sábado, 4 de novembro de 2023

Invernias e tempestades: elas aí estão!

A costa ocidental da Europa foi afectada esta semana pela tempestade Ciarán, que foi classificada como “uma das mais mortíferas dos últimos anos a atingir o continente”, com ventos que atingiram os 200 quilómetros por hora e que provocaram forte agitação marítima, o que afectou o tráfego marítimo e obrigou ao encerramento de vários portos. Diversos países reportaram situações de chuva e neve intensas, que perturbaram os movimentos aeroportuários, a circulação ferroviária, o fornecimento de energia eléctrica e, de uma forma geral, a vida quotidiana das pessoas. Registaram-se inundações, queda de árvores e houve o registo de, pelo menos, 16 mortes em vários países.
A imprensa espanhola, francesa e inglesa deu notícia desta tempestade e ilustrou várias das suas edições com as imagens, sempre espectaculares, da agitação marítima e dos seus efeitos. As costas basca e cantábrica, na orla sul do golfo da Biscaia, foram particularmente afectadas e a fotografia da capa do jornal El Correo, que se publica em Bilbao, é apenas um exemplo da fúria das ondas. Em Portugal, que não estava no centro da depressão, o mais grave acontecimento provocado pela tempestade Ciarán, foi o naufrágio de um veleiro dinamarquês ao largo de Peniche, no qual pereceram quatro pessoas. Porém, o que é de ter em conta é que o tempo das invernias e das tempestades está de volta...

sexta-feira, 3 de novembro de 2023

As riquezas naturais e culturais dos Açores

O aeroporto da Ilha do Pico e a montanha
Uma visita às ilhas dos Açores, mesmo nesta época do ano em que a meteorologia é mais imprevista, é sempre um acontecimento muito emocionante. As ilhas açorianas, sobretudo no Grupo Central e em especial nas chamadas ilhas de baixo, mostram sempre “a frescura das manhãs em que se chega”, como se lhes referiu Fernando Pessoa. As suas paisagens marítimas animadas pelo voo das gaivotas, dos cagarros e dos garajaus, mais o intenso azul do mar, o verde das pastagens salpicadas por mansas vacas e o casario branco das povoações onde se destacam as torres das igrejas, são um deslumbramento e moldam um quadro de ruralidade e de tranquilidade que contrasta com o quotidiano agitado que se vive nas cidades.
A situação periférica destas ilhas atlânticas foi sempre um handicap que penalizou os açorianos em muitas das suas aspirações, mas que permitiu o desenvolvimento de práticas culturais específicas de grande qualidade estética, profanas e religiosas, observáveis por exemplo nas festividades do Divino Espírito Santo e na arquitectura dos impérios, mas também na música, na literatura e em diversas artes manuais, desde o scrimshaw ao bordado e, ainda, nas artes da construção naval e da baleação.
Depois de revisitar todo este rico panorama natural e cultural, o visitante fica naturalmente mais enriquecido e, certamente, com vontade de conhecer as particularidades culturais de cada ilha e até de cada comunidade dentro da mesma ilha.
A fotografia aqui publicada foi captada ontem em contraluz e mostra o aeroporto da ilha do Pico e, em segundo plano, a montanha mais alta de Portugal com 2.351 metros de altitude.

