No tempo em que os estudantes em Coimbra viviam à sombra da Universidade, um Amigo passou muitas centenas de vezes por esta rua do Norte, íngreme e estreita, sinuosa e empedrada. Dia a dia, por esta rua acima, ele era um dos muitos jovens que acediam ao saber académico e à promoção social que a Universidade conferia aos melhores, num tempo de dureza e de sacrifício, em que não havia os facilitismos nem as mordomias da vida actual.
Coimbra tornava-se a terra de adopção para quem vinha de longe e deixava a casa paterna, para quem contava os tostões e enfrentava o mundo. A cidade a todos abraçava com cordialidade, porque os estudantes eram a sua razão de ser e cada um encontrava o seu espaço afectivo nessa terra estranha, que nascia do convívio e da solidariedade entre a comunidade estudantil.
A irreverência marcava a vida da própria cidade. A tradição impunha-se, a capa negra era um símbolo e o fado um emblema, em que todos se reviam. Era a marca da vida coimbrã e, orgulhosos dela, cantavam:
“Não há terra como a nossa/Não há no mundo outra assim”.
Quando, já doutores, deixavam a cidade, podiam verificar que “Coimbra tem mais encanto na hora da despedida”, porque nela tinham passado os melhores anos da sua juventude, mas levavam consigo as saudades e as memórias de um tempo irrepetível, mas também uma nova vida para viver.
Entretanto, o mundo mudou e Coimbra mudou muito. Hoje a rua do Norte não tem o movimento de outros tempos e está quase deserta. A maioria dos estudantes vive agora em modernos blocos de apartamentos e tem automóvel, veste roupa de marca, usa credit card, tem laptop, iPad e iPhone, beneficia de bolsas de estudo e da acção social escolar. Tem quase tudo porque a vida estudantil se tornou uma confortável indústria, enquanto a cidade e a sua relação com os estudantes já não é o que era.
Neste registo, deixo esta breve homenagem ao meu Amigo AF.
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