domingo, 30 de junho de 2024

A origem das bombas que destruiram Gaza

A edição de hoje do diário Kuwait Times, que é o mais importante jornal em língua inglesa de todo o golfo Pérsico, destaca como título de primeira página que, desde o dia 7 de outubro de 2023, os Estados Unidos enviaram para as autoridades israelitas 14.000 bombas de 2.000 libras, isto é, bombas de cerca de 907 quilogramas de grande poder destruidor pois “podem rasgar concreto e metal espessos”.
Com base em informações recolhidas em fontes oficiais, tanto em Washington como em Gaza, o jornal informa que desde outubro de 2023, os Estados Unidos “transferiram pelo menos 14 mil bombas MK-84 de 2.000 libras, mais 6.500 bombas de 500 libras, cerca de 3.000 mísseis ar-solo Hellfire de alta precisão, 1.000 mísseis destruidores de bunkers e 2.600 bombas de pequeno diâmetro para lançar do ar, além de outros tipos de munições”. Este apoio atingiu 6,5 mil milhões de dólares e, apesar dos apelos internacionais para que cessasse o apoio militar a Israel, o jornal refere que “as quantidades anunciadas de fornecimentos militares sugerem que não houve quebra significativa no apoio americano a Israel”.
Estas informações estão em linha com o panorama de destruição na Faixa de Gaza, que as imagens televisivas nos mostram, mas também com os anunciados 37.834 mortos, sobretudo mulheres e crianças, anunciados pelas autoridades sanitárias de Gaza.
Como se conclui das informações do jornal, a administração de Joe Biden está totalmente alinhada com o regime de Benjamin Netanyahu e, portanto, é co-responsável pela desproporcionada e cruel repressão que está a ser feita ao povo palestiniano. Algumas declarações moderadoras de Joe Biden ou as múltiplas viagens de Antony Blinken ao Médio Oriente, não são mais do que simples actos de propaganda e de hipocrisia, embora tenham quem as apoie em algumas capitais europeias pois, também elas, vendem armas a Israel.
Este mundo anda mesmo muito perturbado…

Eleições francesas e futuras incertezas

Os franceses vão hoje às urnas e daí que o jornal La Voix du Nord, que se publica na cidade de Lille, em tom de solene proclamação, tenha escolhido a frase: “Aux urnes citoyens!”, como título principal da sua edição de hoje.
Estas eleições deveriam acontecer apenas em 2027, mas foram convocadas pelo presidente Emmanuel Macron após a derrota do seu partido nas recentes eleições de 9 de junho para o Parlamento Europeu, em que se verificou a surpreendente subida do Rassemblement National, o partido da extrema-direita que é presidido por Marine Le Pen.
As sondagens dão a vitória à extrema-direita, com hipóteses de conseguir uma maioria absoluta, o que pode mergulhar a França num cenário de instabilidade que pode contagiar a Europa, enquanto a coligação de esquerda da Nova Frente Popular pode chegar aos 29% e o partido liberal de Emmanuel Macron se ficará pelos 20%. A confirmarem-se estas sondagens, poder-se-à dizer que é uma tempestade política em França e que a segunda volta, que se realizará no dia 7 de julho, nada trará de novo. Macron deve ter sonhado que poderia ser um novo Napoleão inspirador dos franceses, exorbitou no seu protagonismo europeu e descuidou-se internamente, tendo os franceses percebido que ele não passa de um Napoléon de poche.
Porém, esta tempestade política francesa também irá produzir efeitos no conjunto da União Europeia e vai mostrar que não são apenas os franceses que estão descontentes com Macron. Certamente que, noutros estados-membros, também os seus nacionais não estão satisfeitos com o rumo que os seus dirigentes estão a dar aos assuntos políticos europeus, nomeadamente com a questão ucraniana, com os seus discursos belicistas e com o seu seguidismo em relação aos interesses americanos.
A derrota anunciada de Macron é, certamente, um pré-aviso para todos os europeus e, naturalmente, para os portugueses.

sábado, 29 de junho de 2024

A festa do Tour de France vai começar

O Tour de France é uma das mais antigas e mais participadas provas desportivas que se disputam no mundo e que este ano cumpre a sua 111ª edição, que começa hoje na cidade italiana de Florença e termina no dia 21 de julho na cidade francesa de Nice. Ao longo de 21 etapas e de 3.492 quilómetros, muitos deles em alta montanha, haverá 176 ciclistas distribuidos por 22 equipas a lutar para chegarem à meta à frente de todos os outros corredores.
O Tour de France 2024 regista a presença dos grandes nomes do ciclismo mundial – Tadej Pogacar, Jonas Vingegaard, Primoz Roglic, Remco Evenepoel, Mathieu van der Poel e Wout Van Aert – que não costumam correr juntos, pelo que esse facto é mais um factor a aumentar o entusiasmo pela competitividade da corrida, embora o jornal desportivo francês L’Équipe dê todo o favoritismo ao esloveno Tadej Pogacar que há poucas semanas ganhou a Volta à Itália.
Haverá três ciclistas portugueses em prova: João Almeida (12), Rui Costa (114) e Nélson Oliveira (157). De entre eles, será João Almeida, que é companheiro de equipa de Tadej Pogacar, aquele de quem se espera melhor desempenho e até uma boa classificação.
O Tour de France é uma festa para os franceses, talvez mais importante que as eleições legislativas que estão em curso e que os Jogos Olímpicos que virão depois. Muitos milhares de franceses estarão à beira das estradas a vibrar com a caravana ciclista e a apoiar os seus ídolos. A prova terá transmissão televisiva assegurada pelo canal Eurosport e, certamente, os espectadores continuarão a ter a possibilidade de acompanhar a parte desportiva da prova, bem como uma sempre interessante itinerância turística e cultural, que fazem das transmissões televisivas um espectáculo dentro do espectáculo.

