sábado, 30 de abril de 2022

Remendar a França e ter a paz na Ucrânia

O jornal La Croix publica-se em Paris e é um dos grandes jornais franceses de circulação nacional, afirmando-se com uma linha editorial que se diz imparcial nas questões políticas e sociais, mas que tem posições próximas da Igreja Católica.
Na sua edição de hoje, o jornal apresenta um mapa de França rasgado e com os sinais de estar a ser cosido, tendo por legenda “remendar a França”. Depois da recente disputa para as eleições presidenciais, em que Emmanuel Macron venceu com os votos daqueles que “o escolheram entre o menor dos males”, ele mesmo reconheceu as dificuldades que terá que ultrapassar, quer na frente interna com os problemas nas escolas, na segurança pública, na precariedade laboral e na integração das minorias, quer na frente externa com o agravamento da crise no leste europeu. Daí a ideia de remendar a França e de ultrapassar as divisões políticas, sociais e regionais que afectam o país, ameaçado ainda pelo movimento dos coletes amarelos (Mouvement des gilets jaunes), que nasceu em 2018 de forma espontânea para protestar contra “a ordem estabelecida” ou contra “a ordem centrista de Macron”, que quase paralisou a França e que ameaça agora regressar às ruas francesas.
Este quadro acontece quando no Leste da Europa se verifica um agravamento da confrontação entre os protagonistas da Guerra Fria, a mostrar que a Ucrânia é, sobretudo, um pretexto ou um palco para o domínio do mundo. Não se imaginava que tal pudesse acontecer, mas nessas circunstâncias a estabilidade da França é importantíssima para a União Europeia, mas também é importante para Portugal. As tensões entre a Rússia e a Ucrânia não deveriam ter atravessado o Atlântico e deveriam ter sido mediadas e arbitradas por Emmanuel Macron, ou por Olaf Scholz, ou por Recep Erdoğan, ou por António Guterres. No entanto, é sempre desejável que Macron “remende a França” e ajude à conversa entre Putin e Zelensky, para que aconteça o cessar-fogo e haja paz na Ucrânia.

O preço que a Europa paga pela guerra

O jornal espanhol ABC publica na sua edição de hoje uma fotografia de Irpin, uma cidade-satélite situada a ocidente de Kiev, onde se pode observar a enorme destruição provocada pela ocupação russa durante cerca de um mês. A imagem sugere que é preciso acabar com a guerra e procurar o cessar-fogo e a paz, que deveriam ser um objectivo para a comunidade internacional, tal como o seu apoio aos esforços do secretário-geral das Nações Unidas e de outros mediadores.
O mesmo jornal, inclui na primeira página um título que nos ajuda a compreender o que se está a passar na Ucrânia e que diz que “Europa financia la guerra de Putin com 22.000 millones de euros al mes”. Se aquele montante mensal for verdadeiro, representa um valor anual que excede o PIB português que é de cerca de 220 mil milhões de euros. Porém, se olharmos para os 2.451 milhões de euros que estão inscritos para o ano de 2022 no Orçamento do Estado português para a Defesa Nacional, ficamos com uma noção mais exacta do preço que a Europa está a pagar pelo seguidismo com que tem acompanhado os Estados Unidos, ao promover a continuação da guerra e a catástrofe humanitária que a acompanha, em vez de procurar a paz.
A forma desinteressada como foi olhada a visita de António Guterres a Moscovo e a Kiev, parece confirmar que para o lado ocidental é mais importante punir a Rússia, do que encontrar a paz e poupar o sacrifício do povo ucraniano. Antes da invasão ordenada por Putin, houve vários líderes europeus que procuraram mediar o conflito e evitar a guerra, mas as indústrias do armamento e os seus falcões parecem estar a conseguir o seu já declarado objectivo de enfraquecer a Rússia, embora essa tarefa esteja a ser feita à custa do sofrimento dos ucranianos e da destruição das suas cidades e, em menor escala, da regressão da economia, do modelo social e da coesão europeia.
Não são nada animadores os tempos que aí vêm.