sábado, 9 de março de 2024

MH370: um mistério ainda por esclarecer

Aconteceu há dez anos e o caso continua por desvendar, tendo sido ontem recordado pelo jornal La Dépêche du Midi, que se publica em Toulouse.
No dia 8 de março de 2014 o voo MH370 da Malaysia Airlines, operado por um Boeing 777, largou do aeroporto internacional de Kuala Lumpur, na Malásia, com destino a Pequim, levando a bordo 227 passageiros e 12 tripulantes. Cerca de uma hora depois, quando sobrevoava o golfo da Tailândia com rumo a Pequim, o avião desapareceu dos radares e deixou de comunicar com terra. As autoridades chinesas de imediato enviaram navios de busca para a possível área de sinistro, mas os sinais encontrados e os resultados foram inconclusivos. A área de busca alargou-se, mas as informações eram desencontradas, com referências a manchas de óleo e possíveis destroços. Surgiu então a teoria de que o avião alterara a sua rota e as áreas de busca alargaram-se. Uma semana depois já havia 26 países envolvidos nas operações de busca com navios e aviões, tanto no mar do Sul da China como no oceano Índico, recorrendo-se também a vasta informação recolhida por via satélite. Aceitou-se então que o avião caíra no oceano Índico, mas no dia 30 de abril as buscas aéreas foram oficialmente encerradas.
Sete meses depois, iniciou-se uma nova fase de buscas com recurso a novos e mais potentes sonares, mas no dia 29 de janeiro de 2015, quase onze meses depois do desaparecimento do voo MH370, foi oficialmente aceite que se tratou de um acidente e que os 239 ocupantes do avião tinham morrido. Em finais de julho de 2015 foi encontrada uma parte da asa do avião junto da ilha da Reunião e outras peças do avião firam encontradas no Índico ocidental.
Em Janeiro de 2017 e três anos depois do acidente, as buscas foram oficialmente terminadas. Terão sido gastos 145 milhões de dólares nas buscas, tendo sido a mais complexa e mais cara operação deste tipo na história da aviação, mas o mistério continua sem que seja encontrada uma explicação.

sexta-feira, 8 de março de 2024

Violência e morte a norte de Moçambique

Há quase sessenta anos, no cumprimento de funções militares-navais no norte de Moçambique, visitamos com muita frequência as três dezenas de ilhas do arquipélago das Quirimbas e, de modo especial, a ilha do Ibo e a ilha Quirimba, que eram ambas habitadas.
A ilha do Ibo tem um passado histórico ligado aos tempos da escravatura, foi a sede da Companhia do Niassa e, até à independência moçambicana, a vila do Ibo foi sede de uma circunscrição territorial do distrito de Cabo Delgado. Quase contígua, encontra-se a ilha Quirimba, onde vivia uma família de origem alemã, que mantinha alguns negócios com base no óleo de palma e dava emprego a muitos naturais. Das três dezenas de ilhas do arquipélago, o Ibo e a Quirimba destacavam-se pelo elevado grau de ocidentalização de muitos dos seus habitantes e pela beleza da sua paisagem marítima, os areais e os recifes de coral, os mangais e os palmares, a cor das águas, bem como alguns vestígios de antigas fortificações portuguesas.
Em finais de 2017 começaram a manifestar-se no distrito de Cabo Delgado algumas acções muito violentas de insurreição islâmica conduzidas pelo grupo Ansar al-Sunna, que pretende criar um Estado Islâmico em Moçambique. As populações foram violentadas e daí resultaram cerca de 500 mil refugiados, tendo aquele grupo islâmico conseguido ocupar durante algum tempo algumas povoações litorais como Palma e Mocímboa da Praia, sem que as Forças de Defesa e Segurança (FDS) tivessem conseguido opor-se-lhe eficazmente. Os investimentos internacionais no petróleo e no gás da bacia do Rovuma estiveram suspensos. Porém, desde há vários meses que a situação parecia controlada. 
Agora, segundo anunciou ontem a folha informativa mediaFax, que se publica diariamente no Maputo, ”os terroristas entraram e ocuparam a ilha Quirimba sem qualquer reacção e oposição das Forças de Defesa e Segurança” e “parece que continuam a reinar e a governar”. Diz aquela folha que “há relatos de perseguição e decapitação de agentes das FDS na ilha” e que, na vizinha ilha do Ibo, "o ambiente de medo tomou conta da ilha".
Esta notícia é altamente preocupante e mostra como as FDS moçambicanas não conseguem impedir os avanços dos radicais islâmicos, mas também é chocante e dolorosa para quem conheceu intensamente aquelas ilhas, que imaginava serem um paraíso na costa oriental africana.