quarta-feira, 1 de novembro de 2023

Mesmo na guerra, não pode valer tudo

No passado dia 7 de Outubro os radicais islâmicos do Hamas decidiram atacar Israel a partir da Faixa de Gaza e fizeram-no de uma forma cruel, bárbara e selvagem, provocando muitas mortes e a captura de mais de duzentos reféns. O mundo ficou horrorizado com as atrocidades cometidas e muitas vozes anunciaram o óbvio, isto é, que Israel tinha o direito de se defender.
Desde então já se passaram 25 dias, em que as Israel Defence Forces (IDF) sob o comando de Benjamin Netanyahu, o líder do radical partido Likud, têm punido severamente a Faixa de Gaza sem distinguir o Hamas do povo palestiniano, o que configura uma situação de grave violação das leis da guerra, que é simétrica e tão condenável como o radicalismo do Hamas. Netanyahu tem rejeitado todos os apelos internacionais e das Nações Unidas para um cessar-fogo e tem respondido que “this is time for war”. Ele quer vingança, quer alargar o território de Israel e quer expulsar os palestinianos da sua terra, continuando a ignorar a Resolução 181 de 29 de Novembro de 1947 da Assembleia Geral das Nações Unidas, que determinava a criação de um estado judeu e de um estado árabe no território da Palestina, até então sob mandato britânico. A acção de Netanyahu e das IDF começa a enquadrar-se na prática de genocídio. 
Na sua edição de hoje o jornal The Washington Post noticia com destaque de primeira página que “strikes devastate Gaza refugee camp”. Trata-se do campo de refugiados de Jabaliya, criado em 1948 no norte de Gaza para abrigar parte dos 700.000 palestinianos que os israelitas tinham expulsado das suas terras da Palestina, antes e durante a guerra israelo-árabe de 1948. Actualmente este campo de refugiados terá cerca de 100.000 pessoas e no dia 9 de Outubro já tinha sido alvo de um ataque aéreo que matou 50 pessoas. Ontem o campo de Jabaliya voltou a ser atacado pela aviação israelita, que assumiu a responsabilidade por esse ataque, alegando que visava a eliminação de um alto comandante do Hamas. Segundo a imprensa internacional o ataque matou e feriu centenas de pessoas, mas o resultado ainda está por apurar. António Guterres ficou chocado com o bombardeamento de um campo de refugiados e com esta catástrofe humanitária. Nós também.
Mesmo na guerra, não pode valer tudo.

terça-feira, 31 de outubro de 2023

Springboks e Lobos na festa do râguebi

A equipa da África do Sul, conhecida como os Springboks, ganhou a 10ª edição da Rugby World Cup e tornou-se a selecção com mais troféus nesta prova ao arrecadar pela 4ª vez o Webb Ellis Trophy, por ter batido na final a equipa da Nova Zelândia, conhecida como os All Blacks.
O mérito da vitória sul-africana é indiscutível, mas o triunfo foi difícil. Nos quartos de final venceram a França por 29-28, nas meias-finais bateram a Inglaterra por 16-15 e na final derrotaram a Nova Zelândia por 12-11, isto é, foram três vitórias tangenciais em jogos mata-mata e todas conseguidas no Stade de France, em Saint-Denis.
Nelson Mandela que faleceu em 2013, deve ter-se sentido muito orgulhoso no seu túmulo. Durante muitos anos o râguebi era tido na África do Sul como um desporto-símbolo do apartheid e a população negra tinha-o como um dos símbolos da opressão branca. Em 1995 a Rugby World Cup realizou-se na África do Sul e foi o então presidente Nelson Mandela que juntou todos os sul-africanos, negros e brancos, em torno do apoio à sua selecção que, nesse ano, ganhou o seu primeiro Mundial. O râguebi tornou-se desde então no novo símbolo da unidade nacional sul-africana e o jornal The Citizen, que se publica em Joanesburgo, destacou essa grande vitória desportiva.
Nesta recente Rugby World Cup a selecção portuguesa, que na gíria da modalidade é conhecida como os Lobos, esteve em destaque e pelos resultados obtidos, ficou posicionada no 13º lugar do ranking mundial do râguebi, que é o segundo desporto colectivo mais praticado no mundo, com quase sete milhões de jogadores registados em mais de 170 países.
Estão de parabéns os Springboks, mas também os nossos Lobos!

