Ao ver a capa da
edição de ontem do jornal Domingo em que é representada a orla
costeira moçambicana da província de Cabo Delgado, entre o rio Rovuma e a baía
de Mocímboa da Praia, senti uma estranha sensação de familiaridade com cada uma
daquelas baías e ilhas, que há mais de cinquenta anos visitei inúmeras vezes
quando, por dever de ofício, percorri aqueles mares.
Lá está o rio
Rovuma em que não ousávamos entrar por razões hidrográficas e diplomáticas, bem
como as ilhas Rongui e Tekomagi, mais a Vamizi e a Tambuzi, além de outras
ilhas do arquipélago das Quirimbas, não sendo difícil identificar as estreitas
passagens entre as ilhas e a orla costeira, por onde se arriscava a navegação
para ganhar tempo ou para tirar partido do abrigo que proporcionavam
relativamente ao mau estado do mar no canal de Moçambique.
E lá estão,
invisíveis, os baixos de coral onde as conchas raras eram procuradas pelos
malacologistas, onde havia peixe e marisco em abundância e onde a limpidez das águas não tinha igual no mundo. Lá estão, também, as
antigas povoações de Quionga e de Palma, o aldeamento do Olumbe e a vila de
Mocímboa da Praia, hoje certamente bem diferentes do que eram há cinquenta
anos. Era um tempo de
conflito militar e, naquela região periférica do território norte de Moçambique, por
ali passamos muitos dias e muitas noites nas chamadas missões de fiscalização,
mas também em apoio de todos os que nós necessitavam no mar sem cuidar de saber de que
lado estavam.
A capa do jornal Domingo
fez-me mergulhar em muitas memórias da minha juventude marinheira e até me fez
recordar alguns episódios mais ou menos pitorescos que por lá aconteceram, mas
também me recordou que aquela mesma região se confronta hoje com a descoberta
de hidrocarbonetos e a exploração de gás natural em larga escala e daí o título "5 mil milhões para o Rovuma". Porém, há alguma tensão naquela área resultante da acção de grupos jihadistas e isso é muito preocupante.