quinta-feira, 7 de março de 2024

A crise da habitação instala-se na Europa

Por circunstâncias diversas estamos na recta final de uma longa campanha eleitoral e a votação vai realizar-se no próximo domingo. Naturalmente que se deseja uma elevada participação dos eleitores, não só para exprimirem as suas escolhas, mas também para dar maior confiança aos escolhidos que irão ocupar as cadeiras da Assembleia da República.
As campanhas eleitorais dos partidos concorrentes são sempre um animado espectáculo para mobilizar os seus apoiantes e para capturar o voto dos indecisos, com muitas promessas aos eleitores e muitas críticas aos adversários, deixando para segundo plano a apresentação dos respectivos programas e a discussão dos temas dominantes que mais interessam ao eleitorado. Tem sido sempre assim, mas agora está pior, porque as promessas partidárias são demasiado irrealistas e esquecem sempre que os nossos recursos não são ilimitados. Todos querem mais salário, mais emprego, mais habitação, mais tudo... É verdade que há muito para fazer e para melhorar nos sectores da Saúde e da Educação, da Justiça e da Segurança, bem como em todos os sectores da nossa Sociedade. Porém, parece haver um egoismo corporativo e faltar uma ideia mobilizadora para os portugueses, semelhante à famosa expressão de John Kennedy: “Não perguntem o que é que o vosso país pode fazer por vocês, perguntem o que é que vocês podem fazer pelo vosso país”.
O jornal Le Monde destacava como manchete na sua edição de ontem que “La crise du logement s’installe dans toute l’Europe” e acrescentava que “da Suécia à Espanha, passando pelos Países Baixos e pela Grécia, as classes médias têm cada vez mais dificuldade em encontrar habitação nos centros das grandes cidades. A construção é insuficiente e o excesso de turismo acentuaram a escassez, enquanto os preços permanecem elevados”. A Habitação é, portanto, um problema europeu e não especificamente português, mas isso não travou os demagogos que não se cansaram de repetir promessas de “uma casa para todos” durante a campanha eleitoral.

quarta-feira, 6 de março de 2024

A festa da vitória e o beijo mais famoso

A edição de hoje do jornal New York Post deixa para segundo plano a Super Terça-feira eleitoral americana e dedica a sua manchete ao famoso beijo de 14 de agosto de 1945. Nesse dia, quando se festejava com entusiasmo a rendição final do Japão, o fotógrafo Alfred Eisenstaedt da Time & Life fez uma fotografia na Times Square em Nova Iorque, que mostra o marinheiro George Mendonsa a beijar a enfermeira Greta Zimmer. 
Esta fotografia tornou-se um ícone da vitória americana sobre o Japão, até que na passada semana, a senhora Rima Ann Nelson, subsecretária de Assuntos de Veteranos dos Estados Unidos, declarou aquela famosa foto "inapropriada" porque o beijo não foi consensual e determinou que essa fotografia fosse “imediatamente” removida de todas as instalações do Veteran Affairs. Felizmente para o bom senso, o secretário de Assuntos dos Veteranos, Denis R. McDonough, reverteu a decisão da sua subsecretária.
A história deste beijo é muito curiosa e aparece relatada no New York Post. O marinheiro George Mendonsa tinha 23 anos de idade e acabara de regressar das Filipinas. Encontrou-se com a sua namorada Rita Petry de 20 anos de idade e, juntos, foram juntar-se aos milhares de pessoas que festejavam o fim da guerra em Manhattan. Quando chegaram a Times Square, o George viu a enfermeira Greta Zimmer e, por momentos, deixou a Rita e agarrou-se àquela enfermeira num emocionado beijo, lembrando-se das enfermeiras que vira a retirar das águas do Pacífico algumas centenas de tripulantes do USS Bunker Hill, que fora afundado por dois kamikases japoneses.
O marinheiro George Mendonsa casou-se com a Rita Petry e a sua filha Sharon Molleur, agora com 67 anos de idade, revelou que os pais vieram a ser amigos próximos de Greta Zimmer. Esta é a história que hoje nos conta o jornal e que aqui se reproduz, numa love story bem ao estilo americano.