domingo, 29 de outubro de 2023

Aníbal, Maria e os seus 60 anos de amores

Quando o mundo se mostra muito apreensivo pelo que vai acontecendo na Faixa de Gaza; quando constatamos a pequenez dos líderes que governam a Europa; quando gente de todos os continentes chega à Europa em busca de uma vida melhor; quando quase nada se sabe sobre o que se passa na Ucrânia; quando a corrida presidencial americana já está na estrada; quando se anunciam greves em Portugal e a privatização da TAP não é consensual; quando a África do Sul conquista a Rugby World Cup e o Benfica não ganha ao Casa Pia; e quando muitos mais assuntos de interesse vão acontecendo, verificamos que dois jornais portugueses de referência, respectivamente o Diário de Notícias e o Jornal de Notícias, destacam em manchete nas suas edições de hoje um não-assunto, que é a história dos amores de Aníbal e Maria que, sessenta anos depois do seu casamento, ainda não sabem “qual de nós se apaixonou primeiro”. Chama-se a isto um “furo jornalístico” e é notável, pois nem a Caras nem a Maria, nem a Lux nem a Nova Gente, conseguiram dar essa notícia em primeira mão. Teve honras de muitas páginas no Notícias Magazine.
Tanto Boliqueime como São Bartolomeu de Messines, mas certamente todo o Algarve e, talvez mesmo todo o país, receberam com emoção a notícia do 60º aniversário deste casamento e puderam ver a fotografia do casal enquanto jovem, quem sabe se a antever o ano de 1985, o passeio à Figueira da Foz, a rodagem do seu carro novo e a sua ascensão ao poder.
É caso para felicitarmos editorialmente estes dois jornais por este "jornalismo de primeira qualidade", bem como o seu proprietário que é a holding Global Media Group, presidida pelo empresário Marco Galinha!

quinta-feira, 26 de outubro de 2023

Viva o secretário-geral António Guterres!

Na passada terça-feira o secretário-geral das Nações Unidas interveio no Conselho de Segurança para pedir um cessar-fogo imediato na Faixa de Gaza por razões humanitárias e para acabar com o “sofrimento épico” do povo palestiniano. António Guterres afirmou que os bombardeamentos israelitas representam “uma punição colectiva do povo palestiniano” e uma violação do Direito Internacional, afirmando também que os ataques do Hamas foram “terríveis”, mas não aconteceram do nada. Segundo Guterres “o povo palestiniano foi submetido a 56 anos de ocupação sufocante”, tendo visto “as suas terras serem continuamente devoradas por colonatos e assoladas pela violência, a sua economia sufocada, as suas casas demolidas e as pessoas a serem deslocadas”. O representante de Israel reagiu e pediu a Guterres que se demitisse imediatamente, acusando-se de patrocinar o terrorismo do Hamas, enquanto o governo israelita parece ter cortado relações com as Nações Unidas. É sabido que, desde sempre, o estado de Israel não cumpre as decisões das Nações Unidas e, no actual conflito, tem resistido aos pedidos internacionais de contenção e tem massacrando diariamente a Faixa de Gaza, o que já está a ser visto como um genocídio. António Guterres foi corajoso e cumpriu os seus deveres de secretário-geral, defendendo os mais fracos e a Carta das Nações Unidas, sem deixar de condenar inequivocamente “os actos de terror horríveis do Hamas”, mas denunciando também os bombardeamentos israelitas. A imprensa internacional não dá qualquer destaque a este “número” feito por Israel e não critica as afirmações de António Guterres que, pelo contrário, tem sido elogiado pela sua coragem e coerência. É um não-assunto. O que é curioso é o facto de haver em Portugal alguns comentadores que “são mais papistas do que o Papa” e que trataram de se aliar aos radicais israelitas, embora aparecendo travestidos de especialistas neutrais.

