quinta-feira, 4 de julho de 2019

Será o renascimento da sociedade feudal?

A notícia da edição de hoje do Jornal de Notícias deixou-me estarrecido – os magistrados com dois anos de serviço vão ganhar tanto como um general. Segundo informa o jornal, todos os juízes e procuradores do Ministério Público que ao fim de dois anos de trabalho não tenham uma nota inferior a “bom” terão uma remuneração ilíquida base de 4.336 euros. Este valor é quase equivalente ao que aufere um almirante ou um general das Forças Armadas, após uma carreira muito longa, muito exigente tecnologicamente e muito escrutinada interna e externamente.
A medida faz parte dos novos estatutos dos magistrados judiciais e do Ministério Público e também coloca os magistrados a receberem mais do que um coordenador da Polícia Judiciária no topo da sua carreira de investigação criminal e com décadas de serviço efectivo. Esta situação é bizarra e, certamente, é uma consequência da actividade do sindicalista Ventinhas e das greves que tem promovido na sua luta pela independência e pela autonomia funcional do Ministério Público. O tema é muito controverso, porque na República o poder pertence ao povo e a sua arma é o voto. Os poderes do Ministério Público e dos seus magistrados, que são importantes num Estado de Direito, não derivam do voto popular e são desproporcionados, o que lhes permite atacar quem quiserem com base em meros indícios ou suspeitas, com privação da liberdade, destruição da vida profissional e pessoal, liquidação do seu bom nome e a condenação na praça pública. Miguel Sousa Tavares chamou-lhes “os intocáveis” e explicou que “são a única classe profissional em Portugal que não pode ser julgada disciplinarmente por ninguém que não eles próprios” (Expresso, 29 de Junho de 2019).
Ora é esta gente que ao fim de dois anos passa a ganhar tanto como um almirante ou com um general e que, pouco tempo depois, pode ganhar mais do que o primeiro-ministro. É chocante. Parece o renascer da sociedade feudal, em que havia os senhores com todos os direitos e os servos da gleba sem direitos nenhuns.

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