segunda-feira, 4 de março de 2024

Uma crónica taurina na praça de Olivença

O jornal el Periódico de Extremadura, que se publica na cidade de Cáceres, dá hoje grande destaque à Feria Taurina de Olivenza, que foi organizada pelo Ayuntamiento de Olivenza, mostrando uma fotografia a quatro colunas da principal corrida de touros realizada.
Quando da apresentação da feira e conhecendo a polémica existente em torno da tauromaquia, o alcaide de Olivença chamado Manuel González Andrade – um nome a revelar origem portuguesa, numa cidade que foi ocupada pelos espanhóis em 1801 e nunca foi devolvida como determinou o Tratado de Viena de 1815 – pediu “respeto pelo mundo del toro” e disse que “al que le guste que vaya a los toros y al que no le guste que no vaya, pero que respete la fiesta”, acrescentando que a feira taurina de Olivença constitui um cartaz de promoção da cidade, que atrai “amantes de la tauromaquia” de Sevilha, Salamanca, Lisboa e Córdoba.
A Feria Taurina de Olivenza realiza-se desde 1990 e está declarada “de interés Turístico Nacional”. Nesta sua 33ª edição, contou com duas corridas de touros e duas novilhadas com picadores que, na presente temporada, constituíram o primeiro grande evento da festa brava espanhola. Na principal corrida da festa realizada ontem com touros dos irmãos Garcia Jiménez e Olga Jiménez, actuaram o matador sevilhano Morante de la Puebla, o jovem toureiro peruano Andrés Roca Rey e Juan Ortega, um toureiro sevilhano que é engenheiro agrónomo pela Universidade de Córdoba.
Dizem as crónicas que Roca Rey e Juan Ortega “cortaram orelhas”, mas que Morante de la Puebla não teve sorte na sua lide mas que, talvez por respeito aos seus 44 anos de idade, apenas foi ovacionado, enquanto os relatos de quem esteve em Olivença dizem que, entre os cinco mil e seiscentos aficionados que assistiram à corrida de touros, havia muitos portugueses.

Super Tuesday e corrida de octogenários

Para os eleitores americanos amanhã é a Super Tuesday, ou a Super Terça-feira, pois em 15 estados e um território – Arkansas, Califórnia, Colorado, Maine, Massachusetts, Minnesota, Carolina do Norte, Oklahoma, Tennessee, Texas, Utah, Vermont, Virgínia e no território de Samoa Americana – serão realizadas as eleições primárias. Os eleitores irão escolher os delegados desses espaços à Convenção Nacional de cada um dos dois grandes partidos americanos e tudo aponta para que Donald Trump e Joe Biden irão ser os escolhidos, pelo que parece assente que irão repetir o duelo presidencial de 2020.
As sondagens indicam, para ambos os partidos, que aqueles candidatos estão em larga vantagem face aos seus concorrentes. Porém, enquanto as hostes de Trump parecem estar a viver uma onda de grande dinamismo, as fileiras de Biden estão a sentir a falta de entusiasmo dos eleitores, bem como as fragilidades do actual presidente que continua com valores de popularidade muito baixos.
O duelo presidencial que se avizinha na mais poderosa nação do planeta é importante para o mundo e a edição de hoje do jornal alemão Tagesspiegel, que se publica em Berlim, destaca o duelo da Super Terça-feira que, de forma indirecta, amanhã vão travar Joe Biden e Donald Trump. A campanha eleitoral americana é uma verdadeira corrida de octogenários e aqueles que têm o privilégio de ter chegado aos oitentas, sabem muito bem que “a condição já não é o que era”, como nos sugere uma conhecida frase publicitária que nos diz que “a tradição já não é o que era”. Todos gostariam que nessa corrida estivessem corredores mais novos e, por isso, o mundo está muito apreensivo com a escolha que os americanos vão fazer.

