quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

Eanes um Presidente para a História

A revista do Expresso publicou na sua última edição uma longa e muito interessante entrevista com António Ramalho Eanes, o primeiro Presidente da República eleito pelo regime democrático quando tinha apenas 41 anos de idade.
É uma entrevista notável do homem que ocupou o Palácio de Belém entre 1976 e 1986 num tempo de grandes dificuldades políticas, económicas e sociais, na qual revela a sua inteligência, a sua sabedoria e a sua grande estatura intelectual na abordagem dos mais diversos temas nacionais e internacionais.
O conteúdo da entrevista só me merece uma palavra: imperdível.
Apesar de Mário Soares (1986-1996) e Jorge Sampaio (1996-2006) terem cumprido mandatos presidenciais merecedores de grande apreço por parte dos portugueses, o facto é que a figura e o desempenho presidencial de Ramalho Eanes permanecem vivos na memória dos portugueses e a leitura desta sua entrevista mostra porquê. “Estou em paz comigo mesmo. Posso ter cometido erros mas entendo que os cometi quase sempre com bom propósito, boa intenção, com uma correcção ética preocupada”.
Ao longo da entrevista o general Ramalho Eanes responde com segurança e pertinência às questões que lhe são colocadas no domínio da vida política nacional, dos partidos, dos sindicatos, das Forças Armadas, da reforma educativa, da reforma fundiária, do endividamento dos portugueses, da moeda única, da União Europeia, das consequências do Brexit, da política internacional e de muitos outros assuntos internos e internacionais. Está esperançado, mas também preocupado com o futuro porque “a paz mundial não está garantida”. Elogia a solução política actual por ter quebrado o princípio da inevitabilidade, porque “não há inevitabilidades e quem escreve o futuro são os povos”. Com grande verticalidade e sem complexos, afirmou que “socialmente sou um homem de esquerda”, porque defende a igualdade e a solidariedade.
Em síntese, é uma entrevista notável de um homem notável, que deve ser lida atentamente.

As relações entre a política e o futebol

As relações entre o futebol e a política portuguesa são muito íntimas, mas são indesejáveis e muito perigosas. Quando vemos as tribunas dos estádios sempre recheadas de políticos e sabemos que, todos os anos, os presidentes dos grandes clubes de futebol se encontram em jantares com os deputados afectos aos seus clubes, como hoje destaca o jornal i, não podemos deixar de nos preocupar.
Esta intimidade nada tem a ver com o gosto pelo espectáculo do futebol que é fantástico dentro das chamadas quatro linhas. Eu gosto de ver o Real Madrid e o Barcelona, o Manchester United e o Chelsea, o Mónaco e o PSG, mas não me interessam os longos e indigestos serões televisivos portugueses em que os chamados comentadores gritam, insinuam e acusam, revelando por vezes muita falta de educação e, sobretudo, a autêntica degradação que essa gente está a fazer desse fenómeno popular que é o futebol.
Os políticos podiam e deviam distanciar-se desta barafunda, mas perdem-se na sua ganância de aparecerem e ser vistos para ganharem notoriedade e votos. A aliança entre a televisão e o futebol favorece-os e permite-lhes estabelecer relações íntimas com esse estranho mundo do futebol que já não é um desporto, mas uma manta de interesses, em que domina o dinheiro e, provavelmente, a corrupção. Os deputados deviam ser o exemplo das virtudes e dos valores dos portugueses, mas quando se juntam ao mundo do futebol, ficam sujeitos ao ditado popular: diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és.
Os deputados são eleitos em nome de um partido e, portanto, têm o compromisso de defender o seu ideário político que, naturalmente, visa a defesa da soberania nacional, o progresso económico e social, a administração da justiça, a preservação do ambiente e da paisagem, além de muitas outras linhas programáticas. Por isso, integram as listas dos partidos para defender os programas dos seus partidos. Os eleitores escolhem o ideário de um partido e não escolhem deputados do SLB, do SCP ou do FCP. Quando estes mesmos deputados se coligam futebolisticamente não estão a dar resposta aos eleitores que neles votaram, porque o seu envolvimento no estranho mundo do futebol os descredibiliza e desautoriza. Os deputados não se devem envolver com o futebol. Aprendam: ao futebol o que é do futebol e à política o que é da política.
Jantares de deputados com os donos da bola? Não, obrigado!