segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

A protecção da saúde e os seus negócios

Uma notícia hoje avançada pelo jornal francês Le Télégramme revela que os hospitais públicos franceses estão a sofrer “uma hemorragia” de pessoal e que já estão a contratar médicos tarefeiros ao preço de 3000 euros por 24 horas. Esta informação é a imagem do descalabro que ameaça o sistema de saúde francês, provocado pela concorrência entre o público e o privado, mas também nos alerta para o facto de em Portugal já estarmos ou caminharmos para uma situação semelhante. Até parece que a saúde está doente.
A crise pandémica que nos apoquenta desde os finais de 2019 tem mostrado alguma debilidade do nosso sistema de saúde, daí resultando que haja muita gente a criticar o Serviço Nacional de Saúde (SNS) que é, seguramente, uma das maiores realizações do nosso regime democrático. Algumas dessas críticas serão justificadas, sobretudo quando se referem à falta de pessoal médico e paramédico, que se tem transferido do SNS para os hospitais privados ou que, não tendo abandonado o SNS, acumula funções nos dois sistemas de saúde e privilegia aquele que melhor lhe paga.
O número de hospitais privados não cessa de aumentar. Essas unidades são geridas por grupos económicos poderosos e são o exemplo de que a saúde se tornou num próspero negócio, que cobra sem piedade aos seus utentes, quase sempre protegidos por acordos de prestação de cuidados de saúde que, em última instância, são pagos pelo Estado. Esses grupos privados de saúde atraem os profissionais do SNS com remunerações mais atraentes e, dessa forma, estão objectivamente na primeira linha de esvaziamento e de ruptura do SNS. Porém, a protecção da saúde não pode ser um negócio e o SNS tem que ser protegido. 
O facto é que com tantos hospitais públicos e privados em Portugal, não parece que a cobertura sanitária do país satisfaça as necessidades da população e esse é um dos grandes problemas que tem que ser rapidamente estudado pelos poderes públicos para encontrar soluções. Há muita gente, sobretudo na política e no sindicalismo, que pressiona para que se injecte mais dinheiro no SNS, mas parecem esquecer que somos um país de recursos escassos e sem possibilidade de um contínuo endividamento público. 
O caminho tem que ser outro, com organização, inteligência e sentido comunitário.