domingo, 3 de março de 2024

Eleições e sondagens para todos os gostos

Na sequência da demissão do primeiro-ministro António Costa, vão realizar-se no próximo domingo as eleições antecipadas para escolher os deputados da nova Assembleia da República. É um momento importante da nossa vida colectiva e, por isso, é desejável que os cidadãos se esclareçam, que façam escolhas e que aconteça uma alargada participação eleitoral.
Vivemos em democracia e, por isso, são várias as forças políticas que se apresentam ao eleitorado com os seus candidatos, os seus programas e as suas intenções, em campanhas eleitorais dinâmicas e dispendiosas, muitas vezes transformadas numa desproporcionada festa e num rodopio de promessas, em que o esclarecimento dos eleitores é a coisa que menos interessa. Os debates televisivos também não servem para esclarecer os eleitores, pois não passam de exibições de candidatos e de uma verdadeira caça ao voto.
Os efeitos das campanhas eleitorais são muito limitados, como Paul Lazarsfeld já concluira em 1944 na sua obra de referência The People’s Choice, pois o seu objectivo é apenas o de fidelizar os eleitores que já fizeram as suas escolhas e de atrair os eleitores ainda indecisos. As sondagens de opinião realizadas e divulgadas durante a campanha eleitoral, tal como as campanhas eleitorais, também visam a mobilização dos indecisos.
No caso das eleições parlamentares do próximo domingo, há quatro ou cinco sondagens que satisfazem todos os gostos, mas que enganam os eleitores, pois umas dizem que o A vai ganhar ao B, enquanto outras garantem que é o B que vai ganhar ao A. As empresas de sondagens ganham com este negócio e os meios de comunicação social que as divulgam, mostram os seus alinhamentos partidários disfarçados de independência e de objectividade. Hoje temos a sondagem da Aximage para o JN/DN/TSF (PS com 33,1% contra 29,6% da AD), a sondagem do ICS e ISCTE para a SIC/Expresso (AD com 21% contra 20% do PS) e a sondagem da Universidade Católica (AD com 33% contra 27% do PS). Com resultados tão diferentes, algumas destas sondagens não podem ser sérias. São manipulações da realidade sociológica para influenciar os eleitores. São mentiras que se disfarçam de seriedade.

sexta-feira, 1 de março de 2024

Israel e a cumplicidade da Europa

A indiferença do irresponsável e perigoso belicismo de Macron e de Ursula von der Leyen, que ontem aqui foi denunciado, bem como os seus silêncios sobre o que se passa na Faixa de Gaza e a não condenação de Israel pela sua desproporcionada violência e desumanidade, teve ontem mais um doloroso episódio. Segundo relata, na sua edição de hoje, o jornal inglês The Guardian, um numeroso grupo de palestinianos famintos e desesperados, aglomerou-se em torno dos camiões de ajuda humanitária recém-chegados à periferia da cidade de Gaza, na esperança de conseguir comida. Naturalmente, a situação deve ter-se tornado caótica e, impressionadas pela confusão a que assistiam, as tropas israelitas decidiram intervir e abriram fogo sobre os civis palestinianos que, em pânico, começaram a fugir, tendo muitas deles sido atropelados pelos camiões ou espezinhados pela multidão. Como consequência dos tiros e dos atropelamentos terão morrido 112 pessoas e mais de 760 ficaram feridas neste incidente, que foi considerado como um dos mais mortíferos desde o início da guerra em Gaza. Embora estes números não tenham sido confirmados de forma independente, um porta-voz israelita limitou-se a afirmar que “foi uma resposta limitada”.
O facto é que foi mais uma grande tragédia e, de imediato, vários países juntaram-se às Nações Unidas para repudiar este episódio e para exigir uma investigação independente, com os países árabes à cabeça, nomeadamente a Turquia, que salientou que se tratou de “mais um crime contra a Humanidade”.
Exceptuando o jornal The Guardian, a generalidade da imprensa europeia não noticiou ou não deu destaque a este grave incidente, nem são conhecidas quaisquer declarações relevantes de líderes europeus sobre este caso, isto é, continua a haver muita cumplicidade da Europa que não condena os excessos israelitas. 