domingo, 22 de outubro de 2023

Barcelona exibe obra de Miró e de Picasso

Como aqui escrevemos há dias, o conflito do Médio Oriente entre Israel e o Hamas é o mais sério conflito de todos os que estão a acontecer no mundo e “o pior que podemos fazer é tomar partido”, segundo declarou hoje ao JN o cardeal Américo Aguiar. De facto, tudo o que tem acontecido em Gaza e em outros locais do Médio Oriente é demasiado mau e desumano. Há que fazer tudo o que for possível para moderar e apaziguar os radicais de ambos os lados, bem como parar os comentários a favor da retaliação e da destruição, porque a maioria dos judeus e dos palestinianos são gente pacífica e não querem a guerra. De resto, por todo o mundo, vão-se levantando as vozes contra a guerra e a favor da reconciliação entre israelitas e palestinianos, voltando a falar-se na criação de um estado judaico e de um estado árabe naqueles territórios.
Na sua edição de hoje, o jornal catalão ara, a propósito daquele conflito e com o título “compromisso para a paz”, escreve na sua primeira página que “no actual contexto de guerra, a força e a validade da arte são um grito de liberdade” e destaca a palavra “paz”. Por isso, o jornal dedica essa edição a uma dupla grande exposição que foi inaugurada em Barcelona na passada sexta-feira, sobre a obra, a amizade e as convergências que durante mais de cinquenta anos ligaram Pablo Picasso e Joan Miró, os dois artistas espanhóis que transformaram a arte do século XX. A exposición Miró-Picasso é uma iniciativa conjunta do Museu Picasso e da Fundação Joan Miró, ambos localizados em Barcelona, reunindo um conjunto de quase 300 obras, das quais quase metade foi cedida por colecções públicas e privadas de todo o mundo. A exposição acontece em simultâneo naquelas duas instituições de Barcelona e estará patente até ao dia 25 de Fevereiro. Assim, o leitor tem cerca de quatro meses para visitar a capital da Catalunha e, entre outras coisas, visitar a exposición Miró-Picasso.

Fluxos migratórios em busca da Europa

São conhecidos os fluxos migratórios que nos últimos anos se têm dirigido para a Europa para fugir à fome e à guerra. Milhões de asiáticos e de africanos, mas também sul-americanos e ucranianos têm procurado uma vida melhor no espaço europeu. 
Nessas circunstâncias, a ilha italiana de Lampedusa que fica situada apenas a cerca de 200 quilómetros da costa tunisina, tornou-se uma ponte entre a África e a Europa, tendo deixado de ser um paraíso turístico para se tornar num símbolo de crise humanitária, ou da grave crise da própria Europa. Desde o início do corrente ano chegaram à ilha de Lampedusa mais de 120.000 migrantes e, recentemente, num só dia, chegaram à ilha cerca de seis mil pessoas em 120 embarcações diferentes. Não tem havido resposta a esta crise e os apelos do Papa e das Nações Unidas não têm sido suficientes para alertar os dirigentes europeus. 
Porém, a ilha de Lampedusa é apenas o símbolo deste grave problema, que está presente em outras áreas da periferia da União Europeia, por exemplo nas ilhas Canárias. A ilha de Lanzarote encontra-se a cerca de 140 quilómetros da costa africana e, por isso, o fluxo migratório que procura a Europa também tem procurado as ilhas Canárias.
O jornal Canarias7, que se publica em Las Palmas, destaca hoje que uma canoa motorizada a que localmente chamam cayuco, chegou ontem às Canárias com 320 migrantes, o que constitui um recorde, mas também um desafio às regras mínimas de segurança. Além disso, o jornal acrescenta que “otros 532 inmigrantes de origen subsaharianos han llegado este sábado en dos cayucos a El Hierro, con 212 y 320 personas, respectivamente, y un grupo de 98 ha sido desembarcados en el puerto de Los Cristianos, en Tenerife, tras ser socorridos en aguas del Atlántico por efectivos de Salvamento y la Guardia Civil”. Aqui está um problema maior, que deveria merecer a atenção da União Europeia.

sábado, 21 de outubro de 2023

Os ventos ciclónicos e as ondas gigantes

A depressão Aline passou por Portugal e durante dois dias e meio fez alguns estragos, mas não causou vítimas nem desalojados, limitando-se a chuva intensa, inundações e algumas quedas de árvores, mais uns tantos voos cancelados. Segundo foi divulgado pelos serviços de protecção civil registaram-se 3470 ocorrências, o que nos deixa a pensar que cabe tudo no conceito de ocorrência, isto é, o que ocorre e o que não ocorre. Alguns responsáveis políticos, com o autarca Moedas à cabeça, aproveitaram a oportunidade e agarraram-se à Aline para aparecerem e serem vistos nas televisões.
Entretanto, a Aline deslocou-se para Espanha onde também causou o mesmo tipo de estragos por todo o país, com a cidade de Madrid a bater o recorde de chuva num só dia, pois caíram 100,1 litros de água por metro quadrado.
A agitação marítima foi muito intensa, sobretudo na orla da baía da Biscaia, como hoje salientou a edição do jornal El Diario Montañés que se publica em Santander, ao anunciar que o vento registou uma velocidade de 107 quilómetros por hora e que, no mar, as ondas atingiram 20 metros de altura. Em contraste com a imprensa que está envolvida no conflito do Médio Oriente, o jornal decidiu publicar uma pacífica fotografia alusiva aos efeitos da depressão Aline no mar da costa da Cantábria, mostrando que o fotojornalismo existe.

sexta-feira, 20 de outubro de 2023

Será que Joe Biden pode travar a guerra?