António Costa dirige o Conselho Europeu

António Costa foi escolhido por uma maioria qualificada dos líderes dos 27 estados-membros para presidir ao Conselho Europeu a partir de Dezembro do corrente ano e essa escolha é altamente gratificante para Portugal que, em breve, vai ter dois dos seus mais destacados cidadãos a dirigir as Nações Unidas e a União Europeia.
Num discurso proferido em 1965, o ditador Salazar tinha afirmado que Portugal era um país “sem alianças, orgulhosamente só” e aqui temos a prova que o regime instalado com o 25 de Abril de 1974, além da Liberdade, da Democracia e do fim da guerra colonial, ainda nos trouxe o respeito da comunidade internacional.
Embora o presidente do Conselho Europeu não tenha funções executivas e seja um coordenador de 27 líderes, de 27 vaidades, de 27 sensibilidades políticas e de 27 egoismos nacionalistas, o seu desempenho vai ser muito importante para a União Europeia, num tempo em que a França e a Alemanha estão muito fragilizadas, em que a Itália quer maior protagonismo, em que se discutem opções entre “canhões ou manteiga”, em que é necessário parar com a guerra na Ucrânia, em que os americanos estão em pânico perante o seu futuro quadro presidencial, em que os chineses continuam a marchar firmemente para a liderança do mundo e em que os africanos desesperam por um melhor futuro para os seus países.
António Costa vai ter que falar com muita gente, fazer muitas viagens, procurar muitos equilíbrios e consensos, mas os líderes europeus não duvidaram da sua capacidade, nem da sua inteligência política, nem da sua moderação. Lamentavelmente, foi em Portugal que um sistema viciado e vicioso mais procurou destruir António Costa, afastando-o do governo e levantando suspeitas sobre a sua honorabilidade, sem que houvesse indícios ou provas. Muita gente de duvidosa sensatez teve que “engolir um sapo”. Porém, o primeiro-ministro Luís Montenegro esteve à altura das suas obrigações e deu-lhe todo o apoio. Nós também.

sexta-feira, 28 de junho de 2024

O debate-empate entre Biden e Trump

O debate que os candidatos presidenciais americanos sustentaram ontem à noite em Atlanta, não parece ter tido consequências importantes na corrida eleitoral. Os juízos opinativos da imprensa americana estão em linha com o alinhamento dos próprios jornais, em que uns apoiam Biden e outros apoiam Trump, pelo que os efeitos políticos do debate só serão conhecidos mais tarde. Na sua edição de hoje o jornal nova-iorquino Newsday diz que o debate presidencial foi um combate de palavras, o que significa que não se pode classificar o debate como decisivo, enquanto se escreveu que o debate não foi mais do que “90 minutos miseráveis”.
Porém, alguns títulos e algumas afirmações que se podem ler nas entrelinhas de diversa imprensa, parecem mostrar que Joe Biden esteve pior que Donald Trump. O jornal New York Post diz que “assistimos ao fim da presidência de Biden”, que esteve triste, resmungão e até tropeçou, enquanto o britânico Evening Standard escreveu que “Biden estragou tudo”.
O facto é que os Democratas parecem ter ficado em pânico com o desempenho de Joe Biden, havendo quem tenha começado a sugerir a nomeação de um candidato mais jovem para a convenção de agosto do Partido Democrata, lembrando talvez o sucesso histórico de jovens como John Kennedy ou Bill Clinton. 
Donald Trump foi classificado como “o pior presidente da história americana” e foi acusado, uma vez mais, de ter sido o responsável pela insurreição de 6 de janeiro de 2021.Os dois candidatos divergiram em relação à guerra na Ucrânia, pois Biden disse que Putin era “um criminoso de guerra” que quer estender a guerra até aos estados vizinhos que pertencem à NATO, enquanto Trump se referiu a Zelensky como “o maior vendedor do mundo”.
Foi um combate de palavras, ou um debate-empate, que o mundo seguiu com muita atenção e ficado à espera da reacção dos eleitores americanos.

quinta-feira, 27 de junho de 2024

EUA: Biden e Trump em debate televisivo

Hoje à noite, na cidade de Atlanta vai acontecer o primeiro confronto presencial da campanha presidencial americana entre o candidato e actual presidente Joe Biden e o candidato e ex-presidente Donald Trump. A América e o mundo estarão atentos às palavras, aos gestos, às reacções e às gaffes destes dois homens de 81 e 78 anos de idade, que nas eleições do dia 5 de novembro de 2024 procuram ser escolhidos para dirigir a mais poderosa nação do mundo, num tempo de grande perturbação, em que há quem afirme que estamos no limiar de uma terceira guerra mundial.
O debate é organizado pela estação televisiva CNN e, como já foi estudado pela academia, a transmissão dos debates eleitorais tem um poderoso efeito sobre as opções do eleitorado americano. Assim, ambos os candidatos aceitaram o convite da CNN para um debate de 90 minutos que, inevitavelmente, incluirá dois intervalos comerciais, tendo concordado em aceitar as regras e o formato do debate, que ocorrerá sem a presença de público (para evitar aplausos ou apupos) e em que haverá um só microfone ligado de cada vez (para garantir que não haja interrupções, nem que os discursos se sobreponham).
Numa altura em que a luta eleitoral em França está muito acesa, com os franceses a ir às urnas no próximo domingo para escolher os 577 membros da sua Assembleia Nacional, o jornal francês La Dépêche du Midi dedica a sua edição de hoje ao debate entre Trump e Biden e à “nuit américaine”, mostrando como é importante para o futuro do mundo.
A pouco mais de quatro meses das eleições, as sondagens mais recentes mostram que os dois candidatos estão tecnicamente empatados, com Joe Biden a ter 44% das intenções de voto e Donald Trump a receber 43%, embora Joe Biden tenha aprovação negativa em 45 dos 50 estados americanos. 
Neste contexto de incerteza, o debate desta noite é mesmo muito importante.

