domingo, 17 de julho de 2016

Já não há mau tempo no canal

Mais uma vez percorro as belas paisagens das ilhas do grupo central açoriano, sem nunca me cansar de olhar o horizonte, a ilha em frente, o aspecto do mar, as encostas verdejantes, as pedras negras, os recortes da costa e, sobretudo, a imponente montanha do Pico que é a maior referência física destas ilhas.
Releio sempre As Ilhas Desconhecidas, um dos mais importantes livros de viagem portugueses, escrito por Raul Brandão quando em 1924 efectuou uma visita aos Açores, no qual descreve a ilha do Pico como “a mais bela, a mais extraordinária ilha dos Açores, duma cor admirável e com um estranho poder de atracção”. Raul Brandão tinha razão ou estava muito próximo dela, porque apesar do progresso que tem percorrido a ilha, os seus traços culturais estão preservados em muitas práticas quotidianas, nas memórias dos mais velhos ou foram musealizados.
Agora que as invernias atlânticas retiraram para outras regiões e o sol inunda os dias durante muitas horas, o Pico revela uma paisagem invulgarmente variada e colorida. É o tempo das grandes festas religiosas e profanas, das exibições das filarmónicas e dos grupos de chamarritas e da visita dos familiares que vivem nos Estados Unidos e no Canadá. O Pico começa a tornar-se um destino turístico cosmopolita e há cada vez mais turistas que vêm conhecer as ilhas mais ocidentais da Europa, muitos deles para cumprir a aventura de uma subida até aos 2.351 metros de altitude da montanha. Alguns deles, sobretudo franceses e alemães, compraram casas antigas, restauraram-nas e decidiram fixar-se em permanência na ilha, para viver uma vida mais tranquila e mais sadia. Em boa verdade, com o progresso e com a vulgarização das viagens aéreas, já não há mau tempo no canal.

O insólito aconteceu no Tour de France

No passado dia 14 de Julho disputava-se a 12ª etapa do Tour de France 2016 que tendo saído de Montpellier, terminava com a subida do famoso monte Ventoux. Era uma das mais difíceis etapas da prova e era, também, a vitória mais cobiçada, sobretudo pelos ciclistas franceses.
Nos últimos quilómetros da etapa o britânico Christopher Froome, que envergava a camisola amarela, conseguiu libertar-se dos seus rivais mais próximos durante a subida do monte Ventoux, aproximando-se da meta com dois outros ciclistas. Faltavam três quilómetros para a meta. Como sempre acontece, o público coloca-se na beira da estrada e não consegue controlar o seu entusiasmo. Com os seus aplausos e incitamentos aproxima-se dos ciclistas, ocupa a estrada, perturba a corrida e tende a provocar acidentes. Todos os anos, na maior parte das grandes subidas do Tour, é tão indescritível o entusiasmo do público, como são elevados os riscos a que expõem os ciclistas. Para quem assiste regularmente a estes espectáculos televisivos, espanta que os ciclistas consigam passar por entre estreitíssimas filas de público e que a organização não tome medidas apropriadas que para proteger os ciclistas, o público, a verdade desportiva e o próprio espectáculo.
Porém, este ano, o acidente anunciado e nada improvável aconteceu mesmo. A moto que “abria caminho” teve que travar bruscamente para evitar o atropelamento de um espectador. O ciclista que ia à frente chocou com a moto. Depois, o ciclista seguinte que era Chris Froome, foi abalroado por uma segunda moto. Com a bicicleta partida e com o seu carro de apoio muito longe, o desespero tomou conta de Froome e levou-o a correr estrada acima à procura não se sabe de quê. Nunca se vira um ciclista com a camisola amarela a correr sem bicicleta e logo na subida do Ventoux. Diversos jornais internacionais destacaram este acontecimento na sua primeira página, incluindo o americano Finantial Times, na edição em que, também em primeira página, noticia a declaração do presidente François Hollande de que é “moralmente inaceitável” o novo emprego de Barroso na Goldmann Sachs. E é.