A miopia de Macron e de Von der Leyen

Alguns líderes europeus andam muito desorientados e parece que não dão prioridade aos grandes problemas com que os seus povos se defrontam, como acontece com as alterações climáticas, a transição energética, a crise migratória, o envelhecimento da população, a desigualdade económica e social, o populismo político e, nas últimas semanas, a contestação dos agricultores.
Ouvimos o que dizem Emmanuel Macron e Ursula Von der Leyen, entre outros dirigentes europeus, parecendo que o único problema da Europa é o conflito da Ucrânia, que é cada vez mais um barril de pólvora e sobre o qual não falam em paz, mostrando um belicismo inaceitável e uma firme condenação da Rússia. Porém, esses mesmos dirigentes, ainda não assumiram uma firme condenação de Israel, isto é, condenam a Rússia e apoiam a Ucrânia, mas não condenam Israel nem apoiam a Palestina. São dois pesos e duas medidas.
Macron e Von der Leyen estão a prestar um mau serviço à União Europeia e aos europeus. No caso de Israel devem pesar-lhe na consciência os mais de 30.000 palestinianos mortos em Gaza, dos quais dois terços são mulheres e crianças, como hoje revelou o jornal Libération
Macron e Von der Leyen estão a revelar-se irresponsáveis promotores de uma catástrofe que muitos anunciam, havendo mesmo quem os acuse de estarem a criar as condições que podem provocar uma terceira guerra mundial, ao assumirem-se como defensores da guerra e como importantes fornecedores do armamento que alimenta as guerras na Ucrânia e em Gaza.
Ucrânia e Rússia, Gaza e Israel. Duas guerras. Duas necessidades urgentes de paz.

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Efeitos colaterais da guerra na Ucrânia

As declarações de Emmanuel Macron na “Conférence de Soutien à l’Ukranie” que se realizou em Paris na passada segunda-feira foram muito criticadas e alguns comentadores declararam que o presidente da França foi longe demais.
Depois de dois anos de guerra na Ucrânia e de tanta destruição, parece evidente que é necessário parar e negociar. Não há alternativa. A Europa está farta de ver imagens da brutal tragédia e de ouvir falar de mísseis e de drones, de Leopards e de F16.
Ao sugerir o envolvimento de tropas da NATO na Ucrânia, o presidente Macron mostrou que não conhece o pensamento dos europeus, revelando um perigoso grau de ambição pessoal e de irresponsabilidade. Se isso viesse a acontecer, seria o início de uma guerra de proporções inimagináveis. A derrota da Rússia, que Macron e outros líderes desejam, deve ser procurada à mesa das negociações e não pela via das armas.
A Polónia acompanha com redobrada atenção a situação ucraniana, que é demasiado complexa em vários sentidos, mas a solidariedade europeia também é complexa, como revela a edição de hoje do jornal polaco Gazeta Wyborcza, que se publica em Varsóvia. Enquanto anuncia em primeira página que “a França não descarta a intervenção da NATO na Ucrânia”, o principal destaque da edição é o protesto dos agricultores polacos que bloquearam estradas e passagens fronteiriças, tendo realizado “a maior manifestação de sempre” no centro de Varsóvia, para exigir ser protegidos da concorrência desleal. O protesto polaco é, sobretudo, contra a importação intensiva de cereais ucranianos no espaço comunitário, que a União Europeia isentou de taxas alfandegárias devido à invasão russa.
E aqui está como a Polónia, que historicamente sempre foi ameaçada pela Alemanha e pela Rússia, vê com simpatia a eventual presença da NATO na Ucrânia, mas não vê com bons olhos a solidariedade europeia para com a Ucrânia.