domingo, 23 de junho de 2024

Uma justa vitória e a alegria portuguesa

A selecção nacional de futebol bateu ontem em Dortmund a selecção turca por 3-0, teve uma prestação que um jornal desportivo português classificou como “exibição de luxo” e já está apurada para a fase seguinte do Euro 2024. 
Foi uma tarde memorável para os adeptos portugueses do futebol, não só pela exibição e pelo resultado, mas também porque o entusiasmo de cerca de 12 mil portugueses que estiveram no estádio calou os 40 mil turcos que foram surpreendidos por uma equipa muito talentosa e muito eficaz. “O apoio que sentimos foi brutal”, disse Bernardo Silva, que marcou o primeiro golo português.
Todos os jornais portugueses, generalistas ou desportivos, destacam hoje este grande êxito futebolístico com manchetes e fotografias, mas a surpresa surge na edição do diário francês L’Équipe, que publicou uma fotografia da festa portuguesa a toda a largura da primeira página e escolheu a frase “Ronaldo encanta”, acrescentando em sub-título que “CR7 se tornou o melhor passeur da história do Euro, ao oferecer um golo a Bruno Fernandes”.
O seleccionar Roberto Martinez, que até aprendeu português e canta o hino nacional, referiu-se ao segundo golo de Portugal dizendo que “esta jogada devia ser mostrada em todas as academias”, pois mostra que o futebol é um jogo de equipa e que Ronaldo, aos 39 anos de idade, é um exemplo para os mais jovens.
Naturalmente, todos os portugueses estão satisfeitos e felizes com a nossa selecção de futebol, embora "ignorem" os sucessos desportivos de atletas como Fernando Pimenta e João Almeida, entre outros. Contudo, é pena que nos tempos que correm não haja muitos mais temas para além do futebol, que façam os portugueses felizes.

sexta-feira, 21 de junho de 2024

As práticas culturais portuguesas em Goa

No século XVI o nosso país foi uma potência marítima à escala global e os portugueses “por mares nunca de antes navegados, passaram ainda além da Taprobana”, tendo sido pioneiros do primeiro esboço da moderna globalização e do primeiro encontro de culturas entre o ocidente e o oriente. Passados cerca de quatro séculos, já pouco resta desse tempo de hegemonia económica e tecnológica dos portugueses, ou da influência cultural que exerceram em tantas geografias distantes.
Essa realidade é observável em diversas regiões marítimas da orla do oceano Índico e, mais recentemente, começa a observar-se também em Macau, em Timor e em Goa.
Por isso, quando na sua edição de hoje o jornal O Heraldo, que desde 1900 se publica em Goa, inclui com destaque de primeira página um anúncio sobre as festas de São João que se realizam em Utorda Beach, no distrito de Salcete, não é apenas uma curiosidade, mas também é um exemplo da sobrevivência da língua portuguesa num território cujas línguas oficiais são o inglês e o concanim. Festejar o São João e não o Saint John, é um pequeno acontecimento mas que é culturalmente relevante, pois mostra que algumas práticas culturais portuguesas têm sobrevivido à natural e progressiva indianização cultural do estado de Goa que, pela natural evolução da vida local, vem acontecendo desde 1961.

Sanjoaninas: a festa maior dos Açores

As nove ilhas do arquipélago dos Açores constituem uma região autónoma integrada na República Portuguesa desde 1976. No conjunto das ilhas ou na especificidade de cada uma, os seus espaços físicos e culturais distinguem-se e impressionam o visitante, quer pela exuberância da paisagem marítima, quer pela singularidade das suas práticas culturais, tanto religiosas como profanas.
De entre todas as ilhas destaca-se a ilha Terceira, pelo seu relevante protagonismo na História de Portugal e por ser a mais “festeira” de todas as ilhas do arquipélago, havendo uma expressão popular que afirma que “os Açores são oito il,has mais um parque de diversões” (que é a ilha Terceira). É na ilha Terceira que se apresentam os bailinhos de Carnaval, que desfilam as marchas populares e que o povo vibra com as touradas à corda mas, sobretudo, se organizam as grandes festas no Verão, em especial nas cidades da Praia da Vitória e de Angra do Heroísmo. Na cidade de Angra, que a UNESCO classificou em 1983 como património da Humanidade, festejam-se as famosas Sanjoaninas, que são consideradas as maiores festas lúdicas dos Açores e que, nesta edição de 2024, celebram os 50 anos do 25 de Abril, sob o tema “Angra: teu nome é Liberdade”.
Entre os dias 21 e 30 de junho, as Sanjoaninas 2024 vão encher as ruas da cidade de Angra do Heroísmo com concertos, gastronomia, tauromaquia, desporto, desfiles, exposições e marchas populares, num encontro de tradição e modernidade em que a marca libertadora do 25 de Abril vai estar presente.
Para quem alguma vez assistiu às Sanjoaninas, facilmente concluiu que a ilha Terceira e a cidade de Angra são mesmo um parque de diversões…

