quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Ainda não estamos no vale tudo

O chefe de Estado solicitou ao Tribunal Constitucional a verificação da conformidade de normas do diploma que estabelece o regime jurídico da requalificação de trabalhadores em funções públicas, designadamente com o conceito constitucional de justa causa de despedimento, o regime dos direitos, liberdades e garantias e o princípio da proteção da confiança. Não se esperava outra coisa. Os nossos governantes têm despudoradamente deixado que a troika e os seus funcionários nos humilhem, aceitando um ajustamento que não tem tido os resultados desejados e que, inversamente, tem tido efeitos secundários brutais, que todos sentimos no desemprego e na emigração, na pobreza e na perda de direitos sociais, mas também na desertificação das nossas cidades e na morte do nosso comércio tradicional.
A estratégia continua a ser a mesma: o ataque ao funcionalismo público e aos pensionistas como se eles não fossem pessoas e não merecessem o respeito do Estado que servem ou serviram. A ideia de reduzir o peso do Estado e de despedir funcionários é controversa, mas eles insistem, tendo criado um programa de rescisões por mútuo acordo e um novo regime de mobilidade especial, que no prazo de um ano conduzirá ao despedimento de muitos funcionários, pois quem não aceitar rescindir com o Estado, tomará o caminho da chamada requalificação e, logo a seguir, o desemprego. Pretende o Rosalino, dessa forma, reduzir em cem mil o número de funcionários públicos até ao final da presente legislatura, isto é, em 2015, embora o governo continue sem apresentar um programa coerente para a reforma do Estado. Cortam no que está mais à mão, mas continuam a dar emprego aos amigos e a gastar à tripa forra em assessores, carros de luxo, seguranças e muitas mais mordomias que vemos nas televisões e nos escandalizam. O que está em causa e que o Tribunal Constitucional vai apreciar é a possibilidade de despedimento na função pública e essa questão não pode ser tratada apenas como uma questão económica, porque é um grave problema social e uma questão jurídica.
Os juízes do Tribunal Constitucional têm uma difícil missão porque se confrontam com aqueles que têm agido à margem da lei e querem equilibrar as contas públicas e reduzir o endividamento do Estado à custa dos mais fracos e mais desprotegidos. É necessário que o Tribunal Constitucional lhes diga, uma vez mais, que não vale tudo.

2 comentários:

  1. Os funcionários públicos e os pensionistas da CGA são os mais indefesos e portanto mais fáceis de atacar pelo governo. É triste, fracos com os fortes e fortes com os fracos. Não é chavão, é assim mesmo.
    E quanto aos juízes, vejamos o que vai acontecer. Não quero ser injusto à priori, mas gostava que eles actuassem com independência em relação aos privilégios de que auferem. Certamente assim será. Oxalá.

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  2. No que se refere aos magistrados, declarações de um passado recente a associar a redução de vencimentos a um ataque à independência do poder judicial não auguram nada de bom. E quanto aos diplomatas? O governo diz que vai haver legislação específica para uns e outros. Mas o governo diz e desdiz tanta coisa... Segundo reza o chavão, "com o mal dos outros podemos nós bem", mas com situações de privilégio podemos muito mal.

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