Emmanuel Macron pequenino e tão vulgar

Após dois anos de guerra na Ucrânia e numa altura em que o Papa Francisco pede uma “solução diplomática em busca de uma paz justa e duradoura”, o presidente francês Emmanuel Macron decidiu convidar “os aliados da Ucrânia” para se reunirem em Paris, numa cimeira destinada a garantir a derrota da Rússia. Quando os Estados Unidos parecem cada vez mais afastar-se do conflito ucraniano, o presidente Macron decidiu “pôr-se em bicos de pés”, afirmando que “nous ferons tout ce qu’il faut pour que la Russie ne puisse pas gagnar cette guerre”, tendo anunciado novos fornecimentos de armas ao regime de Kiev e recusado excluir o envio de tropas ocidentais no futuro. 
"Escolheu a escalada", com hoje refere um jornal francês. Esta declaração feita perante duas dezenas de chefes de estado e de governo causou um “choque eléctrico” e deixou Macron isolado, como hoje noticia o jornal Le Figaro e outros jornais franceses. Numa sondagem online que está activa no jornal La Dépêche du Midi, verifica-se que 90% dos franceses criticam esta posição “imprudente” e solitária de Macron, enquanto Joe Biden, Olaf Scholz e vários líderes europeus se demarcaram destas declarações, recusando o envio das suas tropas para o teatro de guerra ucraniano.
Perante as trágicas imagens que diariamente nos chegam da guerra e da catástrofe humanitária que está criada na Ucrânia, o senhor Macron deveria imaginar soluções para poupar o sacrifício dos ucranianos, em vez de “lançar gasolina para a fogueira”, até porque parece ignorar a grave situação que lhe está a bater à porta, de que são exemplo as manifestações dos agricultores europeus em mais de uma dezena de países e em várias cidades como Bruxelas, Varsóvia, Paris ou Madrid.
Em vez de dirigentes excepcionais de que a Europa tanto precisa, vemos Emmanuel Macron a revelar-se como um homem pequenino, vulgar e com um estatuto que até envergonha os franceses.

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

Jair Bolsonaro nega tentativa de golpe

A cidade brasileira de São Paulo assistiu ontem a uma grande manifestação convocada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, que juntou um pico de cerca de 185 mil pessoas na avenida Paulista, segundo foi calculado a partir de 43 fotos aéreas feitas durante a manifestação e que foram tratadas por um software específico utilizado pela Universidade de São Paulo. A manifestação foi convocada para protestar contra as investigações em curso relativas à suspeita de participação do próprio Bolsonaro na tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro de 2023, que negou ter tentado fazer um golpe e reclamou a sua inocência.
Bolsonaro, alguns ex-ministros, assessores e militares são alvo de um inquérito dirigido pelo Supremo Tribunal Federal, que investiga o assalto à Praça dos Três Poderes, os actos de vandalismo praticados e a tentativa de golpe de Estado.
Segundo a edição de hoje do jornal Folha de São Paulo, o ex-presidente Jair Bolsonaro declarou que “o que eu busco é a pacificação, é passar uma borracha no passado, é buscar maneira de nós vivermos em paz”. Pediu a concliação entre os brasileiros e a amnistia “para aqueles pobres coitados que estão presos em Brasília”, dirigindo-se a todos os 513 deputados e 81 senadores para promoverem um projecto nesse sentido.
Esta manifestação e este quase apelo de Bolsonaro à pacificação, estará certamente a ser trabalhada porque, embora suscite dúvidas quanto à sua sinceridade, pode ser uma janela de oportunidade para a construção de uma renovada unidade nacional da sociedade brasileira e para o reforço da democracia.

sábado, 24 de fevereiro de 2024

Dois anos de guerra entre Moscovo e Kiev

Passaram dois anos desde o dia em que a Rússia invadiu a Ucrânia e, nas suas edições de hoje, muitos jornais europeus evocaram essa data. O diário inglês The Independent é um desses jornais e destaca em primeira página que “se a Ucrânia perder, o Ocidente será o próximo”, acrescentando que em dois anos de guerra pelo menos 10.582 civis ucranianos morreram, 19.875 foram feridos e que se estima que 70.000 soldados ucranianos foram mortos.
Nenhum dos muitos jornais que evocaram o dia 24 de fevereiro de 2022 e a guerra que desde então tem devastado as regiões do Leste da Ucrânia, fala em paz ou nos caminhos da paz, apesar dos sentimentos dos cidadãos europeus revelados no recente estudo do European Council on Foreign Relations. Como principal conclusão, esse estudo revela que 37% dos cidadãos europeus reclamam por negociações de paz, com destaque para os gregos (47%), os espanhóis (44%), os italianos (43%) e, até mesmo, os portugueses (35%).
Apesar desse sentimento nacional a favor da paz, o Supremo Magistrado da Nação veio dizer que “Portugal apoiará a Ucrânia pelo tempo que for preciso” e o ministro cravinho afirmou que “temos que redobrar os esforços de apoio à Ucrânia”. Numa altura de grande inquietação quanto ao nosso futuro, com demasiados problemas internos para serem resolvidos, aqueles dois responsáveis portugueses podiam ter falado da paz por que anseiam tantos europeus, mas não o fizeram. Referiram lugares comuns e a frase “o tempo que for preciso”, já antes repetida muitas vezes, quando se podiam ter aconselhado com António Guterres, que hoje afirmou que "chegou a hora de haver paz". É sabido que nunca é fácil parar com a guerra nem com todas as desgraças humanitárias e patrimoniais que a acompanham e, de forma especial, não é fácil acabar com esta guerra russo-ucraniana, que tem contornos de guerra civil ou de afrontamento entre superpoderes.
É cada vez mais evidente que nesta guerra não haverá vencedores e que todos serão perdedores, pelo que é cada dia mais urgente calar os canhões e atender à vontade dos 37% de europeus e 35% de portugueses que aspiram por negociações de paz.