quinta-feira, 20 de junho de 2024

As alianças militares na Ásia Oriental

O líder russo Vladimir Putin visitou a Coreia do Norte esta semana, tendo sido a primeira visita que fez ao país nos últimos 24 anos embora, em menos de um ano, tenha tido um segundo encontro com Kim Jong-un.
Putin foi recebido na cidade de Pyongyang em festa e como um grande amigo, não lhe faltando um tapete vermelho e uma grande cerimónia na Praça Kim Il-sung, com banda militar e danças sincronizadas, como mostra a fotografia publicada pelo The Guardian. Os dois países são aliados desde o fim da guerra da Coreia (1950-1953), mas tornaram-se mais próximos desde a intervenção russa na Ucrânia, que teve o apoio do regime de Kim Jong-un.
A Coreia do Norte é um importante produtor de armamento e tem seguido uma política militarista, agressiva e anti-americana, pelo que este encontro entre Putin e Kim Jong-un, causou natural alarme em Washington e Seul, pois vai muito para além do fornecimento de armas e munições, constituindo uma aliança estratégica que foi formalizada num acordo de parceria global já assinado, que prevê a prestação de ajuda mútua em caso de agressão contra qualquer das partes. Nessa altura, segundo refere a imprensa, Putin referiu declarações dos Estados Unidos e de outros países da NATO sobre o fornecimento à Ucrânia de armas de longo alcance, aviões F-16 e outro armamento para atacar o território russo. Na mesma linha tem actuado Jens Stoltenberg, o secretário-geral da NATO, que usa e abusa de um discurso agressivo para o qual ninguém o mandatou. 
Portanto, temos a escalada em marcha. Provavelmente só as eleições nos Estados Unidos, em França e no Reino Unido poderão mudar o preocupante rumo dos acontecimentos.

Felipe VI e os seus dez anos de reinado

No dia 19 de junho de 2014 o parlamento espanhol proclamou Felipe VI como Rei de Espanha, depois do seu pai Juan Carlos I ter abdicado, num momento em que o então chefe de Estado estava envolvido em polémicas relacionadas com a sua vida íntima e comportamentos pessoais considerados pouco éticos, a que se somaram suspeitas de corrupção que afectavam também outros membros da família real. Felipe VI tinha então 46 anos de idade e, desde então, tem procurado regenerar a imagem da Monarquia, através de medidas concretas de que se destaca a rejeição da herança material do seu pai e o corte com abusos que aconteciam até na sua própria família.
De acordo com a Constituição de 1978, a Espanha é constituída por 17 comunidades autónomas e duas cidades autónomas, dotadas de autonomia legislativa e executiva e, no seu artigo 2º, reconhece e garante “o direito à autonomia das nacionalidades e regiões que compõem o Estado”, dentro da “indissolúvel unidade da Nação espanhola, pátria comum de todos os espanhóis”. Desta forma, a Espanha tem o espanhol como língua oficial, mas tem quatro línguas co-oficiais, que são faladas em seis das 17 comunidades: galego, basco, catalão e aranés. Significa que, perante um quadro tão diverso, o Rei é o símbolo maior de unidade nacional.
Ontem assinalaram-se dez anos de reinado de Felipe VI, com muitas cerimónias e celebrações, parecendo ter havido uma grande unanimidade em torno da sua “ejemplaridad, lealtad y transparencia”, como mostram as primeiras páginas dos principais jornais espanhóis, como por exemplo o Heraldo de Aragón. Porém, a vida política de Felipe VI não tem sido fácil, porque embora tenha havido apenas dois primeiros-ministros durante o seu reinado, respectivamente Mariano Rajoy (PP) e Pedro Sánchez (PSOE), tem-lhe cabido manter um papel de equilíbrio na crise resultante das reivindicações independentistas da Catalunha e na gestão de todas as assimetrias regionais do Reino de Espanha. 
No entanto, o que todos os portugueses desejam é que a Espanha se conserve estável, próspera, pacífica e, sobretudo, seja um bom vizinho.

quarta-feira, 19 de junho de 2024

Um feliz início português no EURO 2024

Ontem aconteceu o arranque português do EURO 2024 com uma vitória “arrancada a ferros” sobre a República Checa, a que agora se vem chamando Chéquia. Antes não se falava noutra coisa que não fosse esse jogo, os jogadores e os adeptos, com cansativas e nada imaginativas reportagens televisivas apresentadas por inúmeros jornalistas que as suas empresas, certamente muito prósperas, fizeram deslocar para a Alemanha. 
Se Luís de Camões cá estivesse, certamente, iria repetir os seus tão cantados versos da estrofe terceira do Canto I de Os Lusíadas:
         Cesse tudo o que a Musa antiga canta 
         Que outro valor mais alto se alevanta.
De facto, "outro valor mais alto se alevantou" e não se falou noutra coisa, como se não houvesse acontecimentos e notícias em Portugal, nem guerra na Ucrânia e em Gaza, nem tensões em Taiwan e no mar da China Meridional, nem eleições em França e no Reino Unido, nem disputas entre Biden e Trump, nem ondas de calor em várias regiões dos Estados Unidos, nem incêndios no Pantanal. Os media e os jornalistas portugueses estavam em Leipzig obcecados com a selecção nacional, acompanhavam os treinos e tratavam de excitar os seus auditórios.
Veio o jogo e correu bem, porque o jovem Francisco Conceição, que entrara menos de dois minutos antes, marcou o golo da vitória aos 92 minutos. Todos vimos esse momento decisivo, que foi um alívio para milhões de portugueses! Os jornais portugueses, generalistas ou desportivos, deram destaque fotográfico a esse momento.
Como curiosidade, a equipa portuguesa bateu dois recordes: Cristiano Ronaldo tornou-se o primeiro atleta a jogar seis fases finais de Europeus de futebol e, com 41 anos e 113 dias de idade, Pepe passou a ser o mais velho jogador de sempre a jogar num Europeu.
Segue-se a Turquia. Voltaremos a falar destes assuntos futebolísticos.

