da Europa. A atenção internacional tem estado centrada nos “países que têm vivido acima das suas possibilidades”, como habitualmente são tratadas a Grécia, Portugal, Espanha e Itália, sobretudo em relação às suas dívidas e défices, políticas de austeridade, reformas em curso e reacções mais ou menos violentas que têm desencadeado, mas os problemas do país que está no coração do euro e da União Europeia não são menos graves. Com a presidência de Nicolas Sarkozy a França cedeu à Alemanha a liderança na crise do euro e dos destinos da própria União Europeia e, agora, até a sua economia parece estar cada vez mais vulnerável, ao perder competitividade para a Alemanha. Sem poder desvalorizar a moeda, a França tem aumentado a sua dívida pública que já ultrapassa os 90% do PIB, enquanto o Estado ganhou uma dimensão excessiva e consome 57% do PIB. Mais de 10% da força de trabalho e mais de 25% dos jovens, estão desempregados. Diz The Economist que o clima de negócios também piorou, que não nascem empresas e que há cada vez menos pequenas e médias empresas, que são hoje os motores do crescimento e do emprego, havendo uma invulgar intenção de emigrar, inclusive daqueles que são os candidatos naturais a empresários. O orgulho nacional francês começa a estar ferido, mas nem as elites nem os eleitores estão preparados para ceder mais soberania, nem para aceitar reformas estruturais mais profundas. A França é uma potência mundial mas corre o risco de ficar para trás e dos famosos mercados se decidirem por colocá-la na sua mira. François Hollande não tem muito tempo para desarmar esta bomba-relógio no coração da Europa.