A notícia da
edição de hoje do Jornal de Notícias deixou-me estarrecido – os magistrados com
dois anos de serviço vão ganhar tanto como um general. Segundo informa o
jornal, todos os juízes e procuradores do Ministério Público que ao fim de dois
anos de trabalho não tenham uma nota inferior a “bom” terão uma remuneração
ilíquida base de 4.336 euros. Este valor é quase equivalente ao que aufere um
almirante ou um general das Forças Armadas, após uma carreira muito longa,
muito exigente tecnologicamente e muito escrutinada interna e externamente.
A medida faz
parte dos novos estatutos dos magistrados judiciais e do Ministério Público e
também coloca os magistrados a receberem mais do que um coordenador da Polícia
Judiciária no topo da sua carreira de investigação criminal e com décadas de
serviço efectivo. Esta situação é bizarra e, certamente, é uma consequência da
actividade do sindicalista Ventinhas e das greves que tem promovido na sua luta
pela independência e pela autonomia funcional do Ministério Público. O tema é
muito controverso, porque na República o poder pertence ao povo e a sua arma é
o voto. Os poderes do Ministério Público e dos seus magistrados, que são
importantes num Estado de Direito, não derivam do voto popular e são desproporcionados,
o que lhes permite atacar quem quiserem com base em meros indícios ou
suspeitas, com privação da liberdade, destruição da vida profissional e
pessoal, liquidação do seu bom nome e a condenação na praça pública. Miguel
Sousa Tavares chamou-lhes “os intocáveis” e explicou que “são a única classe
profissional em Portugal que não pode ser julgada disciplinarmente por ninguém
que não eles próprios” (Expresso, 29
de Junho de 2019).
Ora é esta gente
que ao fim de dois anos passa a ganhar tanto como um almirante ou com um
general e que, pouco tempo depois, pode ganhar mais do que o primeiro-ministro.
É chocante. Parece o renascer da sociedade feudal, em que havia os senhores com
todos os direitos e os servos da gleba sem direitos nenhuns.
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