segunda-feira, 17 de junho de 2024

Que o cessar-fogo chegue à Ucrânia

No passado fim-de-semana, por iniciativa do Swiss Federal Council, realizou-se em Bürgenstock, uma estância turística situada em território suiço, uma cimeira com a designação de Summit on Peace in Ukraine, para a qual foram convidados 160 países e organizações internacionais, dos quais houve a participação de 92 países e 8 organizações.  
Na imprensa internacional de hoje – e tive acesso a várias dezenas de jornais – procurei alguma informação sobre a cimeira, mas verifiquei que o assunto não teve destaque de primeira página nos jornais internacionais de referência, como The Washington Post, The Wall Street Journal, The New York Times, The Times, The Guardian, El País, Le Monde, Le Figaro e muitos outros. Apenas vi o assunto ser tratado na primeira página do Le Temps de Genève, do Frankfurter Allgemeine, do La Stampa e do nosso Público, o que mostra que o assunto não foi notícia, ou não foi notícia importante. De facto, há que reconhecer que se tratou de uma operação de marketing a que muita gente se sujeitou desnecessariamente, pois ninguém imagina que o cessar-fogo, as negociações e a paz, possam nascer de cimeiras deste tipo, com tanta gente e tantos assessores. No final da cimeira houve 77 países e quatro organizações que assinaram um comunicado final de apelo à paz com condições simétricas às que a Rússia anunciara dois dias antes, o que mostra quanto a Diplomacia tem que trabalhar. O Brasil, a Índia, a África do Sul, a Arábia Saudita, o México e a Indonésia, foram alguns dos países que se recusaram a assinar o comunicado final. Escreveu-se que a cimeira produziu zero resultados e, de facto, nada de novo aconteceu.
O conflito já dura há tempo demais e já todos viram que ninguém vencerá. A indústria da guerra enriquece, mas todos perdem, sobretudo os povos da Ucrânia. Cada uma das partes foi longe demais e os riscos da escalada são enormes e muito perigosos. Há que procurar a paz com persistência, mas há que fazê-lo com uma abordagem de discrição que gere condições mínimas de confiança entre as partes, com uma abertura para cedências à rigidez das suas actuais posições e, naturalmente, com a "presença" de Zelenshy, Putin, Biden e Xi Jinping.
Certamente que a paz não se conquista com cimeiras como a de Bürgenstock, nem com os discursos de Stoltemberg, de Von der Leyen e, até, do pequeno Macron.

domingo, 16 de junho de 2024

Chico Buarque, 80 anos de vida e talento

Na próxima quarta-feira, o cidadão brasileiro Francisco Buarque de Hollanda que nasceu no Rio de Janeiro no dia 19 de junho de 1944, celebra o seu 80º aniversário. Na sua edição de hoje, o jornal O Globo antecipa com destaque de primeira página, a sua homenagem a “um dos maiores artistas brasileiros de todos os tempos”, como cantor, compositor, violinista, dramaturgo, actor e escritor.
A obra de Chico Buarque chegou a Portugal em 1966 quando venceu o Festival de Música Popular Brasileira com a música “A Banda” e lançou o seu primeiro álbum, que abriu as portas do mercado português à música brasileira. Os grandes nomes da música popular brasileira que os portugueses admiram, vieram todos depois de Chico Buarque – João Gilberto, Tom Jobim, Caetano Veloso, Roberto Carlos, Elis Regina, Maria Bethânia, Nara Leão, Gal Costa e tantos outros.
Chico Buarque em 1975 escreveu “Tanto Mar”, uma canção dedicada a Portugal que teve duas versões. A primeira data de 1975 e saudava a revolução do 25 de Abril, dizendo:
Sei que estás em festa, pá / Fico contente / E enquanto estou ausente / Guarda um cravo para mim.
A segunda versão, com letra modificada depois de Novembro de 1975, foi gravada em 1978 e dizia:
Foi bonita a festa, pá / Fiquei contente / E inda guardo renitente / Um velho cravo para mim.
Os portugueses depressa reconheceram o talento de Chico Buarque e, em 1996, o Presidente Jorge Sampaio condecorou-o com a Comenda da Ordem do Infante D. Henrique. Em 2019 foi-lhe atribuído o “Prémio Camões” que, devido ao obscurantismo político e cultural de Jair Bolsonaro, só veio a receber em 2023. Nesse dia, em Queluz, perante os presidentes de Portugal e do Brasil, Chico Buarque referiu-se ao seu pai, o historiador e sociólogo Sérgio Buarque de Hollanda, “de quem herdei alguns livros e o amor pela língua portuguesa”. 
Aqui fica a nossa modesta homenagem ao grande Chico Buarque!

sexta-feira, 14 de junho de 2024

O futebol e o entusismo pelo Euro 2024

Começa hoje na Alemanha a 17ª edição do Campeonato Europeu de Futebol, organizado pela União das Associações Europeias de Futebol (UEFA), que é habitualmente conhecido como o UEFA Euro 2024 ou, apenas, como o Euro 2024. O famoso jornal L’Équipe, que se publica em Paris, dedica toda a sua edição de hoje a esta festa do futebol.
Serão 24 equipas nacionais a competir para chegarem até ao dia 14 de julho, quando se disputará a final em Berlim. Milhões de europeus – e eu sou um deles – estarão em frente dos televisores a ver os “artistas da bola” e a apoiar as suas selecções, mas a mostrar, também, que o ambicioso projecto europeu que vem sendo construído desde o Tratado de Roma de 1957, ainda não ultrapassou os condicionalismos históricos que caracterizam a Europa das Nações, nem os seus nacionalismos, nem os seus egoismos.
Dentro do campo todos vão procurar esmagar o adversário e ganhar, mesmo que tenham que enganar os árbitros, ou simular penaltis, ou inventar agressões, porque o povo exige-lhes que marquem golos e ganhem, enquanto os governantes carecem de vitórias que lhes sirvam para instrumentalizar as populações.
Nas 16 anteriores edições os vencedores foram a Alemanha e a Espanha (3 vezes cada), a Itália e a França (2 vezes cada) e a Rússia, a Holanda, a Dinamarca, a República Checa, a Grécia e Portugal (uma vez cada).
As equipas estão distribuídas por seis grupos e a equipa portuguesa integra o Grupo F, com as selecções da República Checa, da Turquia e da Geórgia. Os nossos jogadores são talentosos e experientes e os nossos governantes já anunciaram que irão assistir aos jogos. Bem ao seu estilo, o Presidente da República até pediu aos jogadores para só regressarem a Portugal no dia 15 de julho, isto é, como campeões europeus de futebol.
Provavelmente é pedir muito

A paz ainda será possível na Ucrânia?