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

R.I.P. Artur Jorge

Com 78 anos de idade faleceu ontem o cidadão Artur Jorge Braga de Melo Teixeira, conhecido no mundo do futebol apenas como Artur Jorge. 
Foi um talentoso futebolista que, como avançado, integrou as equipas do FC Porto, Académica de Coimbra, SL Benfica e CF Os Belenenses, mas também a selecção nacional que representou 16 vezes. A partir de 1980 iniciou uma carreira de treinador de futebol, tornando-se o primeiro treinador português a triunfar na Liga dos Campeões Europeus na época de 1986-1987, quando a equipa do FC Porto bateu a equipa do Bayern de Munique em Viena. Enveredou depois por uma carreira internacional treinando várias equipas em França, Espanha, Holanda, Arábia Saudita, Rússia e foi seleccionador das selecções de Portugal, Suiça e Camarões. Hoje há vários treinadores com sucesso internacional, mas Artur Jorge foi o primeiro.
Era um universitário, um intelectual e um homem de cultura, que deixou obra poética publicada, mas também teve intervenção cívica em defesa dos valores da liberdade e da democracia, pelo que sempre foi uma referência do futebol português, sobretudo porque olhava para o futebol como uma arte e não como o negócio em que se tem transformado.
A imprensa portuguesa, sobretudo a imprensa desportiva, homenagearam-no nas suas edições de hoje, enquanto os jornais franceses L’Équipe, Le Parisien e Le Figaro, também lembraram a sua memória e, nas suas edições de hoje, anunciaram a sua morte nas suas primeiras páginas.

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2024

Os novos aviões comerciais chineses

Está a decorrer até ao dia 25 de fevereiro em Singapura, o famoso Singapore Airshow 2024 “onde os melhores da aviação se encontram”, como anuncia a sua promoção. Este evento realiza-se bienalmente desde 2008 e é o maior mercado asiático dos sectores aeronáutico e aeroespacial, onde se encontram a oferta e a procura mundiais, através das grandes empresas e das delegações governamentais e militares de alto nível. Este ano regista-se a participação de mais de mil empresas e são esperados mais de 50.000 participantes comerciais provenientes de mais de 50 países. Para além dos seus aspectos de apresentação tecnológica e de promoção comercial, o airshow foi enriquecido com a participação de equipas de acrobacia aérea da Índia, Indonésia, Austrália, Coreia do Sul e Singapura, bem como de um Airbus A350-1000, que é a maior aeronave bimotora da Europa com 74 metros de comprimento e que pode acomodar até 366 passageiros.
Porém, a China parece estar a assumir o maior protagonismo no Singapore Airshow 2024, pois apresentou dois aviões de passageiros C919 fabricados pela Commercial Aircraft Corporation of China (Comac) e três jactos ARJ21, que se estrearam com demonstrações de voo.
Durante muito tempo a China esteve ausente da competição aeronáutica mundial, dominada pelo duopólio Airbus/Boeing nas aeronaves com mais de 100 assentos mas, apesar da sua forte dependência da tecnologia ocidental, parece agora querer concorrer com aquelas empresas. Segundo revelou o jornal Shanghai Daily, duas empresas chinesas de serviços aéreos – a Tibet Airlines e o Henan Civil Aviaation Development and Investment Group – assinaram contratos para a aquisição de 40 aviões C919 e 16 unidades ARJ21. É um começo, mas só o tempo dirá se a indústria aeronáutica chinesa tem pés para andar num caminho em que estão bem instalados a Airbus e a Boeing.