terça-feira, 14 de novembro de 2023

Haja sensatez e respeito na vida pública

A ventania gerada pelo Ministério Público no dia 7 de Novembro afectou a política portuguesa, mas parece que não passou disso mesmo, embora tivesse deixado grandes estragos – a queda de um primeiro-ministro que gozava de elevada reputação e prestígio na Europa e de um governo de maioria absoluta, com a economia em convergência com a União Europeia, com contas certas e com bom nível de emprego, com a dívida pública (em relação ao PIB) a diminuir e que vinha gerindo as incertezas do covid e das guerras, que negociava com médicos, com professores e que assumira a questão da habitação como uma das suas prioridades. Porém, alguém quis introduzir a instabilidade e a incerteza na política portuguesa, sem cuidar de pensar na verdade e nos efeitos induzidos das suas iniciativas, tratando de criar narrativas que sugerem prevaricação, corrupção activa e passiva de titular de cargo político, tráfico de influência e recebimento indevido de vantagem. Tudo suspeitas “vagas e genéricas” como decidiu o juiz de instrução que analisou o processo instaurado pelo Ministério Público e que o jornal Público hoje anuncia.
De acordo com a Constituição da República, “ao Ministério Público compete representar o Estado, exercer a acção penal, defender a legalidade democrática e os interesses que a lei determina”. É caso para perguntar se a procura de investimento estrangeiro em Portugal não é do interesse do Estado e se, perante localizações alternativas desse investimento, não é do interesse do Estado influenciar esses investidores para que invistam em Portugal e não na Eslováquia, em Marrocos ou na Irlanda? Levantou-se a suspeita e esqueceu-se que, segundo os preceitos constitucionais, os cidadãos portugueses têm direito “ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra e à reserva da intimidade da vida privada e familiar”, o que parece não ter sido acautelado.
Dias antes, já o qualificado académico José Pacheco Pereira dissera que “se aquilo é motivo de crime, todos os governos desde o 25 de Abril poderiam ser indiciados” e, interrogado sobre esse assunto, o experiente advogado Manuel Magalhães e Silva disse que “a montanha não pariu um rato, mas tão só uma formiga”.
Os livros de Sociologia ensinam que a vida humana é um processo de interacção social e cultural de influenciação da vida quotidiana, que é muito semelhante aos mecanismos que regem a economia internacional. Alguém se lembraria de instaurar um processo a quem conseguiu que a Volkswagen trouxesse uma das suas fábricas para Palmela? Ou alguém se lembraria de instaurar um processo a quem vier a ser capaz de travar a saída da fábrica de Palmela para Pamplona, ou para Osnabrück, como tanto se tem falado? 
Haja sensatez e respeito na apreciação da vida pública!