Na pátria de Gutemberg é enorme a produção de jornais e revistas, embora o nosso desconhecimento da língua alemã torne muito difícil a interpretação das notícias, das reportagens ou dos comentários. Porém, mesmo sem conhecer a língua, a nossa atenção centrou-se na capa da edição de ontem da revista alemã Stern, que é publicada em Hamburgo e tem quase oito milhões de leitores (cerca de 11,5% da população alemã com 14 anos ou mais). A capa reproduz uma ilustração que mostra Zelensky e Putin a cumprimentarem-se sobre o símbolo da paz e do amor. Como era bom que em vez de uma ilustração fosse uma fotografia!
Com a ajuda dessa ferramenta extraordinária que é o Google, fiz a tradução. O título “Ist frieden noch möglich?” significa “A paz ainda é possível?”, enquanto o subtítulo diz que “A semana das negociações: como esta guerra poderia terminar sem o afundamento da Ucrânia".
Estas considerações aparecem no mesmo dia em que o G7 aprova “um pacote de 50 mil milhões de dólares para a Ucrânia” e em que Jens Stoltenberg “pede aos membros da NATO que reconsiderem os limites no envio de armas para a Ucrânia”. Há uma semana foi Macron, já chamado o petit Napoléon, que anunciou “a transferência para a Ucrânia de caças franceses Mirage 2000-5 e um programa de formação de soldados”. Há cerca de um mês, também Rishi Sunak anunciou “um pacote adicional de 500 milhões de libras para fornecer rapidamente munições, defesa antiaérea, drones e apoio de engenharia”.
Paralelamente, vários países prometeram aviões F-16, embora vão dizendo que “não podem ser usados para atacar território russo” e até aquele nosso promissor ministro chamado Nuno Melo já anunciou que “Portugal vai instruir militares ucranianos na utilização de carros de combate”. Ninguém fala em paz, apesar de todos os dias verem os horrores da guerra pela televisão. Só a revista Stern pergunta se a paz ainda é possível, mostrando que todo este belicismo é perigoso e que não é da vontade dos europeus, como se sabe pelo Eurobarómetro e se viu na França e na Alemanha nas recentes eleições europeias.

As festividades em honra de Santo António

Ontem foi o Dia de Santo António, ou o Dia de Santo António de Lisboa, pois o santo casamenteiro que foi Doutor da Igreja nasceu nesta cidade em 1195, vindo a falecer em Pádua em 1231. Lisboa é, portanto, a cidade onde mais se comemora este santo na sua vertente profana, sobretudo na noite de 12 de junho, quando se realizam inúmeros arraiais populares e nos bairros tradicionais se comem sardinhas assadas um pouco por todo o lado, havendo ainda o sempre espectacular desfile das marchas populares na principal avenida da cidade. Porém, as festas de Santo António, realizam-se em muitas outras cidades e vilas portuguesas, mas também no estrangeiro, sobretudo nas comunidades católicas e em especial na diáspora portuguesa.
No Brasil, logo que chega o mês de junho diz-se que “vai começar a festança”, porque se sucedem as festas dos Santos Populares – Santo António, São João e São Pedro. As primeiras são as tradicionais festividades em honra de Santo António, que têm uma forte componente religiosa e ocorrem, sobretudo, no estado do Maranhão e na cidade de São Luís, onde se misturam a religiosidade e a cultura maranhense, como refere a edição de ontem do jornal O Imparcial
Segundo refere aquele jornal que se publica na cidade de São Luís, os festejos sempre aconteceram numa das mais antigas igrejas da cidade, construida em 1867 para completar a grandiosidade do Convento de Santo Antônio inaugurado em 1625, que incorpora a capela do Senhor Bom Jesus dos Navegantes, doada pelos Franciscanos para a Irmandade do Bom Jesus dos Navegantes. No entanto, como se verifica na consulta da programação dos festejos, eles acontecem em cada uma das igrejas da cidade e em muitas localidades maranhenses.

domingo, 9 de junho de 2024

Eleições europeias e guerra na Ucrânia

As eleições parlamentares europeias estão em curso neste fim-se-semana nos 27 estados-membros da União Europeia e, por dever cívico e direito de cidadania, já tratei de votar, embora sem grande entusiasmo. Por cá pouco se sabe sobre o que faz essa instituição que aloja 720 deputados privilegiados e novos-ricos, que ninguém conhece ou sabe o que fazem. Por isso, a ideia de promover temidos, bugalhos ou cotrins a deputados europeus não entusiasma ninguém. Com eles ou sem eles, tudo fica na mesma. Por cá, como na generalidade dos estados-membros, estas eleições servem apenas para consumo interno e para avaliar conjunturas locais, isto é, se Montenegro e PNS, ou Pedro Sánchez e Alberto Feijóo, continuam empatados, se Macron continua em perda para Marine Le Pen, e assim sucessivamemente. Os dois grandes grupos políticos europeus – o Partido Popular europeu (democrata-cristão) e o Partido Socialista Europeu (socialista/social democrata) – têm perdido espaço para a extrema-direita, para os verdes e para os liberais e, por isso, também aí há a curiosidade de ver como evolui a votação de hoje.
A guerra na Ucrânia e a busca da paz deveriam ser a principal preocupação dos europeus. Provavelmente, a maioria dos deputados e dos políticos europeus desconhece os horrores da guerra por que passaram os seus avós e não levantam a sua voz a pedir aos irmãos desavindos da Rússia e da Ucrânia que parem com a catástrofe da guerra e com a escalada que ameaça o mundo e que tratem de construir a paz. Preferem criar narrativas e meias-verdades para alimentar as opiniões públicas e apoiar a florescente indústria militar, à custa da destruição de um país. Hoje o jornal Público apela a que se vote pela Europa e destaca a figura de Camões, pois estamos a celebrar o seu 5º centenário. Daí que aqui citemos as estâncias XCV e XCVI do Canto IV de’Os Lusíadas, para relembrar o aviso do “velho do Restelo”:

Ó glória de mandar! Ó vã cobiça / Desta vaidade a quem chamamos fama!