A guerra no Médio Oriente tem forte tendência para se agravar e são mínimos os sinais de contenção ou de apaziguamento, o que leva a revista Newsweek a perguntar, na sua mais recente edição, se Joe Biden pode travar a guerra no Médio Oriente. A questão é muito pertinente mas, provavelmente, a resposta é negativa. O presidente dos Estados Unidos foi a Israel, não tanto para apoiar Benjamin Netanyahu que já tinha esse apoio, ou para travar a esperada reacção israelita ao calamitoso ataque do Hamas, mas sobretudo porque precisava do seu abraço e daquela fotografia para a campanha eleitoral americana que se aproxima. Os resultados da sua visita foram desoladores, não só porque os israelitas não abrandaram os seus ataques a Gaza, mas também porque os países árabes da vizinhança se recusaram a encontrar-se com ele.
Enquanto isto, era de esperar que a Europa tivesse um papel activo de moderação neste longo conflito entre árabes e judeus mas, em contramão com a História, os passos que têm sido dados vão no sentido errado, pois tendem a agravar a situação e a fazer com a insegurança e o medo alastrem para as cidades europeias. A Ursula é apenas um exemplo da incapacidade europeia para fazer alguma coisa por um mundo melhor.
A manipulação da informação pelos dois lados atingiu níveis como nunca se vira antes e, a toda a hora, temos dificuldade em distinguir a verdade da mentira. A recente explosão no hospital Al-Ahli, em Gaza, é um bom exemplo. Cada uma das partes acusa a outra e há que esperar uma investigação independente para sabermos a verdade, se tal for possível. Porém, enquanto Joe Biden é prudente e diz que “parece que foram os outros”, a generalidade dos nossos inúmeros comentadores e especialistas que “ocupam” as nossas televisões não tem dúvidas e, apenas com base nos seus palpites, são peremptórios na acusação do Hamas. Indefeso em frente das televisões, o público cansa-se de ouvir tanta propaganda e tantos disparates. Que mau serviço que prestam à verdade!

quarta-feira, 18 de outubro de 2023

Gaza: é difícil, mas “isto tem que parar”

Numa altura em que A situação no Médio Oriente se agrava e em que a imprensa mundial se reparte entre os que “defendem o direito de Israel a defender-se” e aqueles que “defendem os direitos do povo palestiniano”, a manchete escolhida hoje pelo centenário tabloide britânico Daily Mirror vai directa ao assunto: isto tem que parar.
A história do conflito é bem conhecida desde 1948, bem como as ocupações ilegais de território pelos israelitas, a construção de colonatos judeus nesses territórios, a contínua humilhação dos palestinianos e as Resoluções das Nações Unidas que aprovaram a criação de um estado judeu e de um estado palestiniano. Tem sido uma luta constante, sobretudo entre os radicais de ambos os lados, mas também uma permanente ameaça à paz mundial. A comunidade internacional distraiu-se e não tratou de encontrar uma “solução justa e duradoura” para este conflito, embora seja uma missão muito difícil. No dia 7 de Outubro o conflito reacendeu-se com um brutal e cruel ataque do Hamas que custou muitas vidas civis, a que se seguiu a violenta vingança israelita. As tomadas de posição e de alinhamento com cada uma das partes têm acontecido, como se se estivessem a “contar espingardas”. O presidente Joe Biden foi a correr para Israel, enquanto Antony Blinken tem andado por todo o Médio Oriente, mas não se sabe exactamente o que querem para além das declarações de circunstância, quando afirmam que “nunca deixaremos de apoiar Israel”, que “tem o direito de defender o seu território e o seu povo”.
A frase “This must end” que hoje faz a manchete do Daily Mail, bem poderia ser a frase inspiradora para todos os que querem a paz no Médio Oriente e, em especial para os dirigentes da União Europeia que, como tem acontecido nos últimos tempos, continuam a dar “tiros nos pés” no que respeita às suas relações internacionais.