[…]

A que novos desastres determinas / De levar estes reinos e esta gente?

Quem diria que Joe Biden e Emmanuel Macron, Vladimir Putin e Volodymyr Zelensky, mas também todos os políticos europeus, deveriam ler Os Lusíadas e aprender com o nosso Luís de Camões?

sexta-feira, 7 de junho de 2024

O Dia D como pretexto para mais guerra

No dia 6 de junho de 1944, as tropas aliadas sob o comando do general Dwight Eisenhower desembarcaram nas praias da Normandia e iniciaram a invasão que levou à libertação da França e à derrota do nazismo alemão, cujo líder era Adolfo Hitler. Foi há oitenta anos que as tropas americanas, inglesas e canadianas enfrentaram a chamada “muralha do Atlântico”, num dia que ficou assinalado na História como o Dia D, embora os franceses gostem de lhe chamar o Jour-J, como se vê na capa da edição de hoje do jornal La Dépêche du Midi.
O desembarque da Normandia foi a maior invasão marítima da história do mundo, teve a participação de quase cinco mil veículos de desembarque e de assalto, que foram escoltados por 289 navios e apoiados por 277 draga-minas que, nesse dia, desembarcaram 156 mil homens que atravessaram o canal da Mancha. No primeiro dia da Operação Overlord, nenhum dos objectivos aliados foi atingido e houve cerca de dez mil baixas, incluindo 4.414 mortos confirmados, enquanto do lado alemão houve cerca de mil baixas.
Esta data costumava ser um dia de homenagem a todos os 156 mil homens que desembarcaram naquele dia 6 de junho, honrando os vivos e os mortos, numa evocação histórica de reconciliação, de repúdio da guerra e de apelo à paz. Porém, o presidente Emmanuel Macron, com o apoio de Joe Biden, Olaf Scholz e Rishi Sunak, transformou esta efeméride num estranho e imprudente passo relativamente à guerra da Ucrânia, ao comparar as situações da França de 1944 e da Ucrânia de 2024. Naturalmente que o anfitrião convida quem quiser para as suas festas e, por isso, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky lá esteve, sem que ele ou a Ucrânia tenham alguma coisa a ver com o Dia D, o que apenas contribui para a escalada da guerra e para afastar a paz que o próprio Macron antes tanto procurou.
Não sei o que faz correr o pequeno Macron, de quem os franceses já pouco gostam e que tanto quer, a exemplo de Napoleão, levar os seus soldados para as fronteiras orientais da Europa.

quarta-feira, 5 de junho de 2024

Modi ganhou na India, mas perdeu força

As eleições na Índia, que é o país mais populoso do mundo e que, por vezes, também é classificado como a maior democracia do mundo, terminaram ao fim de 44 dias e os resultados foram finalmente anunciados: Narendra Modi e o seu Bharatiya Janata Party (BJP) ganharam e vão iniciar um terceiro mandato. Votaram 642 milhões de pessoas, cerca de 66% dos 970 milhões de eleitores inscritos, distribuídos por 29 estados federados e sete Union Territories, isto é, territórios directamente dependentes do governo federal instalado em Nova Delhi.
O Lok Sabha, ou Parlamento Nacional, tem 543 assentos, pelo que a maioria parlamentar se consegue com 272 assentos. A Aliança Democrática Nacional (NDA), uma coligação do BJP com outros partidos menores conseguiu 291 assentos. Porém, Narendra Modi e o BJP conseguiram apenas 240 assentos, um resultado pior do que tinham obtido em 2014 (282 assentos) e em 2019 (303 assentos), o que significa que terão que negociar com os seus aliados regionais para governar, uma vez que perderam a maioria absoluta com que governaram nos últimos dez anos, embora o nacionalismo hindu se mantenha no poder. Do lado da oposição, continua o sentimento de orfandade pela falta de Nehru e dos seus descendentes, embora tenha havido alguma recuperação. A coligação Aliança Nacional para o Desenvolvimento Inclusivo da India (INDIA) elegeu 234 deputados, dos quais 99 do Indian National Congress (INC), um dos quais é Rahul Gandhi, bisneto de Nehru.
Estes números são indicados na edição de hoje do jornal O Heraldo, que se publica em Goa, cuja primeira página contém muita publicidade, incluindo uma notícia necrológica relativa a Felicia Cardoz, um nome com evidente conotação portuguesa.
Como curiosidade regista-se que o estado de Goa escolheu um deputado do BJP (North Goa) e um deputado do INC (South Goa) e que o Union Territory of Dadra & Nagar Haveli and Daman & Diu escolheu o candidato do BJP.