segunda-feira, 16 de outubro de 2023

O novo jornalismo e o valor das palavras

A selecção francesa de râguebi perdeu ontem por 29-28 com a equipa sul-africana e foi eliminada na Rugby World Cup. Quando um país inteiro esperava que a sua equipa pudesse conquistar pela primeira vez o título mundial e sonhava festejá-lo em directo e ao vivo no dia 28 de Outubro no Stade de France, em Paris, esta derrota foi demasiado dura para os franceses. Nas suas edições nacionais ou regionais de hoje, toda a imprensa destaca a derrota dos blues e o jornal Midi Libre que se publica em Montpellier, destaca essa notícia com o título “si cruel”. Porém, o fim do sonho francês teve repercussão generalizada em toda a imprensa francesa que hoje utiliza títulos como “tellement cruel”, “terrible désillusion”, “le rêve brisé”, “point final”, “à pleurer” ou “une cruelle défaite”, ignorando tudo o que se passa no mundo, incluindo o noticiário do Médio Oriente, a crise da Ucrânia, os problemas dos refugiados, as alterações climáticas ou até o desgoverno em que se move a União Europeia que, pela mão de Ursula von der Leyen, se tornou um peão irrelevante e sem voz na política internacional.
Numa altura em que o mundo ainda está chocado com a barbaridade do que está a acontecer no Médio Oriente, não deixa de ser curioso que a palavra cruel que tem servido para classificar as acções do Hamas, também sirva para classificar uma derrota num simples jogo de râguebi.
As palavras devem ter um significado preciso, mas o novo jornalismo tende cada vez mais a usá-las de uma forma desproporcionada, ou até inverdadeira, para satisfazer as emoções dos seus leitores e não para relatar factos com verdade e objectividade.

sábado, 14 de outubro de 2023

Israel e Palestina: parar enquanto é tempo

O jornal l’Humanité foi fundado em 1904 por sindicalistas franceses, ligou-se depois ao Partido Comunista Francês de que foi órgão oficial até 1994 e, desde então, pertence a uma sociedade anónima por acções e recebe subvenções do Estado. Hoje reclama-se dos valores dos seus fundadores que eram “a luta pela paz, a comunhão com o movimento operário e a independência face aos grupos de interesses presentes na sociedade”.
Na sua edição deste fim-de-semana, a propósito da grave situação que se vive na Faixa de Gaza, o jornal faz um veemente apelo: cessez le feu!
Quando se folheia a imprensa estrangeira, verifica-se que geralmente ela está alinhada com um dos lados do conflito, nuns casos para condenar a crueldade dos ataques do Hamas e, em outros casos, para condenar a dureza da vingança israelita. O facto é que a violência é enorme e estamos perante uma gigantesca catástrofe de morte e destruição. Nesta altura, as brutais acções de guerra conduzidas por ambas as partes já estão a ser classificadas como “crimes de guerra”, designadamente pelas Nações Unidas. É nesse contexto e por razões humanitárias, que a mensagem do jornal l’Humanité tem todo o sentido e deve ser apoiada, ao mesmo tempo que devem ser retomadas todas as iniciativas que conduzam à paz e à coexistência pacífica entre israelitas e palestinianos. Já passaram demasiados anos sem que o problema fosse resolvido, devido à oposição dos extremistas de ambos os lados e dos seus aliados internacionais.
A Europa deveria assumir o papel de pacificador e de moderador neste conflito mas, uma vez mais, alguns dos seus dirigentes a começar pela incansável Ursula, que confunde Hamas com Palestina, apressaram-se a tomar partido sem cuidar de pensar que estão a prejudicar os interesses dos europeus. 
Muito gosta a Europa de dar tiros nos pés...