Os 500 anos do nascimento de Camões

Luís de Camões nasceu em Lisboa em 1524 e é considerado o maior poeta português por ter escrito “Os Lusíadas”, a obra maior da literatura portuguesa. No mês de maio do ano de 2021, quando se aproximava a celebração dos 500 anos sobre essa efeméride, o governo lembrou esse acontecimento e tratou de aprovar uma Resolução do Conselho de Ministros que determinou a realização das Comemorações do Quinto Centenário do Nascimento de Luís de Camões, tendo nomeado uma comissária e definido a criação de uma estrutura de missão e de diversas comissões.
Porém, nada disto parece ter avançado, à excepção da escolha da comissária, ou seja, passaram-se três anos em que Pedro Adão e Silva andou distraido. Agora que há um novo governo, através da Resolução nº 69/2024, de 3 de junho, o Conselho de Ministros criou a estrutura de missão responsável pelas Comemorações do V Centenário do Nascimento de Luís de Camões, com o objectivo de celebrar o seu contributo para a história da literatura e da língua portuguesas, a terem lugar durante dois anos, a partir de 10 de junho de 2024.
Esta distracção do XXIV Governo Constitucional foi emendada pelo actual governo e não terá prejudicado as iniciativas da sociedade civil, muitas delas já em curso, por exemplo na Universidade de Coimbra, na Biblioteca Nacional, no Arquivo Nacional Torre do Tombo, no Instituto Camões, na Câmara Municipal de Lisboa, em diversos municípios, escolas e até no estrangeiro. Destaca-se, entretanto, a iniciativa do JL – Jornal de Letras, Artes e Ideias, cuja edição mais recente é uma “edição comemorativa dos 500 anos de Luís de Camões”, que se saúda e cuja leitura se recomenda
De resto, deseja-se que estas comemorações sirvam sobretudo para proteger e internacionalizar a língua portuguesa!

segunda-feira, 3 de junho de 2024

José Mourinho sempre à caça dos milhões


O mundo do futebol é cada vez mais um mundo fantástico, que atrai multidões, que satisfaz emoções e que movimenta milhões, sobretudo no período que medeia entre o fim de uma época e o início da época seguinte. Nesse período, a que por vezes se chama o defeso, os clubes desportivos tentam reforçar as suas equipas de futebol através da contratação de jogadores e treinadores, ao mesmo tempo que procuram assegurar as suas fontes de financiamento, através de contratos para as transmissões televisivas ou para a exploração de espaços publicitários, que lhes garantam uma gestão desportiva e financeira equilibrada. Porém, a complicar a gestão dos clubes desportivos estão os adeptos e os seus entusiasmos, que exigem para o seu clube os melhores jogadores, os melhores técnicos e, naturalmente, os melhores resultados.
É nesse quadro que o Fenerbahçe Spor Kulübü, ou simplesmente Fenerbahçe, um importante clube turco de Istambul, tratou de contratar o treinador português José Mourinho. A fama deste treinador é tão grande que os jornais turcos esqueceram o Recep Tayyip Erdoğan, o Biden e o Trump, o Putin e o Zelensky, o Netanyahu e o Stoltemberg, porque, como diria o Camões, um Mourinho “mais alto se alevanta”. É ele que aparece em todas as primeiras páginas dos jornais. Ele é que é a notícia. Dizem os jornais que o treinador português vai ganhar 10 milhões de euros por época, acrescidos de bónus por objectivos atingidos. Não sei se ele é tão bom treinador como os dirigentes do Fenerbahçe pensam que é, mas sei que ele sabe muito de marketing e que sabe vender a sua imagem de marca como poucos, tendo levado os adeptos à loucura, como mostra a capa da edição de hoje do jornal desportivo fotoMaç.
Aos milhares de adeptos que o esperavam no Ulker Fenerbahçe Sukru Saracoglu Stadium, o novo ttreinador mostrou muita sabedoria e disse-lhes o que eles queriam ouvir: “Normalmente um treinador é amado depois de vitórias, mas neste caso sinto que sou amado ainda antes”, ou “esta camisola é a minha pele”, ou ainda, “os vossos sonhos são os meus sonhos”.

domingo, 2 de junho de 2024

Biden, Trump e as eleições americanas

A condenação de Donald Trump que aconteceu no passado dia 30 de Maio por unânime decisão de um júri reunido em Manhattan, foi largamente noticiada pelo mundo, pois trata-se de um homem que é um ex-presidente dos Estados Unidos e que agora está na corrida para regressar à Casa Branca.
Donald Trump reagiu e afirmou que vai recorrer desta sentença, fazendo acusações de que se tratou de um “julgamento fraudulento” e, de acordo com o que ontem citou o jornal inglês The Independent, também afirmou que “nós estamos a viver num estado fascista”. Esta declaração é grave e irresponsável. 
Em ano de eleição presidencial, os americanos estão confrontados com uma grande instabilidade política e com o dilema de escolherem entre o Democratic Party e o Republican Party, ou entre Joe Biden e Donald Trump, ou entre um candidato com 81 e outro com 78 anos de idade. Há cerca de dois anos foi divulgada uma sondagem que mostrava que a maioria dos americanos considerava a instabilidade política a maior ameaça aos Estados Unidos, admitindo o colapso da sua democracia. Desde então as coisas não melhoraram e, pelo contrário, agudizaram-se. Nos seus túmulos, Thomas Jefferson e os signatários da Declaração de Independência dos Estados Unidos de 1776, devem estar muito incomodados pelo espectáculo a que vão assistindo. Recentemente, o eleitorado americano ouviu Joe Biden dizer que Donald Trump “está disposto a sacrificar a democracia para voltar ao poder” e, depois, ouviu Trump dizer que “Biden é a verdadeira ameaça à democracia”. Agora, o mesmo Trump, diz queb“nós estamos a viver num estado fascista”.
Na vida política portuguesa, estamos habituados a ouvir críticas e acusações entre candidaturas rivais, mas esta confrontação made in America é muito mais profunda e altamente preocupante, porque não diz respeito apenas aos Estados Unidos, mas também respeita ao equilíbrio mundial.