sexta-feira, 13 de outubro de 2023

A gravidade da crise israelo-palestiniana

A guerra entre Israel e o Hamas tomou conta das preocupações mundiais, porque se trata de um conflito mais sério do que qualquer outro daqueles que estão a acontecer no nosso planeta. O conflito entre árabes e judeus dura desde 1948 e poucos dirigentes têm tido a sensibilidade de levar à prática as Resoluções das Nações Unidas, que aprovaram a criação de um estado judeu e de um estado palestiniano. Como hoje escreveu um conhecido opinion maker, “já era tempo de este clube de idiotas que governam o mundo aprenderem alguma coisa de útil sobre o passado”, mas o facto é que muito pouco tem sido feito no sentido de garantir, simultaneamente, a autodeterminação e a soberania do povo da Palestina e a segurança do estado de Israel. Os direitos do povo palestiniano têm sido ignorados pelo estado de Israel perante a indiferença dos países mais poderosos, mas nada justifica o fanatismo e a bestialidade com que o Hamas atacou Israel no dia 7 de Outubro, com níveis de crueldade importados do Daesh e que são repudiados pelo mundo civilizado. Torna-se necessário que a anunciada e compreensível ofensiva israelita contra o Hamas seja proporcional e não siga os padrões do criminoso fanatismo daquela organização, pois há mais de dois milhões de palestinianos na Faixa Gaza e só uma minoria estará ao lado do Hamas.
O mundo está cada vez mais inseguro e aqueles que têm poderes para arbitrar e para moderar, raramente cedem aos seus interesses estratégicos e comerciais, esquecendo quase sempre que, nestes conflitos, os maus não estão todos de um lado, nem os bons estão todos do outro lado, o que exige vontade de conciliação e de negociação.
O facto é que árabes e judeus, ou Israel e a Palestina, estão a passar por tempos muito perigosos para a paz mundial e, embora seja justa a punição daqueles que usaram de crueldade e mataram civis inocentes, há que evitar “lançar gasolina para a fogueira”, como fazem certos dirigentes e muitos mass media mundiais.
Na sua edição de ontem, o jornal argelino Le Jeune Indépendant ignora a crueldade do Hamas, destaca “os cinco dias de bombardeamentos selvagens” e anuncia que “les ghazaouis seuls face a l’atrocité sioniste”, o que mostra como há leituras e interpretações bem diversas sobre o que está a acontecer no Médio Oriente.

terça-feira, 10 de outubro de 2023

As guerras e as lições de Clausewitz

A guerra está instalada nas fronteiras da Europa e as lições de Clausewitz tornam-se muito actuais, apesar de terem sido escritas há quase duzentos anos. Foi em 1832 que, postumamente, foi publicado um livro sobre guerra e estratégia militar intitulado “Da Guerra”, que desde logo se tornou uma referência nas doutrinas militares, tal como o seu autor Karl von Clausewitz, um general prussiano que, entre muitos outros princípios, escreveu que “a guerra é uma simples continuação da política por outros meios”. Quando nos nossos dias, depois de muitos anos de paz, de progresso e de prosperidade dos povos europeus, vemos a violência, a brutalidade e a desumanidade da guerra, as lições de Clausewitz são lembradas por muita gente. As situações de guerra entre a Rússia e a Ucrânia, tal como entre Israel e a Palestina, são “a simples continuação da política por outros meios”. Em ambos os casos, não terão sido acauteladas as realidades históricas e as aspirações dos povos, tendo imperado a intransigência negocial e uma lógica belicista. Os políticos das grandes potências não só deviam cuidar do bem-estar e da segurança das suas populações, mas também deveriam assumir a responsabilidade pela promoção da cooperação internacional, pelo apaziguamento das tensões, pela arbitragem de contenciosos e pela preservação da paz no mundo, mas não foram capazes de encontrar entendimentos e soluções negociadas para as históricas conflitualidades que afectam as regiões actualmente em guerra. Objectivamente, os políticos das grandes potências, sobretudo os que têm assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, não só contribuíram como, em alguns casos, estimularam a guerra, para satisfação das suas ganâncias económicas ou estratégicas.
Hoje o Daily News, um dos principais jornais de Nova Iorque, anuncia o contra-ataque israelita e a imagem utilizada mostra a enorme violência da guerra na Faixa de Gaza.